Eleição do peemedebista Eduardo Cunha na Câmara ressalta a divisão entre Aloizio Mercadante e Jaques Wagner e acentua a preocupação do Planalto com as propostas que Dilma quer ver aprovadas no parlamento
A derrota do Planalto com a eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para a presidência da Câmara escancarou a divisão de estilo entre o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, e o ministro da Defesa, Jaques Wagner, principais expoentes da nova articulação política da presidente Dilma Rousseff. Wagner tentou costurar, até o último momento, uma aliança entre PT e PMDB na Câmara, na tentativa de impedir o embate entre Cunha e Arlindo Chinaglia (PT-SP). Mercadante optou pelo confronto e apostou na mobilização dos demais ministros, como Cid Gomes (Educação) e Gilberto Kassab (Cidades), para ajudar a esvaziar o PMDB e reverter casos de infidelidade na base aliada, já que os sinais de debandada pró-Cunha se tornavam nítidos. A estratégia deu errado.
O governo ainda tenta digerir as traições internas, já que Chinaglia teve menos votos do que poderia na coligação partidária que o apoiou formalmente. Isso sem levar em conta o PP e o PRB, que comandam os ministérios da Integração Nacional e do Esporte, respectivamente, e apoiaram oficialmente Eduardo Cunha. A presidente Dilma Rousseff, que montou a Esplanada dos Ministérios para garantir a fidelidade da própria base de sustentação, sentiu o impacto da própria fragilidade e agora terá de ter cuidado redobrado, pois a derrota política poderá transformar-se em derrota econômica.

O ano será difícil, e é preferível, na visão de estrategistas da petista, distensionar os ânimos para não atrapalhar iniciativas legislativas importantes, como a prorrogação, por mais quatro anos, da Desvinculação das RECEITAS DA União (DRU), e as mudanças no seguro-desemprego e nas regras de pensões (veja quadro).

Ontem, Mercadante disfarçou a derrota na Câmara, manifestando certa indiferença sobre a eleição de Cunha. "Na Câmara, houve a disputa entre as duas principais bancadas. Essa é uma Casa política. Tem votação, a gente ganha ou perde. O importante é manter o diálogo e a disposição de construção de uma agenda que o país precisa", desconversou.

Diante da fragilidade na articulação política, uma caça aos traidores para punir infiéis está descartada. "As bruxas estão espalhadas em muitos outros partidos aliados. Não dá para querer piorar ainda mais as coisas", disse um integrante da articulação política. "Em matéria eleitoral, você diverge, alguns trabalham para uns, outros trabalham para outros até o dia das eleições. No dia seguinte à disputa, a busca é pelo bem comum", ameniza o vice-presidente da República, Michel Temer. Segundo ele, não há preocupações com a relação entre a Câmara e o Planalto. Temer - que preside o PMDB - acredita que haverá independência com harmonia.

"A Câmara deu um recado muito claro para nós. Se o governo insistir no confronto, as sequelas poderão ser piores", resumiu um interlocutor palaciano. "Eles descobriram, na prática, que é o PMDB que entende dos meandros do Congresso. É uma longa estrada pavimentada por José Sarney, Renan Calheiros, Michel Temer, Henrique Alves e, agora, Eduardo Cunha", provocou um cacique peemedebista.

Telefonema

Eduardo Cunha confirmou ter recebido um telefonema de congratulações da presidente Dilma Rousseff. "Foi uma conversa amistosa", afirmou, lacônico. Citado na Operação Lava-Jato e não reeleito, o ex-deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) tripudiou, nas redes sociais, da derrota do Planalto e do petista Arlindo Chinaglia. "O pior é que informaram para a bancada que Arlindo poderia GANHAR no primeiro turno. É muita incompetência. O PT fica de fora da Mesa Diretora e das principais comissões por incompetência da articulação política do governo e do próprio PT na Câmara", escreveu o ex-parlamentar.

Integrantes do PMDB não esconderam a satisfação por derrotar o PT. "O (senador) Aécio (Neves), que só pode oferecer um café, conseguiu 100 votos para Júlio Delgado (PSB-MG) na disputa da Câmara. O governo coloca sete ministros, tem o poder da caneta e dá 136 votos para o Chinaglia. Que coisa, hein?", ironizou um líder partidário.

Na Câmara, houve a disputa entre as duas principais bancadas. Essa é uma Casa política. Tem votação, a gente ganha ou perde. O importante é manter o diálogo e a disposição de construção de uma agenda que o país precisa"