A percepção do mercado em relação ao setor de incorporação piorou desde que o ano começou, em função dos ajustes anunciados pelo governo federal, da perspectiva de aumento do desemprego, do custo de financiamento imobiliário mais elevado e da queda da confiança do consumidor. O agravamento do cenário se soma aos estoques elevados de imóveis e à velocidade de comercialização já reduzida.

De 2007 a 2011, o setor imobiliário teve forte expansão, devido a fatores como crescimento do nível de emprego e da renda, cenário distinto do atual. "Com o aumento do desemprego e a piora da confiança do consumidor, os ativos que mais sofrem são os de valor agregado elevado e comprados com financiamento, como imóveis e carros", afirma um analista, que pediu seu nome não ser citado.

Em janeiro, o Índice de Confiança do Consumidor (ICC) caiu para 89,8, nível mais baixo desde o início da série, em 2005.

 

 

O mercado espera que este seja mais um ano de retração de lançamentos e vendas das incorporadoras de capital aberto. Em 2014, o setor reduziu lançamentos pelo terceiro ano consecutivo. As prévias operacionais divulgadas por Cyrela, Direcional, Even, EZTec, Gafisa, Helbor, MRV, PDG e Rodobens Negócios Imobiliários apontam que, em conjunto, as incorporadoras lançaram R$ 18,53 bilhões no ano passado, 8% abaixo do Valor Geral de Vendas (VGV) de 2013. As vendas contratadas tiveram queda de 12%, para R$ 19,36 milhões.

"É preciso haver um corte grande nos lançamentos de 2015 se o setor quiser ajustar a relação entre estoques e vendas", afirma outro analista setorial.

Segundo o JP Morgan, o estoque de Cyrela, Direcional, Even, EZTec, Gafisa, MRV, PDG e Rodobens somava R$ 22,663 bilhões no quarto trimestre de 2014, recorde desde o início da série histórica do levantamento, no primeiro trimestre de 2008. "Os estoques vão gerar outras promoções. Isso diminui a velocidade de vendas mais ainda, pois o consumidor fica esperando nova queda de preços", diz o analista de mercado imobiliário do JP Morgan, Marcelo Motta.

A expectativa de Motta é que haja queda real de preços, de imóveis, ou seja, altas abaixo da inflação. Outra avaliação, no mercado, é que os preços pedidos podem não cair, mas haver redução nominal nos fechados.

Incorporadoras têm lançado mão de descontos para comercializar, principalmente, estoques prontos, na busca de geração de caixa e de reduzir despesas de manutenção de imóveis, num ambiente de tomada de decisão de compra mais lenta por parte de potenciais clientes.

Nova rodada de descontos é esperada para a partir desta semana até meados de março. "As campanhas de descontos tendem a trazer mais liquidez para as vendas", afirma o diretor da imobiliária focada na venda de imóveis novos com descontos Realton, Rogerio Santos. A Lopes, maior rede de imobiliárias do país, por exemplo, fará a campanha Preços que Deixaram Saudades, no dia 7 de março, em parceria com incorporadoras. Serão incluídas 60 unidades da Região Metropolitana de São Paulo.

No mercado, há quem diga, porém, que as incorporadoras tendem a preferir abatimentos caso a caso, para evitar a banalização das vendas e a perspectiva de novas quedas de preços. A agressividade dos descontos dependerá do quanto cada incorporadora precisa gerar de caixa.

Em relação aos imóveis usados, a percepção do mercado é que o volume de negócios diminuiu. Na ponta compradora, se espera que os preços sejam reajustados para baixo, acompanhando os descontos dos novos, mas vendedores, acostumados às altas dos últimos anos, relutam em reduzir valores.

Na busca de recursos para gerar caixa e reduzir o endividamento, algumas incorporadoras apostam também na venda de parcelas relevantes de empreendimentos para investidores institucionais com descontos expressivos. É o caso da PDG, que comercializou, de acordo com fontes, participação indireta em projetos a fundos geridos pela Hemisfério Sul Investimentos (HSI). A HSI não comenta operações com empresas de capital aberto. PDG também não comentou.

A Tecnisa negocia a venda de parte de seu estoque para um fundo, segundo fontes. Procurada pelo Valor, a empresa informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que "avalia constantemente propostas de negócios e não comenta rumores de mercado".

Em janeiro, a Tecnisa divulgou que avalia a admissão de novo sócio no Jardim das Perdizes. O projeto, desenvolvido na zona Oeste da cidade de São Paulo, pertence à Windsor Investimentos Imobiliários, da qual a Tecnisa tem 68,9%, a PDG, 25%, e a BV Empreendimentos e Participações (BVEP), 61%. A PDG também não descarta a venda de participação no projeto.

