O sonho do Brasil de ter uma economia desenvolvida passa por uma indústria forte. O país, no entanto, está longe de contar com esse setor estratégico para um avanço mais robusto do Produto Interno Bruto (PIB). Desde o estouro da crise mundial, em 2008, em vez de crescer, a maior parte das fábricas está encolhendo. Os empregos desaparecem a uma velocidade impressionante, o que tem levado trabalhadores superqualificados a buscarem abrigo em postos de menor remuneração. O mais assustador é que, quando se olha para a frente, o horizonte se mantém nebuloso. Na melhor das hipóteses, a indústria registrará, em 2015, incremento de 1%, taxa insuficiente para recuperar a perda de 1,5% do ano passado. 

Será preciso muito mais do que pacotes com medidas requentadas para reverter seis anos seguidos de retração. Até agora, o que a presidente Dilma Rousseff ofereceu ao empresariado, para o segundo mandato, foram promessas vazias. Não se vê, no Palácio do Planalto, uma preocupação concreta que anime o espírito animal dos empreendedores para ampliar os negócios e tirar o país do atoleiro. A esperança está no fortalecimento da nova equipe econômica, mais favorável ao capital privado e sem preconceito com o lucro. Se pelo menos o grupo chefiado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, conseguir domar a inflação e fazer um ajuste fiscal consistente, parte da confiança tenderá a voltar. 

Entre os empresários, a cobrança é clara: que o país troque o modelo de crescimento baseado no consumo por uma máquina movida a investimentos. Não será, porém, uma transição tranquila. Para que uma empresa se sinta animada a investir é preciso ter a certeza de que, mais à frente, terá para quem vender a produção. Hoje, essa confiança não existe. As famílias estão superendividadas, a inflação alta corroeu parte da renda e o desemprego vai aumentar, ainda que em uma velocidade lenta. Nesse quadro, seria muito bem-vindo um governo amigável, com capacidade suficiente para desmontar as armadilhas que a presidente Dilma criou nos últimos quatro anos. 

Ajuda do dólar 

Enquanto os sinais do governo não vêm, as empresas se apegam a um câmbio mais realista, com o dólar mais próximo de R$ 3. "O efeito cambial, benéfico para a competitividade da indústria, já está sendo adotado involuntariamente. A tendência de valorização da moeda norte-americana é mundial", diz Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria. Apenas com a ajuda da divisa dos Estados Unidos, as vendas externas de bens de capital avançaram 13% em 2014. "É um alento, mas é muito pouco", ressalta, coberto de razão. 

O processo de recuperação da indústria será longo. Diante do estrago de uma política econômica voltada para o protecionismo e o estímulo artificial da demanda interna, as fábricas brasileiras terão de encarar o saldo negativo da combinação de baixa produtividade, concorrência internacional acirrada e desaquecimento da economia mundial. "A desindustrialização dos últimos anos está evidente, com a produção de vários segmentos ainda sem restaurar o nível pré-crise", observa Júlio Sérgio Gomes de Almeida, professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. 

A crise externa bateu diretamente no ramo manufatureiro e as medidas adotadas para reagir ao quadro adverso, como a desoneração da folha de pagamento, tornaram-se inócuas. Sem o canal exportador e com a queda na demanda doméstica, os estoques se elevam, com efeitos na produção e no quadro de pessoal. Mais de um quinto dos produtos nas prateleiras do país são importados. Desde 2012, o deficit da indústria na balança comercial passou a marca anual de US$ 100 bilhões, e segue piorando.

Outra comprovação dos erros acumulados está a situação do setor automotivo, cujas perdas nos mercados doméstico e internacional, refletidos em estoques elevados, contaminam o desempenho geral da indústria. O segmento foi o que mais recebeu ajuda do governo desde a crise de 2008, com desonerações do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), estímulo ao crédito para a compra de veículos e medidas protecionistas que são hoje alvo da maior reclamação contra o Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC). 

"Quando se protege um setor produtivo na ponta da cadeia de valor, surge logo pressão política para proteger os demais segmentos", anota Paulo Haddad, ex-ministro da Fazenda. Ele teme que a insistência na defesa isolada de ramos industriais consolide um "capitalismo de compadrio". 

Benesses 

A readequação da indústria nacional à realidade carece, então, da superação do dilema entre proteger ou integrar a atividade ao resto do mundo, com foco no mercado externo. Para Maurício Canêdo Pinheiro, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas (FGV), a política industrial do país não estimula a sua autossuficiência, pois ainda se vale de benesses do Estado. Ele e outros economistas defendem o caminho da abertura comercial, tirando gradualmente barreiras contra importados, para expor diferentes segmentos à competição. Esse parece, inclusive, ser o pensamento do novo ministro da Fazenda. Importar mais para exportar mais é um lema colocado na mesa desde o choque da abertura promovida no governo Fernando Collor. 
O esforço para reativar o investimento produtivo vai depender, por sua vez, de uma abertura do governo em relação ao lucro perseguido pela livre iniciativa em concessões de infraestrutura e em projetos de Parcerias Público Privadas, as PPP. "O desejo do governo de que o setor privado invista com retornos baixos, cobrando tarifas, as menores possíveis, é inviável. Modicidade tarifária e investimento em larga escala não combinam", comenta o consultor econômico Raul Velloso. 

Flávio Castelo Branco, gerente executivo de política econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), entende que, pelo menos por enquanto, a desvalorização do real é mesmo o maior alento para o setor. À medida que os estoques baixarem e as exportações reagirem, o otimismo terá de se agarrar aos primeiros frutos do ajuste fiscal. "Acreditamos num crescimento de 1% para o conjunto do setor em 2015. Vamos ter uma contribuição positiva do câmbio, que permitirá um superavit na balança comercial em 2015", sublinha. Robson Braga de Andrade, presidente da CNI, ressalta, contudo, que o dólar necessário para melhorar o humor dos executivos da indústria está acima de R$ 2,70. 

Encolhimento 

Economistas e líderes empresariais consideram a recuperação do peso da indústria na economia como fundamental para garantir um crescimento econômico sustentável e, sobretudo, a melhora contínua nos níveis e na qualidade geral do emprego e dos salários. O setor industrial respondia, nos anos 1990, por cerca de 20% do PIB. Hoje, não chega a 15%, voltando aos níveis dos anos 1950. "Com o fim do modelo centrado no consumo, a indústria passa a ter papel fundamental no processo de tirar a economia brasileira do buraco", salienta o economista Paulo Rabello de Castro, coordenador do Movimento Brasil Eficiente. 

Competitividade 

Enquanto a arrecadação em praças de pedágios e o registro, em determinado período, dos volumes de embalagens de papelão produzidos no país servem de termômetros para a atividade econômica brasileira, os artigos de plástico made in Brazil são considerados como um indicador da competitividade industrial. "A produção de transformados plásticos em 2014 recuou 2,7% na comparação com o ano anterior, uma das maiores quedas em 15 anos", lamenta José Ricardo Roriz Coelho, presidente da Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast).