Determinada a reacender as disputas por novos projetos de linhas de transmissão, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já definiu um novo patamar de remuneração das novas concessões do segmento que serão ofertadas nos próximos leilões. O atual custo médio ponderado de capital (Wacc, na sigla em inglês) está fixado em 5,54% por ano, mas vai oscilar entre 7% e 8% nos próximos certames realizados pela autarquia.

A mudança foi provocada pelas recorrentes frustrações do governo com os resultados dos leilões. Desde o ano passado, o deságio final das licitações veio caindo a cada disputa, até chegar o momento em que nenhuma empresa do setor se interessava mais pelos novos projetos, com a exceção das estatais do grupo Eletrobras (Furnas, Eletronorte, Chesf e Eletrosul). Em 2015, a situação chegou ao seu limite, quando nem as empresas federais quiseram assumir o risco dos projetos.

O diretor da Aneel, Tiago Correia, assumiu como um de seus primeiros desafios no posto a responsabilidade de calibrar a remuneração do segmento de transmissão à realidade atual do mercado brasileiro. Os estudos já foram concluídos e devem ser submetidos à avaliação final da diretoria nas próximas semanas. O governo deve retomar a licitação de 11 lotes rejeitados em 2014. Incluídos os projetos desse ano, os investimentos devem totalizar R$ 10 bilhões.

"Nos últimos dois anos a Aneel verificou uma perda de atratividade dos leilões de transmissão que pode ser percebida pela redução dos deságios praticados pelos agentes e pela existência de lotes não negociados. Isso decorre, em parte, pelo aumento da complexidade dos projetos licitados com desdobramento nos riscos de engenharia e de licenciamento ambiental", disse Correia ao Valor.

A nova estratégia do órgão regulador prevê, desta vez, a definição de uma banda de variação da taxa de retorno - entre 7% e 8%. Esse percentual será definido para cada projeto e não mais para um conjunto de leilões, quando é mantido até a próxima revisão do indicador.

Com o risco financeiro reduzido, as elétricas também contarão com um tempo maior para colocar as novas instalações de rede em operação. Os prazos máximos fixados nos editais têm sido descumpridos com frequência. A razão principal está associada aos problemas fundiários, de engenharia e licenciamento ambiental.

"Para resgatar a atratividade dos leilões de transmissão, os novos lotes serão licitados com premissas mais conservadoras para os prazos de execução e com uma melhor representação dos riscos na taxa de retorno", disse Correia.

Até hoje, o maior prazo já concedido pela Aneel para construção de uma extensão de rede elétrica foi de 46 meses. Isso ocorreu no mega-projeto que vai escoar a energia da hidrelétrica de Belo Monte, em construção no rio Xingu (PA), para o principal centro de carga do país, no Sudeste. Agora, a agência está disposta a conceder, por exemplo, prazos equiparados ao de construção das grandes hidrelétricas: cinco anos, nos leilões A-5.

Um projeto de transmissão, atualmente em estudo, deverá ser contemplado pela ampliação de prazo. Trata-se da linha que atenderá a hidrelétrica de São Luiz Tapajós, considerado o último grande projeto de geração na Amazônia. As licitações dos empreendimentos de geração e da transmissão vinculada ocorrerão no mesmo ano para não haver riscos de descasamento de prazos.

O leilão da usina, projetada para o rio Tapajós (PA), ainda depende do aval do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). No local está prevista formação de um complexo de usinas que deve totalizar a capacidade de 8,5 mil megawatts (MW). O ponto da rede básica de transmissão mais próximo está a cerca de 1 mil quilômetros da geração. A exemplo da dificuldade com a liberação da usina, o licenciamento da linha também deve envolver questões ambientais e indígenas controversas.

"Em grandes obras de infraestrutura existe muita incerteza em relação aos custos e riscos reais, de modo que a principal função do leilão é determinar o valor justo do contrato por meio da concorrência e do confronto das expectativas dos diferentes agentes. Quanto maior a atratividade, maior a competição e a chance do preço justo ser encontrado", disse Correia.