Para analistas, não há razões para melhora do desempenho das ações das incorporadoras no curto prazo, e a volatilidade tende a continuar elevada. "Investidores sentem que ainda haverá queda de lançamentos e vendas. Os papéis podem sofrer no curto prazo", diz Motta, do JP, acrescentando que o primeiro trimestre é, sazonalmente, mais fraco para o setor.

A PDG é a incorporadora cujos papéis acumulam a maior queda neste ano, de 43,02%. No fim de janeiro, ao ser questionado sobre as fortes quedas de preços das ações da PDG, o presidente da empresa, Carlos Piani, disse aoValor que "a reação do mercado é exagerada em alguns momentos". A PDG está focada na entrega de empreendimentos, geração de caixa e desalavancagem.

"A PDG só tem conseguido equacionar suas dívidas muito em cima do prazo", avalia um analista setorial. Por meio de sua assessoria de imprensa, a PDG informou que "está em estágio avançado de negociação" em relação às dívidas que vencem neste trimestre. O próximo vencimento está previsto para março.

 

 

Brasil Brokers admite que vendas de imóveis podem cair neste ano

 

As vendas de imóveis pela Brasil Brokers podem ter "pequena queda" neste ano, mas as margens da companhia serão melhores, de acordo com o presidente Plínio Serpa Pinto. Nos dois primeiros meses de 2015, as vendas da segunda maior empresa de corretagem imobiliária do país acumulam retração em relação ao mesmo período do ano passado. "A apreensão dos compradores em relação à possibilidade de desemprego influi negativamente nas vendas", afirma Pinto.

Na avaliação do presidente da Brasil Brokers, o foco na comercialização de imóveis remanescentes passou a ser uma obsessão, diante da necessidade de caixa das incorporadoras listadas na BM&FBovespa. As campanhas de descontos de preços de imóveis vão ganhar força a partir do começo de março, de acordo com o executivo. "O primeiro semestre será composto por quatro meses de aumento de vendas contra dois de queda", diz Pinto.

A Brasil Brokers será uma das imobiliárias que irá intermediar campanha de liquidação de imóveis remanescentes da PDG Realty no Rio de Janeiro, a partir do início de março, segundo Pinto. Em São Paulo, a Abyara Brokers, empresa do grupo Brasil Brokers, vai vender os estoques dessa nova rodada da campanha Na Ponta do Lápis PDG. Já a Rossi Residencial terá parte da loja da Brasil Brokers em Porto Alegre por seis meses, a partir de março.

Em 2014, a Brasil Brokers deu início ao processo de corte de custos - a maior parte já realizado. A redução anualizada de cortes supera R$ 30 milhões. A perspectiva de melhora das margens resulta também de os incorporadores terem passado a pagar comissões melhores, de acordo com Pinto.

A companhia tem conversas com sócios fundadores de algumas das operações adquiridas sobre a possibilidade de recompra de sua participação por eles.

Para se dedicar melhor às especificidades de cada mercado em que atua e aumentar a eficiência das vendas, a Brasil Brokers criou, recentemente, três vice-presidências operacionais - uma que abrange o Estado do Rio de Janeiro, outra que inclui São Paulo e os estados da região Sul, e a terceira, com Minas Gerais, Bahia, Goiânia, Pará e Rio Grande do Norte.

Bruno Serpa Pinto, sobrinho do presidente da Brasil Brokers, assumiu a vice-presidência fluminense. Júlio Piña, vice-presidente operacional ficará em uma das duas vice-presidências regionais. O nome do outro vice-presidente será definido até 3 de março. A Abyara Brokers será submetida, diretamente, ao presidente da Brasil Brokers.

Segundo fonte do mercado, a Lopes, maior rede imobiliária do Brasil, também teve redução de vendas neste início de ano. Conforme a fonte, as vendas da Lopes caíram 30% em janeiro, mas a imobiliária não informa como está seu desempenho. "Esperamos que 2015 seja um ano melhor para a Lopes", diz o diretor financeiro e de relações com investidores, Marcello Leone, ressaltando que a base de custos da companhia foi reduzida.

Em outubro do ano passado, a Lopes informou ao mercado que reduziria o orçamento de custos de 2015 para R$ 220 milhões, ante R$ 280 milhões em 2013 e R$ 276 milhões em 2014. De acordo com Leone, houve redução de pessoal e do número de lojas, mas os principais cortes ocorreram em despesas de telefonia, marketing e internet.

O executivo da Lopes diz não saber se haverá nova retração do mercado imobiliário neste ano. Dados da área de inteligência de mercado da imobiliária apontam que o total de lançamentos de residenciais verticais, conjuntos comerciais e hotéis, no país, somou 175 mil unidades em 2014, abaixo das 196 mil unidades de 2013. "Houve contração do mercado", afirma Leone.