Em meio à maior crise em 61 anos de existência, a Petrobras enfrenta agora a renúncia coletiva de cinco diretores e da presidente, Maria das Graças Foster. Na noite de terça-feira, ao chegar de Brasília, depois de uma reunião com a presidente Dilma Rousseff, a comandante da estatal seguiu para a sede, no Rio, onde os subordinados estavam reunidos, à sua espera.
Graça, como gosta de ser chamada, relatou que a chefe de Estado queria que todos continuassem nos cargos até o fim do mês. Foi uma espécie de acordo entre ela e Dilma na reunião da tarde. Não houve receptividade. A presidente da estatal deparou-se com uma rebelião dos diretores, sob o argumento de que seria um contrassenso a permanência de todos diante da informação pública de que sairiam. Declararam-se também irritados com uma nova investigação aberta pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre irregularidades na estatal, na qual poderão ser punidos. E decidiram, então, renunciar de modo imediato. Graça disse que os acompanharia. Telefonou, então, para o Palácio da Alvorada e comunicou a decisão a Dilma.
Na manhã de ontem, a informação da renúncia começou a circular informalmente no mercado, levando a uma nova alta dos papéis da empresa na Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa). Diante disso, a CVM cobrou explicações da Petrobras, que emitiu um lacônico comunicado. Em três linhas, relatou a renúncia de diretores, sem citar nomes. A demissão coletiva será analisada, amanhã, na reunião extraordinária do Conselho de Administração da estatal. O órgão regulador considerou a mensagem insuficiente, e enviou novo questionamento à companhia: por que não publicou um fato relevante, mais completo, antes da abertura da bolsa?
Os diretores que renunciaram a seus cargos são: José Formigli (Exploração e Produção), Almir Barbassa (Finanças), Alcides Santoro (Gás e Energia), José Figueiredo (Engenharia) e José Cosenza (Abastecimento). Ficam nos cargos apenas o diretor Corporativo, José Eduardo Dutra, que está afastado por motivos de saúde; e o recém-empossado na Diretoria de Governança, João Elek, selecionado por um headhunter para tentar acabar com os desmandos na estatal. “É incrível: hoje, a Petrobras amanhece sem presidente, sem balanço e sem perspectivas para o ano que mal começou”, disse um técnico do governo
Superfaturamento
A renúncia da diretoria da Petrobras já era esperada pelo mercado desde setembro, quando as denúncias de corrupção se intensificaram e as perdas da estatal com superfaturamento e pagamento de propina atingiram cifras bilionárias. A dúvida que ainda paira no ar é como será o defecho do maior escândalo de corrupção da história do país, com novos diretores que assumirão uma companhia de capital aberto sem balanço auditado, com problemas de caixa e dificuldades de captar recursos para dar continuidade ao seu plano de negócios.
No entender do diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie), Adriano Pires, a ex-presidente Graça Foster não tinha mais condições de se manter no cargo porque ninguém mais estava acreditando nas medidas tomadas por ela. “Mas a forma como saiu foi estranha, exatamente no momento em que começou a falar a verdade, divulgando que os prejuízos com a corrupção poderiam chegar a R$ 88,6 bilhões”, comentou.
A situação para quem assumir a petroleira não será nada boa, de acordo com Pires. “Além de ter competência, a nova direção terá que ser respeitada e não agir como Graça agia, a mando do governo do PT. A dúvida é se os novos diretores terão autonomia para falar a verdade”, disse. Os futuros executivos também terão pela frente o desafio de assumir uma empresa sem balanço contábil. “O governo pretendia manter Graça até a divulgação oficial e revisada das demonstrações financeiras, mas ela desistiu no meio do caminho.”
A gestão de Graça durou quase três anos, desde 13 de fevereiro de 2012. Analista da área de petróleo da corretora Coinvalores, Bruno Quiaventini lembrou que, na época, o nome da engenheira química foi muito bem recebido, pelo perfil técnico, em contraste com o antecessor José Sérgio Gabrielli, ligado ao ex-presidente do PT José Dirceu. “Mas ela não conseguiu apresentar resultados. Não se sabe se por limitações pessoais ou porque, na situação em que a empresa se encontra, isso não seria possível”, comentou.
Perda de valor
No triênio de Graça, a estatal perdeu aproximadamente R$ 200 bilhões em valor de mercado, ou 61% do montante no início do período. Quiaventini afirma que a nova diretoria precisará reduzir a alavancagem, que faz da companhia a mais endividada do mundo em termos absolutos, o que exigirá a redução de investimentos. Graça já tinha dado início a esse processo, anunciando o cancelamento da construção de refinarias no Maranhão e no Ceará.
Na avaliação do economista-chefe da Órama, Álvaro Bandeira, a renúncia da presidente e de cinco diretores é apenas a primeira coisa que deveria ocorrer na empresa. “Se fosse uma companhia privada, isso já teria ocorrido há muito mais tempo. Mas antes tarde do que mais tarde”, comentou. Para o especialista, a nova diretoria terá que assumir com uma nova postura, não permitindo mais tanta interferência do governo e ingerência, sobretudo, na fixação dos preços dos derivados. “A situação financeira da companhia é delicada e ela está a um passo de perder o grau de investimento. Se isso ocorrer, vai complicar ainda mais a captação de recursos e aumentar o custo de rolagem da dívida.”
Bandeira explicou que o caixa da Petrobras já está abalado e a companhia tem muitos processos a responder nos Estados Unidos e no Brasil, com multas pesadas. “Quem assumir terá que investir menos, trabalhar melhor os projetos de maior retorno e vender ativos. Só assim a Petrobras poderá se capitalizar”, assinalou.