Correio Braziliense – 20/12/2014 04:00
Anny Fischer, 6 anos, recebeu a primeira autorização judicial para importar a substância
Embora o canabidiol (CBD) ainda não seja aprovado no Brasil, pelo menos duas companhias que produzem medicamentos para tratar crises epilépticas de difícil controle e para sintomas da esclerose múltipla procuraram a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para entrar no mercado brasileiro. Os laboratórios deram início ao processo de registro para vender produtos a base de princípios ativos da cannabis sativa (maconha). A pressa pode facilitar o tratamento em inúmeros pacientes. Ambos medicamentos já são usados em outros países.
Um dos pedidos à disposição da análise da Anvisa é o do Sativex, fabricado pela Ipsen e GW Pharma e registrado em 25 países, segundo a empresa. Sob a forma de spray oral, o produto é usado para tratar um dos sintomas da esclerose múltipla. Concluídos, os estudos clínicos e o dossiê técnico-científico sobre o medicamento foram entregues à agência.
Outro produto que deve ter a solicitação de registro no Brasil em breve é o óleo à base de CBD, fabricado pela Hempmeds. O produto é indicado no tratamento de epilepsias graves e o mesmo usado por algumas famílias no Brasil para reduzir o número de convulsões dos pacientes. É o caso da menina Anny Fischer, 6 anos, que recebeu a primeira autorização judicial para importar a substância. Segundo a assessoria de comunicação da Hempmes no Brasil, a companhia está levantando os documentos necessários para dar entrada no pedido e regularizar a venda no país.
Apesar de ter o pedido de registro no Brasil como um medicamento, o produto da Hempmeds é vendido nos Estados Unidos em forma de pasta e barras de suplemento alimentar, por exemplo. Ao contrário do óleo, o Sativex tem uma peculiaridade porque é composto por 50% de canabidiol e 50% de tetraidrocanabinol (THC), outra substância derivada da maconha e responsável pelos efeitos psicoativos da planta.
De acordo com a Anvisa, não há regra que impeça as empresas de solicitarem o registro de produtos com substâncias proibidas, porque trata-se de uma avaliação dos estudos apresentados. “O processo de registro segue a rotina dos demais, inclusive em relação aos requisitos de pesquisa clínica, comprovação de eficácia e segurança”, informou a agência.
A Anvisa esclareceu, entretanto, que a análise do pedido é um processo não relacionado à eventual reclassificação do canabidiol, pois trata-se de verificar os requisitos de eficácia e segurança. Se houver indicativo de deferimento das solicitações, a Coordenação de Produtos Controlados (Cpcon) da agência deverá ser informada para reavaliar a classificação da substância.
Em relação ao medicamento Sativex, a agência ressalta que o fato de ele ter não somente o CBD, mas também o TCH, faz com que seja necessária outra adequação na lista de proscritos, caso haja o deferimento do pedido. A solicitação da Ipsen foi feita no último dia 4.
Discussão
Os debates sobre a reclassificação do CBD foram intensificados desde o início do ano e a Anvisa analisa a possibilidade de mudança da substância de proibida para controlada (veja linha do tempo). A decisão sobre a alteração, entretanto, foi adiada duas vezes. A primeira delas em maio e a segunda nesta semana. Diante da pressão das famílias de pacientes que precisam do produto, a Anvisa afirmou que analisará a questão na primeira quinzena de 2015.
Recentemente, a agência também facilitou a importação do produto pelo caráter de excepcionalidade. Os documentos apresentados no momento do pedido valerão por um ano e a cada nova solicitação será necessário apresentar apenas a receita médica. No primeiro pedido, além da prescrição, médico e paciente deverão assinar um termo de responsabilidade e outros dados gerais. O passo a passo para a solicitação ficará disponível no site da agência.
LINHA DO TEMPO
Confira os principais acontecimentos relacionados ao processo de flexibilização do canabidiol em 2014
28 de março
» Foi lançada a campanha Repense de debate e reflexão sobre o uso medicinal da maconha no Brasil, com o lançamento do Curta Legal.
3 de abril
» A menina Anny Fischer torna-se o primeiro caso no Brasil a importar o remédio derivado da maconha feito nos Estados Unidos.
23 de abril
» A Anvisa concede a primeira autorização para a compra de medicamento à base de CBD ao paciente Gustavo Guedes.
23 de maio
» A Anvisa adia a decisão sobre a reclassificação do canabidiol de proibido para controlado.
29 de agosto
» Primeira autorização para uso de remédio com 43% do THC, um dos derivados da maconha, é dada a Juliana de Paolinelli.
9 de outubro
» Lançamento do Filme Legal com histórias de famílias que lutam pelo uso da cannabis medicinal.
11 de outubro
» Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) regulamenta a prescrição do canabidiol.
11 de dezembro
» Conselho Federal de Medicina (CFM) autoriza médicos a prescreverem medicamentos a base de CBD.
18 de dezembro
» Reunião da Anvisa é cancelada e a decisão sobre a reclassificação do CBD é mais uma vez adiada.
19 de dezembro
» A Anvisa publica o passo a passo com regras simplificadas para importar o canabidiol.