 

Mudança agrada empresas privadas do setor

 

O aumento nas taxas de retorno para projetos de transmissão sinalizado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) foi bem recebido por empresários e aumentou o interesse da iniciativa privada pelos leilões de novas linhas. “A taxa ficou muito acima das nossas expectativa e deve atrair interesse, na medida em que é muito mais realista e permite acomodar de fato os riscos”, disse o executivo de uma grande companhia do setor, que preferiu não ser identificado.
Ao elevar as chances de sucesso dos empreendimentos que vão a leilão neste ano, a remuneração melhor prevista para o segmento deve representar também uma oportunidade de crescimento para as companhias de capital privado. Apesar do enorme déficit do país em transmissão, essas empresas têm crescido pouco nos últimos anos, por conta da dificuldade de encontrar valor nos projetos licitados.
O aumento na taxa de retorno deve incentivar a entrada da Alupar em novos leilões em 2015, disse o diretor de novos negócios, Ênio Nucci. “Sem dúvida, tornou o negócio muito mais atrativo. Este ano será mais interessante”, ressaltou o executivo. Fundada em 2007, a companhia, que administra quase 6 mil quilômetros em linhas, cresceu basicamente por meio de fusões e aquisições. Desde 2011, levou apenas um lote de transmissão num certame realizado no começo do ano passado.
Apesar do otimismo o diretor ressalta que esperava uma taxa de retorno mínimo maior, na casa dos 8,5%, por conta principalmente do encarecimento do crédito. Neste ano, a fatia de itens financiáveis que podem contar com empréstimos do BNDES caiu de 70% para 50% e a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), que baliza os financiamentos concedidos pelo banco, passou de 5% para 5,5%. “Isso afeta praticamente 40% dos investimentos exigidos por cada projeto”, afirma o executivo.
A possibilidade de extensão dos prazos para entrega das linhas também foi bem recebida pelo setor. A demora no processo para obtenção de licenças de instalação era um dos principais problemas apontados pelas companhias. Muitas vezes, a autorização para implantação do projeto se arrastava por mais de um ano, comprometendo quase metade do horizonte de entrega.
“É um risco relevante e que as companhias não têm como mensurar. A licença pode levar três meses ou mais de um ano, dependendo dos problemas encontrados em cada projeto”, afirma Sami Grynwald, sócio-diretor da Thymos Energia. O risco de multas e penalidades por atraso é embutido no valor a ser ofertado pelo projeto, o que muitas vezes inviabiliza a elaboração da proposta pelas taxas que eram oferecidas.
O consultor pondera, contudo, que alguns projetos que foram a leilão nos últimos anos e não receberam ofertas precisam ficar prontos com urgência, o que diminui a margem de manobra do setor para grandes extensões no horizonte de entrega.

 

Distribuidoras terão mais prazo para quitar dívida

 

O ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, afirmou ontem que o pagamento dos dois empréstimos bancários tomados pelas distribuidoras no ano passado será alongado para 48 meses. Originalmente, a quitação da dívida deveria ocorrer em 24 meses.

O ministro explicou que, com a "reestruturação financeira" do setor, a distribuidoras passaram a contar a partir deste ano com uma folga maior de caixa. Segundo ele, haverá melhora dos "recebíveis" a partir das medidas que serão adotadas neste ano, que inclui o sistema de bandeiras tarifárias e as revisões extraordinárias.

Braga afirmou que a melhora nas condições financeiras das distribuidoras pode proporcionar uma renegociação de outras condições do empréstimo, como o nivel de juro acordado.

No ano passado, as distribuidoras tomaram dois financiamentos com um consórcio de bancos no valor total de R$ 17,8 bilhões. Na época, ficou acertado que seria cobrado o Certificado de Depósito Interbancário (CDI) mais 1,9% ao ano, para o primeiro empréstimo de R$ 11,2 bilhões, e CDI mais 2,35%, para a segunda liberação de crédito no valor de R$ 6,6 bilhões.

Braga também informou que o governo estuda medidas para reduzir o custo de térmicas em operação, o que incluiria a utilização de gás natural liquefeito (GNL) no lugar da queima de óleo combustível. "Estamos fazendo o estudo para substituir por um combustível mais barato. Entre eles o GNL, que está sobrando no mercado internacional", afirmou.

Segundo o ministro, com o uso do GNL, o custo das usinas com despacho pela ordem de mérito (pelo menor custo) poderia cair para R$ 200/MWh, despesa inferior ao atual valor máximo do Preço de Liquidação das Diferenças (PLD), de R$ 388,48/MWh, no mercado de curto prazo (spot).

