Um dos maiores equívocos do nosso tempo é a ideia de que existe uma escolha entre o desenvolvimento econômico e a proteção da natureza. A narrativa usada por políticos de todo o mundo diz que as metas ambientais devem ser reduzidas para promover mais crescimento.

No entanto, a realidade em que vivemos é um pouco diferente. Cem por cento da atividade econômica é dependente dos serviços e benefícios oferecidos pela natureza.

Embora muitos economistas sofram do tipo de ilusão que torna perfeitamente racional para eles aceitarem liquidar os sistemas naturais na busca de "crescimento", estudos realizados por diferentes especialistas revelam o enorme valor econômico que é perdido quando as decisões e políticas voltadas para a promoção de atividades econômicas degradam os serviços gerados pela natureza.

Seguimos degradando a natureza; serão nossos filhos e netos que irão pagar por esse saque negligente

Por exemplo, à medida que lutamos para reduzir as emissões de combustíveis fósseis, um estudo estima que o valor dos serviços de captura de carbono, que pode ser obtido com a redução pela metade da taxa de desmatamento em 2030, é de cerca de US$ 3,7 trilhões. A vida silvestre nas mesmas florestas tem um enorme valor também - cerca de 50% dos US$ 640 bilhões do mercado farmacêutico americano se baseia na diversidade genética das espécies selvagens, muitas das quais foram encontradas em florestas. E não é só a diversidade genética dos animais selvagens que traz benefícios econômicos.

Entre outras coisas, a vida silvestre também ajuda a controlar pragas e doenças. O custo de perder os abutres da Índia foi estimado em US$ 34 bilhões, em grande parte por causa dos custos de saúde pública associados à sua morte, incluindo o aumento de infecções da raiva. O valor de controle de pragas anual previsto por aves insetívoras em uma plantação de café foi estimado em US$ 310 por hectare, enquanto o valor anual por hectare adicionado por aves que fazem controle de pragas em florestas produtoras de madeira foi estimado em US$ 1.500. Grandes lagartas predadoras em um pomar holandês melhoraram a colheita da maçã em 50%.

Os serviços prestados pelos animais, como as abelhas, que fazem o trabalho de polinização, sustentando o equivalente a US$ 1 trilhão de vendas agrícolas foi avaliado em US$ 190 bilhões por ano.

Os ecossistemas marinhos também estão gerando enormes benefícios econômicos. O valor do PIB proveniente dos estoques de peixes marinhos e as indústrias associadas a eles é de cerca de US$ 274 bilhões por ano - e isso pode valer mais US$ 50 bilhões se os estoques de peixes forem geridos de forma mais inteligente. Mas mesmo estes grandes números tornam-se pequenos quando se considera o valor mais amplo dos sistemas marinhos e costeiros na proteção do litoral de tempestades, na absorção do dióxido de carbono da atmosfera e no reabastecimento de seus níveis de oxigênio. O valor destes e de outros serviços baseados nos oceanos foi estimado em cerca de US$ 21 trilhões por ano.

Considerando países individualmente, os serviços provenientes do ambiente marinho podem sustentar uma proporção considerável do seu PIB. Um estudo, do World Resources Institute e do WWF, descobriu que pelo menos um quarto do PIB de Belize é dependente dos recifes de corais e mangues costeiros.

Ruy Baron/Valor
A degradação da natureza custa à economia mundial, segundo estudo realizado pela Trucost, cerca de US$ 6,6 trilhões por ano (11% do PIB mundial) e de acordo com as tendências atuais podem chegar a US$ 28 trilhões em 2050. Em contraste, estudo de um grupo de líderes conservacionistas sugere que para atingir as metas globais que evitariam uma extinção em massa de espécies custaria cerca de US$ 76 bilhões por ano - ou 0,12% do PIB mundial anual.

Enquanto estamos acostumados a ouvir que a natureza é um obstáculo ao desenvolvimento e um freio no crescimento, a situação é exatamente oposta. Cuidar da natureza é uma condição imprescindível para o desenvolvimento econômico sustentável. Algumas empresas líderes (como Unilever e Nestlé)já perceberam isso, e, como resultado, estão mudando suas estratégias. Alguns países também, incluindo a Guiana e a Costa Rica, tem entendido que seus sistemas naturais são a base da sua riqueza e estão agindo para protegê-los. Portanto, preservar a natureza não se trata apenas de proteger o meio ambiente, trata-se também da própria manutenção da economia.

Quanto mais continuarmos a ignorar os papéis desempenhados pelos sistemas naturais e a construir nossos castelos econômicos sobre fundações de areia, maiores serão os custos que vão ser deixados para as gerações futuras. Embora possamos desfrutar de algum conforto agora, enquanto degradamos e saqueamos a natureza, serão nossos filhos e netos que irão pagar por esse saque negligente dos serviços que mantêm as condições essenciais para o desenvolvimento.

Esta é uma questão econômica real e é cada vez mais urgente, como um esquema de pirâmide de escala planetária que reúne cada vez mais momentum e assalta o capital natural. Enfrentar o desafio de alinhar as demandas humanas com o que a natureza pode fornecer indefinidamente requer uma grande injeção de vontade política. O fato de que isso simplesmente não ocorre nos dias de hoje é demonstrado na forma como os governos mobilizaram rapidamente os pacotes de estímulo no valor de mais de US$ 3 trilhões em resposta à recente crise financeira e econômica, mas dedica apenas um minúsculo (e decrescente) esforço para a proteção de ativos da natureza.

Os economistas e planejadores econômicos se habituaram a ver a natureza como fornecedora de recursos e local de despejo de resíduos. Chegamos a um ponto agora, no entanto, em que temos de perceber que a natureza é também um fornecedor de serviços, uma inspiração para modelos e projetos, e nosso maior aliado para garantir as necessidades humanas indefinidamente no futuro; e essa conclusão não se baseia apenas na ciência ecológica, mas também em um enorme conjunto de evidências econômicas.

Tony Juniper é consultor independente e docente do Business and Sustainability Programme da Universidade de Cambridge