Título: Espera interminável em Ceilândia
Autor: Maia, Flávia
Fonte: Correio Braziliense, 08/07/2011, Cidades, p. 19

As primeiras turmas estão perto de se formar sem o novo câmpus. Atualmente, os universitários dividem espaço com estudantes de ensino médio em uma escola pública

A data de entrega do novo câmpus de Ceilândia mudou tantas vezes que nenhum aluno, diretor ou professor ousa apostar quando será o primeiro dia de aula no novo prédio. As turmas iniciais entraram em agosto de 2008 e foram estudar no Centro de Ensino Médio nº4 (CEM 4) de Ceilândia ¿ próximo ao Estádio Abadião ¿ com a promessa de que, em 300 dias, assistiriam a aulas na unidade própria. Desde então, se passaram mais de 900 dias. A primeira turma se aproxima do 7º semestre e pode ser que se forme sem usufruir toda a infraestrutra fornecida pela universidade.

Um novo curso, de fonoaudiologia, está aprovado e sem previsão de processo seletivo por falta de espaço. Para abrigar os estudantes da UnB, o CEM 4 foi dividido ao meio entre os universitários e os secundaristas. Só em equipamentos, a Faculdade de Ceilândia (FCE) gastou R$ 19 milhões. Dos aparelhos adquiridos para os laboratórios, muitos estão embalados, como o conjunto de câmeras fotográficas e o biodex, que avalia a força do paciente, ambos usados no curso de fisioterapia.

Universitários disputam cadeiras no Centro de Ensino Médio 4

O boneco simulador de parada cardíaca e outras complicações custa de R$ 250 mil a 300 mil e está subutilizado pelos alunos. Para ter acesso a ele, eles precisam se espremer entre as caixas e os equipamentos lacrados. "Dá dó ver tudo isso parado. Na faculdade, eu só via esses aparelhos por slide", conta a responsável pelos laboratórios de Ceilândia, Sabrina Faria, 32 anos, que fez o curso de fisioterapia em uma instituição particular porque não tinha o curso em nenhuma universidade pública do DF. A preocupação da direção da FCE é a de que os instrumentos estraguem pela falta de uso. "Isso seria terrível, o que temos aqui é o que há de mais moderno", alerta a diretora, Diana Pinho.

Diferentemente dos outros câmpus da UnB, o de Ceilândia é o único em que o GDF foi além da cessão de terrenos e prometeu a construção de dois prédios. Dos três, somente ele não foi inaugurado. "Nenhuma turma vai se formar aqui (no CEM 4), não", promete a diretora Diana Pinho. "No próximo semestre, pelo menos os laboratórios já serão lá (nas novas instalações)", completa. A obra custou R$ 19,4 milhões aos cofres do GDF. De acordo com a assessoria da Secretaria de Obras do DF, o atraso de três anos se deu por causa das mudanças de governo e as constantes revisões dos contratos. Os assessores informaram também que um dos dois prédios está pronto.

Enquanto a cerimônia de inauguração não ocorre, os estudantes de Ceilândia estão sem matérias opcionais e de módulo livre. Como faltam salas de aula, a direção resolveu manter na grade apenas as disciplinas obrigatórias. "Em outros semestres, oferecemos aulas no sábado e curso de verão para suprir as carências dessas matérias", explica a diretora Diana Pinho. O câmpus improvisado também impede a formação de turmas noturnas, que é um pedido da comunidade local. "Muita gente trabalha e quer estudar à noite, mas, por enquanto, não dá", afirma ela.

Indignação O aprendizado no improviso é a marca do câmpus de Ceilândia. Os cartazes espalhados na escola com dizeres "UnB Ceilândia: falta tudo, menos descaso" mostram a indignação dos estudantes. Eles chegaram a ocupar a Reitoria do câmpus Darcy Ribeiro, no Plano Piloto, para apressar a mudança (veja Memória). Para se ter ideia do desconforto enfrentado por esses alunos no CEM 4, o centro de convivência é na brita onde os professores deixavam os carros. As salas de estudo ficam nos corredores ao ar livre e faltam cadeiras para todos.

Sem restaurante universitário, os estudantes trazem marmita de casa. Por não ter como esquentar a comida, a direção dos centros acadêmicos comprou um micro-ondas. Mas a demanda estava tão grande que uma "vaquinha" foi feita entre os alunos para a compra do segundo eletrodoméstico. "A gente faz manifestação e nada muda. Os laboratórios serão bem completos, mais ainda estão lacrados, isso prejudica a formação", desabafa a estudante Nathália Pereira, 21 anos, estudante do 3º semestre de gestão e saúde.

A preocupação da diretora, Diana Pinho, é que as instalações precárias desanimem não só os alunos como também os professores. "Todo o nosso corpo docente tem mestrado e doutorado, eles querem fazer pesquisa e dar a melhor aula possível, mas sem laboratórios e espaço não dá", diz. O câmpus Ceilândia tem 1.300 alunos, 30% deles de Ceilândia e 40% de Taguatinga.

Parceria A expansão da Universidade de Brasília começou antes do Programa de Reestruturação Universitária (Reuni) lançado pelo governo federal em 2008. Nesse projeto, já existia a hipótese de construção de três câmpus, em Planaltina, no Gama e em Ceilândia. Em 2006, a UnB inaugurava o de Planaltina. Quando o programa nacional foi lançado, a instituição incorporou o novo câmpus ao Reuni e, em parceria com o GDF, colocou em prática o que estava no documento inicial: levar ensino superior público a mais duas cidades do DF ¿ Gama e Ceilândia. O governo local entraria com os terrenos das três unidades e, em Ceilândia, construiria dois prédios. Nos outros câmpus, a UnB ficaria responsável pelas edificações.