O arrocho fiscal que será imposto pela futura equipe econômica ao longo dos próximos dois anos fará com que o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e o volume dos investimentos em infraestrutura como antecipou o Correio há três semanas sofram uma redução brutal. Mas o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, iniciado em 2011 e que se encerra no término deste mês, também foi pouco deslumbrante no quesito liberação de verbas e conclusão de obras.

Na prática, isso significa que pelo menos seis dos oito anos de Dilma à frente do Palácio do Planalto três quartos do tempo serão de investimentos aquém do que o país precisa para retomar o ritmo de pujança da economia. Existem vários nós que precisam ser desatados no setor de investimento em infraestrutura. E a presidente Dilma precisa aprender que esses problemas não são resolvidos apenas na base do grito, destacou o fundador da ONG Contas Abertas, Gil Castelo Branco.

Levantamento feito pelo Contas Abertas a pedido do Correio mostra que, durante as duas etapas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 1 e 2), entre 2007 e 2014, foram aplicados cerca de R$ 1,49 trilhão. Desse total, apenas 10% saíram do Orçamento Geral da União (OGU). O investimento das empresas estatais contribuiu com quase 30% do total, ou R$ 434 bilhões.

O setor privado aplicou outros 20% do total investido no PAC, por meio das parcerias público-privadas e das concessões em obras de infraestrutura. A maior parcela (34%) é composta por empréstimos habitacionais, como os do programa Minha Casa, Minha Vida e outros, concedidos pelos bancos públicos. Os dados são do último balanço do PAC, divulgado em abril.

Se as cifras são impressionantes, os resultados finais, porém,  decepcionam. Dos pouco mais de 48 mil empreendimentos incluídos no conjunto de ações do PAC 2, apenas 15,8% pouco mais de 7,7 mil foram concluídos. Desse total, apenas 0,1% (57) está em funcionamento. Quase metade das obras, mais precisamente 45,6%, equivalente a 22,2 mil empreendimentos, não saiu do papel. Outros 18,8 mil (38,6%) estão em execução.

Quando se olham os desembolsos orçamentários globais envolvendo as duas etapas do PAC, chega-se à astronômica cifra de R$ 1,19 trilhão. Mais da metade desse montante foi destinado a empréstimos habitacionais subsidiados, como os do Minha Casa, Minha Vida, com R$ 578,5 bilhões. 

O Minha Casa, Minha Vida é praticamente um empreendimento privado. As empreiteiras apresentam o projeto à Caixa Econômica Federal (CEF) e, caso seja aprovado, vendem as unidades à população. O papel do governo nesse processo é apenas subsidiar a mensalidade para que ela se adeque ao orçamento da população mais carente, contestou Gil Castelo Branco. Para ele, a inclusão do MCMV nos números é uma forma de mascarar o mau desempenho das obras de infraestrutura.

O economista especializado em administração pública José Matias-Pereira lembra que o investimento público, sobretudo em infraestrutura, sempre foi um dos principais entraves do país. Apesar disso, o que se observa é um declínio constante na confiança depositada no governo, principalmente depois da crise do mensalão. O governo se propôs a pôr em marcha uma série de investimentos, mas não contava com uma máquina pública azeitada e organizada o suficiente para isso, afirma. 

Na avaliação dele, que é professor do Departamento de Administração da Universidade de Brasília (UnB), não houve o esforço necessário para tornar a administração mais ágil. No PAC, o que funciona realmente é o Minha Casa, Minha Vida. Só que esse programa tem um impacto muito pequeno do ponto de vista da estrutura produtiva do país, completou.

Dilma Rousseff, apontada como a mãe do PAC, não conseguiu destravar esse processo ao longo dos últimos quatro anos. Além de todos os problemas técnicos, o governo sofre com a corrupção nas etapas de licitação e contratação como explicitado pela Operação Lava-Jato. 

No primeiro ano de mandato, a presidente fez uma faxina no Ministério dos Transportes e no Dnit, como recorda Gil Castelo Branco. Os gestores que entraram para substituir os afastados naturalmente se retraíram, com medo de cometer irregularidades. Isso afetou drasticamente o ritmo de desembolso dos investimentos, lembrou.

Gastos correntes
As dificuldades para alavancar o investimento ficam evidentes quando as cifras são avaliadas em relação ao conjunto das riquezas produzidas pelo país, o PIB. Entre 2011 e 2013, os investimentos do Orçamento da União e os das empresas estatais avançaram timidamente, de 3% para 3,32% do PIB.

Para efeito de comparação: nos três primeiros anos do segundo governo Lula, entre 2007 e 2009, o percentual cresceu de 2,2% para 3,19%. Ao longo dos três primeiros anos de Dilma, o investimento subiu a reboque das estatais: as empresas do governo saltaram de 1,9% do PIB, em 2011, para 2,3%, em 2013. No mesmo período, o investimento direto da União caiu de 1,01% do PIB para 0,98%.

Para Matias-Pereira, a elevação das despesas correntes está relacionada à desorganização das contas públicas. Ao longo dos últimos anos, alguns dos pressupostos de uma política econômica responsável foram sendo relegados a segundo plano. E foram sendo introduzidos expedientes como a contabilidade criativa. Os resultados, a longo prazo, tendem a ser ruins.


Ritmo lento

O governo pisará no freio do investimento nos próximos dois anos. Mas já foi assim nos últimos quatro. Confira

Total de empreendimentos incluídos no PAC 2 (2011-2014)

48.747

Obras que ainda estão no papel

22.231 (45,6%)

Obras em execução

18.814 (38,6%)

Obras concluídas

7.702 (15,8%)


Desembolso orçamentário incluindo as obras do PAC 1, iniciado em 2007

Custo total
R$ 1,1 trilhão

Transportes
R$ 124,3 bilhões, o que representa 11% do gasto total

Energia
R$ 381,6 bilhões, o que representa 34% do gasto total

Cidade Melhor
R$ 13,6 bilhões, o que representa 1% do gasto total

Minha Casa, Minha Vida
R$ 578,5 bilhões, o que representa 52% do gasto total

Água e Luz para Todos
R$ 17,3 bilhões, o que representa 2% do gasto total

Comunidade Cidadã
R$ 4,5 bilhões, o que representa menos de 1% do gasto total