Pesquisa do Ibope Inteligência aponta que satisfação da população vem caindo desde 2011 e perspectivas para este ano não são boas: apenas 35% acreditam em prosperidade econômica %u2014 em 2014, eram 49%
A incerteza na economia parece estar corroendo as principais características pelas quais os brasileiros são conhecidos: o otimismo e a felicidade. Desde 2011, a satisfação com a vida vem caindo, e hoje está abaixo da média mundial, de acordo com o Barômetro Global de Otimismo, estudo feito pelo Ibope Inteligência em parceria com a Worldwide Independent Network of Market Research (WIN). A análise foi feita em 65 países, com 64.909 entrevistas, 2002 das quais aqui no Brasil, com população de 16 anos ou mais, de todas as classes sociais.
De acordo com o levantamento, o percentual dos que esperam prosperidade econômica em 2015 caiu de 49% para 35% da população brasileira. Na avaliação global, 42% acreditam que 2015 será de prosperidade econômica para o seu país. "Estou vendo um brasileiro preocupado, e o mais impressionante é que, pela primeira vez, o Brasil apresenta um nível de otimismo abaixo da média da população mundial. Esse movimento de queda é uma tendência nos indicadores", avalia Laure Castelnau, diretora de Marketing e Novos Negócios do Ibope Inteligência.

A queda de otimismo ao longo do tempo é bastante impactante. De dezembro de 2008 até 2013, a perspectiva dos brasileiros para o ano seguinte permaneceu no patamar de 74%. Em 2013, ocorreu o primeiro recuo acentuado para 57%, e em 2014, para 49%. "Desde 2012, o percentual dos que esperam uma economia melhor vem caindo no país. Vivemos um período de prosperidade econômica em 2011 que não se mostrou sustentável. Assim, os sinalizadores de retração parecem já estar afetando o dia a dia do brasileiro, que se mostra gradualmente mais pessimista em relação ao crescimento do país, e isso independe de classe social", diz.

A constatação de Castelnau pode ser sentida nas ruas. O vendedor de picolé Luis Vidal, de 61 anos, não esconde o pessimismo. "É impossível este ser um bom ano", desabafou. "Desisti de fazer previsão boa, as coisas só pioram." Ele tinha planos de comprar um carro em 2015, mas admitiu já ter abandonado a ideia. "Com a inflação alta desse jeito, comendo todo o salário, não tem jeito. É o fim dos tempos."

As dificuldades financeiras do governo local são fator de preocupação para a diarista Maria do Carmo, de 51 anos, que tem entre seus clientes funcionários do GDF. Segundo explicou, o medo se instaurou depois que parentes e amigos perderam o emprego. "Principalmente em Brasília, onde se gasta muito e as coisas são caras, dá medo do futuro", afirma.

Renato Almeida, de 28 anos, funcionário público, também está desiludido. "Acho que vai ser a mesma coisa do ano passado. O custo de vida vai aumentar." Ele acredita que, no momento, o desafio é controlar a economia. "Melhorar, por enquanto, não vai", previu. O colega dele, também servidor público, Lucas Alves, de 22 anos, concordou com o amigo. E acrescentou: "Se o governo não mudar a postura, vai ser um ano ruim."

Felicidade

O levantamento mostrou ainda que 70% das pessoas em todo o mundo dizem que estão felizes com a sua vida, contra 60% no ano passado. Fiji é o país mais contente do mundo (93%), enquanto o Iraque é o menos (31%). No Brasil, 55% dos entrevistados se disseram felizes e 20% afirmaram estarem neutros - nem felizes nem infelizes. O estudo também revela que sempre que se fala de nação aqui, há uma completa dissociação entre o que as pessoas esperam para suas vidas e o que acham que vai acontecer com o país. "São visões conflitantes. Quando as pessoas falam da própria felicidade, estão geralmente pensando no que acontece com suas famílias. Filhos que nascem, casamentos que acontecem". observa Castelnau.

O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e ministro da Secretaria de Assuntos Extraordinários (SAE), Marcelo Neri, concorda que o brasileiro é muito otimista no que tange à vida dele, mas quando se pergunta sobre o país no futuro, aí é um dos mais pessimistas. "Nós somos otimistas e individualistas, precisamos fazer a construção para o coletivo", afirma.

Neri considera que esse otimismo na vida pessoal se reflete, por exemplo, na falta de planejamento, na baixa taxa de poupança e na demanda por seguros. "No Brasil, precisamos ser mais formigas, mas tendemos a ser mais cigarras. Somos pouco coletivos e a poupança impacta nas duas dimensões: no individual e no coletivo que se traduz em desenvolvimento no país", conclui.

O filósofo e professor da PUC- SP, Mario Sergio Cortella, pontua que pode ser boa essa diminuição da satisfação do brasileiro. "O sempre surpreendente Guimarães Rosa dizia que o "animal satisfeito dorme". Por trás dessa aparente obviedade está um dos mais profundos alertas: o de que é preciso não esquecer que a satisfação não deixa margem para a continuidade, para a persistência. A satisfação acalma, limita, amortece", reflete.