 

Rio impede que empresas captem água na foz do Guandu

 

A seca no rio Paraíba do Sul, principal fonte de abastecimento do Estado do Rio de Janeiro, obrigou empresas a investir em alternativas emergenciais para manter as atividades sem risco no polo industrial de Santa Cruz, na zona oeste do Rio. Mesmo assim, a indústria fluminense trabalha com a possibilidade de um corte linear na oferta de água de até 30%. O setor tem sido afetado por restrições na captação de água dos rios.
Ontem, o governo do Rio comunicou às empresas CSA, Gerdau, FCC e Furnas, que têm operações na região, que irá reduzir ainda mais a vazão na foz do rio Guandu, o que praticamente inviabiliza a captação de água dessas empresas na forma como ocorre hoje. A medida é para garantir as condições técnicas necessárias para que a Cedae possa manter a captação para o sistema Guandu, que abastece a região metropolitana do Rio.

O que torna as condições para a Cedae e as empresas da região ainda mais críticas é a proposta Agência Nacional de Águas (ANA) de reduzir a vazão no rio Paraíba do Sul – na altura do reservatório de Santa Cecília – de 142 metros cúbicos por segundos, como vigora hoje, para 110 metros cúbicos por segundo, conforme a agência informou ao governo estadual ontem.

“O sistema de Guandu foi projetado para operar com vazão média de 250 metros cúbicos. Estamos trabalhando hoje com vazão de 140 metros cúbicos, mas 42 metros cúbicos descem para o Baixo Paraíba. A ANA manifestou esse desejo ontem, mas os técnicos nos alertaram que chegamos ao limite.

A Cedae não tem condições de operar com vazão inferior a 92 metros cúbicos”, resumiu o secretário do Ambiente, André Corrêa.

A alternativa oferecida pelo governo do Rio às empresas foi utilizar água descartada pela Cedae no processo de tratamento de água na estação de Guandu. Para isso, porém, elas terão que investir em uma adutora de 14 quilômetros, além do que já vinham planejando para se adaptar à crise hídrica.

A Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKCSA) vai gastar U$ 6 milhões em um projeto para modificar o ponto de captação da água. O objetivo é contornar a língua salgada, fenômeno em que a água do mar invade o leito do Rio, e que faz com que a água captada seja tão salgada a ponto de ser inutilizada.

A obra deve demorar cinco meses. Já na FCC, segundo o coordenador de meio ambiente da empresa, Abílio Saia, a alternativa estudada é contratar água de uma linha de abastecimento da Cedae, em vez de fazer a retirada diretamente do Guandu. A operação torna a água 25 vezes mais cara.

 

Projeção do ONS indica mais chuva em fevereiro

 

O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) prevê a ocorrência de fenômenos climáticos e frente frias que poderão trazer chuvas para as regiões Sudeste e Centro-Oeste no início de fevereiro.

 

O quadro foi apresentado para empresas do setor elétrico, em reunião ontem, na sede do operador, no Rio, conforme o Valor apurou.

O operador informou que há expectativa para a formação de uma Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS), fenômeno climático que acentua a ocorrência de chuvas no Sudeste, na primeira quinzena de fevereiro.

O ONS também trabalha com expectativa de que no dia 4 de fevereiro uma nova frente fria entrará no país, chegando à região Sudeste no dia 7. O Valor apurou, porém, que a previsão da ZCAS não aparece nos mapas meteorológicos que estão disponíveis para o público.

No primeiro dia da reunião, que termina hoje, o operador também apresentou explicações sobre o cenário meteorológico nas primeiras semanas do ano. Segundo o órgão, assim como em janeiro de 2014, houve a formação de uma massa de ar quente e alta pressão, que elevou a temperatura e impediu a ocorrência de chuvas significativas. De acordo com o ONS, no entanto, essa massa se dissipou no último dia 21.

A conclusão do operador no primeiro dia de reunião é que o quadro hidrológico previsto para fevereiro é melhor do que o constatado em janeiro, porém ele não representa a recuperação do sistema.

No encontro de ontem, coordenado pelo diretor de planejamento e programação da operação do ONS, Francisco Arteiro, não foram apresentadas previsões de expectativa de volume de chuvas para fevereiro e para o armazenamento dos reservatórios das Hidrelétricas. Esses números deverão ser apresentados hoje.