Uma servidora do Ministério do Planejamento é acusada pela Polícia Federal de ter orquestrado um esquema de fraude na concessão de indenização da Comissão da Anistia. Pelo menos R$ 1,2 milhão foi desviado. A operação deflagrada ontem pela Polícia Federal cumpriu três mandados de busca e apreensão, dois em Brasília e um em Teresina, onde a suspeita, que não teve o nome divulgado, tem parentes. De acordo com a PF, a servidora de carreira da pasta se aproveitou de uma brecha no sistema para incluir o nome de três pessoas próximas entre os que deveriam receber o benefício do governo. Cada pagamento foi de aproximadamente R$ 400 mil. Do total, a PF apreendeu R$ 600 mil e pretende reaver o restante.

A funcionária foi afastada do setor, mas continua batendo ponto no ministério. De acordo com a delegada que chefiou a operação, Fernanda Costa Oliveira, a PF pediu a exoneração dela assim que teve ciência da fraude. “Ela foi afastada, só que a Justiça a manteve no ministério. A gente também pediu a demissão, mas a Justiça considerou que era uma decisão muito gravosa”, explica. A delegada diz que pedirá à Justiça que reveja o posicionamento.

Em nota, o Ministério do Planejamento afirmou que “solicitou abertura de processo de investigação à Polícia Federal e também apuração administrativa, por meio de sindicância, à corregedoria”. De acordo com a pasta, o processo administrativo (PAD) está em curso, e a servidora foi deslocada para outra área até que a investigação seja concluída. O resultado da condenação ou do processo administrativo pode resultar na demissão. No último caso, entretanto, é preciso o aval do ministro da pasta em que ela trabalha.

De acordo com a delegada, embora a servidora tenha concedido a indenização para amigos e parentes, ela foi a maior beneficiária do esquema. “Algumas pessoas próximas a ela também receberam, mas ela ficou com a maior parte”, ressalta. Fernanda destaca que a PF fará o possível para recuperar o restante do dinheiro que foi desviado. “Vamos tentar reaver o que foi sacado e pedir o bloqueio de outras contas”, diz. Segundo ela, a Justiça já concedeu a abertura do sigilo bancário, porém ainda não foi entregue para análise.

Brecha
A PF chegou ao caso com base no compartilhamento de informações com outras instituições. “Apuramos e vimos que ela se aproveitou de uma fragilidade no sistema”, explica. A servidora só interferia no fim do processo de concessão do benefício. A indenização é concedida pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, após avaliação para identificar se a pessoa tem o direito. O parecer favorável segue para a direção do ministério. Depois de assinado pelo ministro da Justiça, é encaminhado para o Ministério do Planejamento. Na hora de fazer o cadastro para pagamento, a servidora aproveitava o número correto de portarias antigas e acrescentava dados de amigos e parentes. Procurada, a comissão não se manifestou sobre a fraude.

Para saber mais
Reparação pelas perdas
A Comissão de Anistia do Ministério da Justiça foi criada em 2001, com o objetivo de reparar as vítimas da ditadura. Ela analisa pedidos de indenização formulados pelas pessoas que foram impedidas de trabalhar, por motivação exclusivamente política, de setembro de 1946 a outubro de 1988. Os valores das indenizações são equivalentes ao que pertence a essas pessoas e foi retirado. Inicialmente, algumas ações foram de até R$ 2 milhões, mas atualmente são raras as indenizações milionárias. No caso da fraude no Ministério do Planejamento, por exemplo, foram de aproximadamente R$ 400 mil. Todos os apreciados são submetidos à decisão do ministro da Justiça.

A anistia está prevista no art. 8º do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal de 1988, o qual é regulamentado pela Lei nº 10.559, de 13 de novembro de 2002. Segundo a comissão, a reparação econômica, referida na Lei, “poderá ser concedida em prestação única correspondente a 30 salários mínimos por ano de perseguição política até o limite de R$ 100 mil ou prestação mensal que corresponderá ao posto, cargo, graduação ou emprego que o anistiando ocuparia se na ativa estivesse, observado o limite do teto da remuneração do servidor público federal”.

Algumas pessoas próximas a ela também receberam, mas ela ficou com a maior parte
Fernanda Costa Oliveira, delegada responsável pela investigação