O ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, disse ontem que o governo vai deflagrar agora a negociação dos cargos de segundo escalão. Ele admitiu que o governo estava esperando a eleição das Mesas da Câmara e do Senado para fazer as nomeações e disse que o preenchimento dos cargos levará em conta critérios técnicos, mas também o "apoio parlamentar no Congresso". Ontem, Mercadante adotou um tom ameno em relação ao novo presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e não poupou elogios ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), reeleito pela quarta vez.
 
Nos bastidores, o governo vinha tentando vincular o preenchimento dos cargos do segundo escalão ao apoio ao deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) à Presidência da Câmara. Mas a estratégia não deu certo. Agora, a ideia é negociar como forma de recompor a base.
 
- O segundo escalão começa a ser montado agora no mês de fevereiro, sob a condução da presidente Dilma. É ela que vai, obviamente, decidir toda essa distribuição de cargos. A partir de agora, inclusive para respeitar a eleição da Casa, começam as negociações com os partidos para definir o segundo escalão - disse Mercadante.
 
Perguntado se o clima era de "ressaca" diante da derrota na Câmara, Mercadante disse a hora era de muito trabalho. Segundo ele, a conversa com Eduardo Cunha foi rápida e tratou da independência e harmonia entre os Poderes. O ministros deixou clara, porém, a predileção do Planalto pela reeleição de Renan no Senado, que teria "um importante compromisso com a governabilidade". Ele venceu o senador Luiz Henrique (PMDB-SC). Mercadante ressaltou que, no caso do Senado, a base manteve "uma ampla unidade".
 
- Como disse o presidente Renan, essa eleição já aconteceu. Agora, precisamos pensar nos desafios do Brasil, construir uma agenda. A disputa parlamentar faz parte da democracia, inclusive dentro da base. No Senado, foi reeleito o senador Renan, que tem longa experiência parlamentar - disse Mercadante, lembrando a declaração de Renan de que a eleição da Mesa agora "era passado".
 
Jornalistas expulsos
Antes de ir ao plenário da Câmara para levar a mensagem do Executivo na sessão de abertura dos trabalhos legislativos, Mercadante se reuniu no cafezinho do Senado com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, o ministro de Relações Institucionais, Pepe Vargas, e o senador Edison Lobão (PMDB-MA). Quando viu a presença de jornalistas que têm acesso ao local, Mercadante pediu que os assessores esvaziassem o local.
 
 
 

Apelidos na Corte: 'Pepe Legal' e 'Freddie Mercury'

Deputados ironizam Mercadante e Pepe Vargas; Cunha diz que só pisa no Palácio do Planalto se for para ser recebido pelo presidente Dilma Roussefftas

MARIA LIMA

BRASÍLIA - Mais do que a vitória de Eduardo Cunha, os cerca de 200 correligionários do peemedebista saborearam com champanhe em uma casa de festas do Lago Sul a fragorosa derrota imposta ao PT e ao Palácio do Planalto. Os tempos em que Cunha tinha como interlocutores principais no governo os ministros Pepe Vargas (Relações Institucionais) e Aloizio Mercadante (Casa Civil) ficaram para trás. Os dois foram inclusive os mais zombados na comemoração, batizados ironicamente de "Pepe Legal" e "Freddie Mercury". Segundo aliados de Cunha, a derrota de Arlindo Chinaglia deveria ser debitada na conta da dupla de articuladores.

O novo presidente da Câmara foi recebido com gritos de "Brasil pra frente, Cunha presidente!". Disposto a se fazer respeitar como o segundo na linha sucessória da Presidência, o vitorioso foi taxativo nas conversas: só "pisa" no Palácio do Planalto se for para ser recebido pela presidente da República. A festa foi oferecida pelo deputado Júlio Lopes e pelo empresário Venancinho, a custo zero para o partido, segundo Cunha.

Os peemedebistas diziam que mesmo com 30 ministros trabalhando incansavelmente nos últimos dias, o Planalto só conseguiu agregar mais cerca de 40 votos aos cerca de 90 que o petista já tinha do PT, PCdoB e outros aliados. Também comentaram muito o fato de o tamanho da derrota do PT ter sido estendido aos cargos da Mesa Diretora, onde não há um aliado fiel do partido, e às comissões temáticas.

— Eu não impus essa derrota ao PT. Eles é que se derrotaram — disse Eduardo Cunha.

Na avaliação dos peemedebistas, qualquer que fosse o candidato do Planalto, a derrota aconteceria do mesmo jeito, porque "a grife PT não está muito vendável no mercado".

Para não aprofundar a crise de relação com o PT, o vice-presidente Michel Temer não foi à festa de Cunha. Mas recebeu no Palácio do Jaburu uma turma liderada pelo ex-ministro Moreira Franco, Geddel e outros peemedebistas mais próximos. Os aliados de Cunha, na festa, avaliaram que o presidente reeleito do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que precisou da ajuda do Planalto, "vai virar instrumento" do governo.

Antes de se sentar para tomar "só uma taça de vinho" com a família, Cunha teve que apagar um incêndio com Levy Fidélix. Muito exaltado e fazendo sinal com o dedo do meio, ele mandava "se f..." Luis Tibé, presidente do PTdoB, que integra com o PRTB o bloco de nanicos que apoiou Cunha. Queria que Cunha tirasse o PTdoB do bloco porque o partido fechou com Chinaglia.

— Traíra? Rua! O cara iludiu a gente, estava negociando cargo, pô! Queria levar a gente pra lá, e o que eu quero é derrotar o PT — esbravejava Fidélix, dizendo que, com 17 deputados, o bloco dos nanicos ia ganhar uma comissão técnica na nova gestão da Câmara.

A movimentada eleição da Câmara estimulou também uma verdadeira casa de aposta entre os parlamentares. Um bolão promovido entre os apoiadores de Cunha mobilizou 53 deputados O vencedor foi o deputado Pedro Paulo (PMDB-RJ), pré-candidato de Eduardo Paes à própria sucessão na prefeitura do Rio. A aposta era de R$ 50 por cabeça.

Pedro Paulo garante que seu palpite não foi "chutado". Ele fez uma série de cálculos, criou indicadores levando em conta as apostas dos colegas. Por exemplo, constatou que a média entre os apostadores era de 295,2 votos para Cunha e o voto da "moda" era 287, número que obteve o maior número de adesões, quatro ao todo. O deputado, então, criou a "taxa de traição" entre as bancadas e chegou ao número final de 266. Mas, ao perceber que alguém já tinha feito essa projeção, aumentou em um voto sua aposta, para 267, resultado vencedor.

— Não queria dividir o prêmio com ninguém — disse. — Meu pai era estatístico. Sempre fui craque em matemática. Econometria e cálculo probabilístico eram minhas melhores matérias na faculdade e no mestrado em Economia — disse o vencedor, que prometeu doar o prêmio para o fundo dos servidores. (Colaborou Evandro Éboli)