Quase um mês após a morte de Alberto Nisman, um novo promotor assumiu a investigação do caso que apura suposta tentativa da presidente Cristina Kirchner de proteger terroristas iranianos.

Nesta sexta-feira (13), o promotor Gerardo Pollicita formalizou a acusação contra a presidente, o chanceler Héctor Timerman e aliados políticos no inquérito em que Nisman trabalhava.

O processo penal argentino é diferente do brasileiro. Nessa etapa, o promotor informa à Justiça que vê consistência nas acusações e se propõe a reunir provas. Os citados ainda não são réus. No Brasil, seria uma espécie de indiciamento.

Na prática, Pollicita prossegue o trabalho de Nisman. Na denúncia, de 68 páginas, ele relembra os principais pontos que ampararam a acusação do promotor morto e sugere novas investigações. O juiz Rafael Rafecas avaliará a denúncia.

A acusação foi apresentada às 12h. No início da manhã, o chefe de gabinete da Casa Rosada, Jorge Capitanich, acusou a Justiça de "golpismo" contra Cristina.

"É uma estratégia de golpismo judicial ativo. No mundo, a disputa é entre democracia e grupos obscuros vinculados a poderes econômicos. Obama enfrenta investida da direita republicana mais recalcitrante. No Brasil, Dilma Rousseff sofre ataques com pedidos de julgamento político", disse.

O secretário-geral da Presidência, Aníbal Fernández, falou em "manobra de desestabilização democrática". O governo tenta desqualificar a denúncia de Nisman, que acusou Cristina --que viajou ao sul do país-- e aliados de tentarem proteger iranianos acusados pelo atentado à entidade judaica Amia, em 1994, que deixou 85 mortos.

Em troca da "proteção", afirmou o promotor, a Argentina poderia exportar grãos e importar petróleo mais barato do Irã. Os combustíveis são o gasto mais relevante do país no exterior.

A rejeição formal do governo à denúncia foi apresentada pela Procuradoria do Tesouro, que enviou a defesa à Justiça. "Nenhuma atuação (...) do governo teve por objeto retirar as acusações dos cidadãos iranianos objetos de notificações vermelhas [capturas] da Interpol".

Pollicita também indiciou o ex-sindicalista Luis D'Elia, o deputado kirchnerista Andrés Larroque e Fernando Esteche, líder do grupo nacionalista Quebrancho, como supostos interlocutores informais dos iranianos.

Para o analista político Rosendo Fraga, o indiciamento traz a denúncia de volta ao centro das atenções.

"O efeito político é forte e, o mais importante, recoloca no centro do debate a denúncia de Nisman, que havia ficado em segundo plano desde a investigação sobre a sua morte", disse à Folha.

Nova perícia foi feita no apartamento de Nisman nesta sexta (13). Além da promotora Viviana Fein, participaram a ex-mulher do promotor, que virou parte interessada no processo, e a mãe de Nisman, a primeira a vê-lo morto.