Além de enfrentar longas filas, brasilienses sofrem com atendimento precário ou ausência de profissionais de saúde. Procuradoria-Geral do DF ajuizou uma ação para pedir o fim da paralisação. Governo negocia mais uma vez com a categoria.
A paralisação dos profissionais de saúde, somada ao sucateamento da rede pública de saúde, ampliou o sofrimento dos brasilienses à procura de atendimento hospitalar. Mesmo quem passa pela triagem e chega até o médico, depois de longas horas de espera, pode voltar para casa sem o tratamento devido ou até sem o diagnóstico. Nas unidades de saúde da capital brasileira, faltam materiais para fazer exames, remédios, vacinas, além de profissionais para prestar atendimento. Ontem, o Correio percorreu cinco unidades em diferentes regiões e a palavra recorrente entre os usuários foi: desrespeito.

No Hospital Regional de Taguatinga (HRT), os pacientes estavam revoltados. A professora Flávia Alves, 35 anos, se desesperou com a falta de informação. O filho dela, de 11 anos, tem problemas psiquiátricos e, ao meio-dia, sofreu uma convulsão. "Ele chegou desmaiado e foi direto para a pediatria. Tomou soro e foi liberado. Segundo o médico, ele precisava ser atendido por um neurologista e no local não havia. Ele me mandou ir para outro hospital", relatou. A maior reclamação da professora foi ter saído da unidade sem saber o que o filho tinha. "Vou pagar um atendimento em um hospital particular. Não recebi nem meu salário ainda, mas não posso ver meu filho nessa situação", completou.

A crise na saúde se agravou no fim de 2014, quando o governo começou a atrasar salários e benefícios. Em 9 de janeiro deste ano, auxiliares administrativos, técnicos de enfermagem e outros profissionais que, juntos, somam 104 categorias entraram em greve. Apesar de ter recebido o salário no sábado, os servidores representados pelo SindSaúde ainda não sabem quando 13º, horas extras e férias entrarão na conta. "Nós decidimos parar as atividades até que o problema seja normalizado. O governo afirmou que não dará o calote, mas queremos uma proposta formal sobre a maneira que eles encontrarão para quitar as dívidas", afirmou a presidente do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Saúde (Sindsaúde), Marli Rodrigues.

Reunião

Hoje, o governo apresentará uma proposta aos trabalhadores. Amanhã eles decidirão se mantêm as paralisações. A Procuradoria-Geral do Distrito Federal (PGDF) ajuizou uma ação no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) para pedir o fim da greve. No documento, afirmou que a paralisação é ilegal por três motivos: "a ausência de notificação prévia, a gravidade da suspensão do serviço público de saúde e o desrespeito à negociação que está em curso", diz nota divulgada pela PGDF. No mesmo dia em que a greve foi judicializada, dentistas, médicos e enfermeiros decidiram apoiar o movimento do SindiSaúde. Por volta de 11h30, as categorias fecharam três vias do Eixo Monumental para protestar.

A Secretaria de Saúde do DF afirmou, por meio de nota, que reconhece a dívida com os trabalhadores e esclareceu "que o pagamento será feito em momento oportuno". "A pasta ressalta ainda que as horas extras feitas a partir desta gestão serão pagas normalmente, ou seja, 60 dias após a realização das atividades". O órgão reconheceu a falta de alguns insumos e materiais e disse que trabalha para a regularização das entregas.

600 Quantidade de profissionais de creches conveniadas do GDF sem o 13º salário

Casos de abandono

Enquanto isso, a dona de casa Rosângela Reis, 22 anos, tentava atendimento para o filho de 1 ano e cinco meses no Hospital Regional do Guará (HRGu). "Ele está com princípio de pneumonia, tem febre de 38ºC a 39ºC há quatro dias. Vim da Estrutural para tentar atendimento. Não havia pediatra. Como só tinha o dinheiro para uma passagem, vou voltar para casa sem atendimento", lamentou. Em Ceilândia, Cleide dos Anjos foi atendida, mas o hospital da localidade não realizava o exame que ela precisava, a broncoscopia. "Estou com uma espinha de peixe na garganta. Sinto muita dor e não como há dois dias. Eles me encaminharam ao Hospital de Base, mas disseram que só haverá ambulância para me levar às 19h", contou à reportagem por volta do meio-dia.

No Hospital Regional de Samambaia, as roupas usadas pelos pacientes não estão sendo lavadas e se acumulam na parte lateral do hospital, causando odor forte. O Correio conseguiu fotos do interior da lavanderia do hospital: as máquinas de lavar não passaram por manutenção, estão velhas e enferrujadas.

EmTaguatinga, a reclamação do autônomo Eudenys Nascimento Almeida, 26, era sobre a situação da filha de 11 meses. Ele e a esposa, Ana Carolina Almeida, 22, estavam em uma maca desde as 18h de terça-feira sem um diagnóstico. "Minha filha está com febre, diarreia, vomitando desde domingo. Passamos pelo hospital de Santa Maria, não tinha pediatra. O do Gama estava lotado. Conseguimos atendimento aqui, mas não temos informações e não deram comida para a minha filha desde ontem (terça)", reclamou.

O salário de dezembro de professores e auxiliares de ensino deve estar na conta dos trabalhadores na manhã de hoje. Ainda assim, devido ao atraso no pagamento de férias, as duas categorias continuam ameaçando paralisações para o início do ano letivo, em 23 de fevereiro. Os funcionários de secretarias pararam de efetuar matrícula em várias escolas.

De acordo com a assessoria de imprensa da Secretaria de Educação, o órgão promoverá mutirões ou estenderá o prazo para estudantes efetuarem o registro.

Enquanto isso, 12 creches conveniadas do GDF estão sem receber há quatro meses. Cada unidade atende cerca de 100 crianças e estima-se que 600 profissionais estão sem o 13º.