A forte criação de empregos e o tombo dos preços da gasolina deverão dar mais fôlego ao consumo nos EUA nos próximos meses, levando a economia a crescer mais de 3% neste ano. Em janeiro, os salários parecem ter começado a aumentar a um ritmo mais expressivo, uma confirmação do bom momento do mercado de trabalho. Na direção contrária, o fortalecimento do dólar encarece exportações e barateia importações, fazendo o setor externo tirar parte do dinamismo da atividade econômica. Mas esse impacto negativo deve ser modesto, porque as vendas externas são pequenas em relação ao tamanho da economia americana. O economista-chefe para os EUA da Capital Economics, Paul Ashworth, revisou a estimativa de crescimento americano em 2015 de 3% para 3,3%, devido à forte queda dos preços do petróleo e à redução dos custos de empréstimos e financiamentos, num cenário marcado pelo declínio dos juros de longo prazo. Em 2014, o Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA cresceu 2,4%. "Numa economia relativamente fechada como os EUA, o estímulo ao poder de compra das famílias e o crescimento real do consumo devem facilmente prevalecer ante o efeito negativo do dólar mais forte sobre os exportadores", resume a consultoria. As exportações equivalem a 12 % do PIB americano, enquanto o consumo responde por cerca de 70%. Como os EUA importam mais petróleo do que exportam, os preços mais baixos do petróleo devem ser bastante positivos para a economia, avalia Ashworth. Famílias e empresas não ligadas ao setor petrolífero terão mais dinheiro para gastar em outros bens e serviços, graças à redução das despesas com combustíveis. O consumo já mostrou um bom desempenho na segunda metade de 2014, crescendo a uma taxa anualizada de 3,2% no terceiro trimestre e de 4,3% no quarto. Para o primeiro trimestre deste ano, a Capital projeta um avanço de 4,1%. Nas últimas semanas, porém, surgiram alguns indicadores menos positivos. Depois de atingir em janeiro o nível mais alto desde 2004, a confiança do consumidor recuou em fevereiro, segundo o índice da Universidade de Michigan. O resultado das vendas no varejo, por sua vez, decepcionou nos últimos dois meses. Em janeiro, houve uma queda de 0,8% em relação ao mês anterior. Analistas como Ashworth, porém, não veem esses números com preocupação. Para ele, a retração no varejo tende a ser apenas uma correção da alta acima da tendência ocorrida em outubro e novembro. No caso do indicador da Universidade de Michigan, a queda de fevereiro ocorreu após seis meses de alta, e ele continua num nível elevado. Com isso, Ashworth aposta que os americanos vão passar a gastar mais nos próximos meses, dada a combinação de forte criação de empregos, aumento um pouco mais rápido dos salários, confiança do consumidor elevada e preços baixos da gasolina. O recente desempenho do mercado de trabalho é a principal confirmação da força da economia americana. Vários indicadores mostraram uma melhora significativa, como diz o economista Jesse Hurwitz, do Barclays. Na média de novembro, dezembro e janeiro, a criação de empregos ficou em 336 mil por mês, ou seja, mais de 1 milhão em três meses, o melhor resultado desde o fim de 1997, ressalta o banco. O relatório de janeiro foi especialmente positivo. Com exceção da faixa de 20 a 24 anos, em todas as outras aumentou a taxa de participação, ou seja, a fatia da população em idade para trabalhar que busca emprego ou está empregada. É um bom sinal, depois de um longo período em que muitos americanos ficaram fora do mercado de trabalho. Uma das notícias mais importantes foi o crescimento mais rápido dos salários. Em janeiro, o rendimento médio por hora subiu 0,5% em relação a dezembro, fazendo a expansão em 12 meses se acelerar de 1,9% para 2,2%. Ainda não é um ritmo muito forte, mas é uma evidência de que o aquecimento do mercado de trabalho começou a chegar aos salários. O crescimento mais forte dos EUA, bem acima do registrado na zona do euro ou no Japão, tem contribuído para a valorização do dólar. O movimento é reforçado pela expectativa de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) aumentará os juros nos próximos meses, enquanto que o Banco Central Europeu (BCE) e o Banco do Japão adotam políticas monetárias ultra-expansionistas. O câmbio mais valorizado derruba ainda mais a inflação, já em baixa por causa da queda dos combustíveis, mas prejudica especialmente as empresas exportadoras. O dólar forte dificulta a vida dessas empresas, que já têm de lidar com a fraca demanda global, especialmente da zona do euro, e a desaceleração da China. Ashworth observa, no entanto, que a valorização da moeda americana ainda é relativamente modesta se comparada ao que ocorreu no começo dos anos 1980 e no fim dos anos 1990. E, como as exportações são apenas 12% do PIB, o impacto de uma apreciação moderada do dólar não deve fazer grandes estragos na economia, afirma ele. Outro vento contrário virá do impacto do petróleo barato sobre os setores ligados à exploração do produto. Neste ano, haverá uma forte queda no investimento do setor de petróleo de xisto, por exemplo. A produção industrial de janeiro aumentou apenas 0,2%, um número afetado negativamente pelo recuo de 1% do setor de mineração. O efeito sobre a economia inteira, porém, deverá ser limitado. Se a indústria extrativa mineral investir 50% a menos em estruturas neste ano, os gastos encolherão em US$ 75 bilhões, ou 0,4% do PIB, estima a Capital. Não é algo preocupante. Além disso, o investimento em outros setores da economia têm perspectivas bastante positivas, caso do residencial. A Capital, por exemplo, estima um crescimento de 5,7% neste ano, bastante acima do 1,6% do ano passado. Ao reduzir os custos de empréstimos, os níveis baixos dos juros de longo prazo ajudam o setor, que também se beneficia da maior confiança do consumidor e da força do mercado de trabalho. Nesse cenário, muitos analistas se sentem confortáveis para prever um crescimento superior a 3% neste ano. O Fundo Monetário Internacional (FMI), por exemplo, estima uma expansão de 3,6%.