Quase um ano após o início da Operação Lava-Jato, que revelou um esquema de corrupção na Petrobras, a presidente Dilma Rousseff decidiu afastar Maria das Graças Foster do comando da estatal. Ela e todos os diretores da companhia deverão deixar os cargos em março, quando será apresentado ao Conselho de Administração o balanço financeiro referente a 2014. 
 
Apesar dos conselhos de aliados e auxiliares - como o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante -, Dilma se recusava a abrir mão de Graça, considerada uma indicação de sua cota pessoal para presidir a Petrobras em 2012. A gota d"água foi a cifra de R$ 88 bilhões de perdas estimadas pela estatal na divulgação, semana passada, de seu balanço não auditado.
 
A decisão de substituir Graça teria sido tomada semana passada, em reunião do conselho político do governo, no Palácio da Alvorada, quando Dilma mudou de opinião. No entanto, só ontem a informação foi admitida por auxiliares da presidente. Ela combinou com Graça, que já havia posto o cargo à disposição duas vezes, que a executiva permaneceria no posto para assinar o balanço. Isso porque nenhum novato aceitaria neste momento se responsabilizar pelas contas da companhia.
 
A empresa de auditoria externa, PwC, recusa-se a avalizar as contas da estatal por causa da dificuldade de a empresa calcular as perdas com o superfaturamento de investimentos. Até políticos e técnicos ligados ao PT com perfil para o cargo resistem às sondagens.
 
A substituição da diretoria foi detalhada ontem à tarde em uma reunião de Graça com Dilma no Palácio do Planalto. A data da substituição pode ser antecipada, segundo um interlocutor da presidente, se Graça alegar desgaste físico e emocional. Ela vem dando sinais de estresse causado pela série de problemas na estatal. Nesse cenário, assumiria a presidência um interino que esteja hoje na direção da empresa.
 
Tentativa de recuperar credibilidade
Ano passado, Graça tomou iniciativas para se credenciar como responsável por recuperar a credibilidade da estatal. Determinou investigações internas e criou uma Diretoria de Governança, Risco e Conformidade para coibir irregularidades, sem sucesso. Ao pedir a prisão do ex-diretor Nestor Cerveró, em janeiro, o Ministério Público Federal afirmou que "não há indicativos de que o esquema criminoso foi estancado". Os procuradores afirmaram ter notícias de propinas pagas por empresas a diretores da Petrobras em 2014.
 
Embora as denúncias de corrupção na Petrobras investigadas na Operação Lava-Jato tenham ocorrido na gestão de José Sérgio Gabrielli, Graça integrava a diretoria da estatal desde 2007 e participou de decisões tomadas na gestão do antecessor. A situação dela ficou mais delicada quando a geóloga Venina Velosa da Fonseca, ex-gerente executiva da Diretoria de Abastecimento, revelou e-mails que teria enviado a Graça entre 2009 e 2011, nos quais relata irregularidades em contratos que eram de responsabilidade do ex-diretor Paulo Roberto Costa. Graça levou quatro dias para responder claramente às acusações de Venina, argumentando que as mensagens "não explicitaram" irregularidades.
 
Ontem, no aeroporto de Brasília, ao embarcar para o Rio após reunião no Planalto, Graça foi lacônica ao ser indagada pelo GLOBO se deixaria a estatal. Não respondeu e apenas sorriu.
 
- A reunião foi boa, como sempre - disse.
 
À tarde, o ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência, Thomas Traumann, disse que a reunião durou quase duas horas. Questionado se Graça continuaria à frente da Petrobras em 2015, respondeu apenas:
 
- O que posso dizer é que essa questão não foi decidida na reunião entre ela (Dilma) e Graça Foster.
 
À noite, a secretaria informou que não comentaria o assunto. Nas próximas semanas, Dilma precisará encontrar um nome de peso que aceite assumir o comando da Petrobras neste momento. Isso vale também para a composição do Conselho de Administração, que Dilma quer preencher com nomes respeitados pelo mercado. Os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, do Planejamento, Nelson Barbosa, e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, além de Mercadante, foram incumbidos de buscar esses nomes.
 
Estimativa de rombo irritou planalto
Boatos sobre a saída de Graça já circulavam nos corredores da Petrobras na manhã de ontem, antes de a decisão de Dilma ser confirmada. Com Graça em Brasília, a diretoria da estatal se refugiou nos gabinetes, deixando os subordinados sem informações. Nos corredores, a queda de Graça foi atribuída à estimativa de prejuízos de R$ 88 bilhões no balanço da semana passada. O número desagradou ao governo porque foi considerado superestimado até pelos técnicos da empresa.
 
O ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli endossou essas críticas. Em entrevista ao jornal "Valor Econômico" na segunda-feira, ele criticou essa contabilidade. Para ele, é impossível separar, nas demonstrações contábeis da Petrobras, o custo da corrupção de outros fatores de depreciação de investimentos, como câmbio, preço do petróleo e alterações nas condições de mercado. "Tem uma série de coisas misturadas aí nesses números", disse Gabrielli.
 
Colaborou para o clima de informações desencontradas a licença do gerente executivo do Departamento Jurídico da Petrobras, Nilton Maia, na segunda-feira. Uma fonte disse ao GLOBO que ele foi afastado do cargo, mas a Petrobras informou que ele pediu para tirar férias atrasadas para um tratamento de saúde. Nos últimos meses, Maia era um dos responsáveis pelas Comissões Internas de Apuração (CIAs) abertas pela estatal para investigas denúncias de corrupção da Lava-Jato.
 
 
Estilo austero não resistiu à maior crise da empresa

 
Em três anos anos na presidência da Petrobras, Maria das Graças Foster, foi do céu ao inferno. Ao assumir o comando da maior empresa do país, em fevereiro de 2012, com seu estilo austero, era considerada no governo e por especialistas do setor a mulher forte que colocaria a Petrobras de volta a um ritmo de crescimento menor do que o do seu antecessor, José Sérgio Gabrielli, porém de forma sustentada e segura.
 

Não foi, porém, o que ocorreu, por conta também do controle de preços dos combustíveis pelo governo. Por fim, ela sucumbiu ao maior escândalo de corrupção da história da estatal, revelado pela Operação Lava-Jato.

O esquema de corrupção, que teria começado em 2003, atingiu Graça diretamente. Na gestão anterior da Petrobras, quando o esquema operou a pleno vapor, chefiado pelos ex-diretores de Abastecimento Paulo Roberto Costa e de Engenharia Renato Duque, além de outros ex-funcionários da estatal, Graça era diretora de Gás e Energia. Duque e Costa foram substituídos por Graça, que, ao assumir a presidência, nomeou nova diretoria.

A situação de Graça no comando da estatal se complicou ainda mais quando Venina Velosa da Fonseca, ex-gerente-executiva da Diretoria de Abastecimento, afirmou que a presidente da Petrobras foi informada das irregularidades por e-mail e pessoalmente, desde 2008. No final de 2014, Graça pôs o cargo à disposição à presidente Dilma Rousseff.

Amiga de Dilma, Graça tinha o apoio da presidente desde 2003, quando foi indicada para a Secretaria de Petróleo e Gás do Ministério de Minas e Energia. Na época, Dilma comandava a pasta. Graça começou a trabalhar na Petrobras em 1978 como estagiária e se tornou a primeira mulher do mundo a comandar uma companhia de petróleo. Ontem, garantiu no voo de ida a Brasília que é presença garantida no desfile da União da Ilha. É diretora da escola.