O país está em meio à transição de um modelo de expansão econômica cujos resultados se esgotaram para outro ainda pouco claro, embora já iniciado com o ajuste absolutamente necessário das contas públicas.
Essa é a prioridade que se apresenta por agora, agravada pela teia de problemas acumulados no passado recente, cujas sequelas estão na raiz dos passivos que assombram o país, do risco de racionamento de água e energia ao escândalo que dilacera a Petrobras e a cadeia de petróleo, gás, bens de capital e construção pesada --áreas de ponta do dinamismo econômico e do investimento nos últimos anos.
Esse contexto é adverso à volta do crescimento no curto prazo, sem o qual todos os anseios serão muito mais difíceis. Uma reação positiva puxada pelas exportações seria extremamente salutar nesse quadro, mas aqui também os obstáculos não são desprezíveis.
Para uma das dez maiores economias do mundo, nossa expressão exportadora é pífia, pouco superior a 10% do PIB, ou 1,3% das exportações globais. Quanto aos produtos industriais, o naco do Brasil no total das exportações mundiais é irrisório: mero 0,7%, o que confere à indústria brasileira a 31ª colocação nesse ranking.
Ainda assim, a exportação é nossa melhor vantagem para evitar que o mergulho da atividade econômica seja intenso, complicando adiante a retomada do crescimento, apesar de tais vantagens não serem tão óbvias.
A depreciação cambial (42% em dois anos) não está tendo o efeito energético sobre as exportações como no passado, refletindo, no país, uma densa estrutura de custos de produção, além da falta de maior conexão com as cadeias produtivas globais, e, no exterior, o baixo dinamismo do comércio mundial e do mercado de commodities.
Tais questões são fatos, mas também é verdadeiro que aqui estão todas as grandes corporações do mundo --98% dos 500 maiores grupos dos Estados Unidos, todos os gigantes empresariais da Alemanha, do Japão, da Coreia do Sul, da França, da Suécia, da Inglaterra da Suíça, e os da China estão a caminho.
São corporações que compõem a lista dos cem maiores exportadores globais, mas não devido às suas operações no Brasil, em que se destacam pelas vendas no mercado doméstico, não nas exportações. Mais estranho é que esses grupos estão aqui não como simples escritórios de representação, mas como fabricantes de bens de última geração tecnológica, com nenhuma ou mínima defasagem em relação ao que há lá fora --de smartphones a carros, de roupas a TVs. Diferente é o preço, muito maior no país.
A presença dessas empresas em território brasileiro é uma vantagem pouco usada e até desperdiçada, pois foram induzidas a se especializar no mercado doméstico, graças a medidas de incentivo, subsídios e proteção. A receita de exportação de manufaturados fica, assim, aquém do que poderia potencialmente ser, desequilibrando a balança de nossas contas externas.
Tais evidências sugerem o que deve ser feito para, em paralelo ao programa de ajuste fiscal, relançar as bases do crescimento, tendo a exportação como um dos esteios, e a qualificação do investimento industrial, como preliminar para pôr a economia brasileira no centro mais dinâmico da geração de renda no mundo. Segundo dados da OCDE, as corporações globais têm influência sobre 80% das exportações de bens e serviços no mundo. No Brasil, as empresas com participação estrangeira fazem 60% das exportações e poderiam ir muito além se induzidas apropriadamente.
E por que o Brasil é relevante para suas operações, mas não para o comércio mundial, como suas instalações em outros países? Penso que a razão de fundo está na falta de uma política de comércio exterior consistente. Ela deveria ser alicerçada em uma maior aproximação dos grandes centros comerciais do mundo via acordos bilaterais com os EUA, a Europa e outros países.
Em simultâneo, deveriam ser resolvidos os problemas provocados pelos impostos cumulativos e pelas más condições da infraestrutura. Não é uma agenda trivial. Mas o mais difícil, que é atrair tais empresas, está feito. Se esse desafio já foi superado, a solução depende da clarividência de nossas ações. Hoje, nitidamente, deixamos sobre a mesa algumas dezenas de bilhões de dólares de exportações.
PEDRO LUIZ PASSOS, 63, empresário, é presidente do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial) e conselheiro da Natura. Escreve às sextas, a cada 14 dias, nesta coluna.