Petrobras fica sem 'troco' de US$ 9 bilhões

Valor Econômico - 15/01/2015

Cláudia Schüffner e Fernando Torres

 

A queda vertiginosa dos preços do petróleo poderia ajudar a Petrobras na renegociação dos valores pagos pelos 5 bilhões de barris adquiridos pelo regime de cessão onerosa no processo de capitalização, em 2010. Na ocasião a estatal pagou uma média de US$ 8,51 por barril de petróleo. Os 5 bilhões de barris tiveram seu preço calculado em US$ 42,53 bilhões, com renegociação marcada para começar agora, já que era preciso confirmar os volumes, os custos de produção e considerar preços do petróleo antes do início da produção efetiva.

Se o cenário atual de preço de petróleo fosse usado como base para a revisão do contrato, a Petrobras teria pouco menos de US$ 9 bilhões para receber de "troco" do governo neste ano ou no próximo, quando o processo for concluído. Seria um grande alívio para o caixa da companhia, já que ela não vai acessar o mercado de capitais este ano devido às repercussões da Operação Lava-Jato nas demonstrações financeiras (inclusive para a não divulgação delas). Contudo, a estatal não terá direito a receber esse ajuste.

O contrato firmado entre a Petrobras e a Agência Nacional de Petróleo (ANP) em 2010 não é claro sobre qual o preço de petróleo que deve ser usado na renegociação das condições, que será concluída agora, após a declaração de comercialidade, no fim de dezembro, do sexto e último bloco que fazia parte do pacote da cessão onerosa, o Entorno de Iara. Na época, as certificadoras contratadas pelas duas partes usaram como referência um preço de venda do barril a US$ 80 ou acima disso, a depender do cenário simulado. Os preços da commodity, no entanto, começaram a cair de forma acentuada no quarto trimestre do ano passado e ontem o barril - tanto WTI como Brent - estava próximo de US$ 48.

Quando trata das condições econômicas a serem usadas na revisão contratual, o documento diz que "o preço de referência será igual à média das cotações de fechamento no mês anterior à data de referência para a revisão do petróleo Crude Light West Texas Intermediate - WTI, em US$/barril, divulgadas pela bolsa de valores NYMEX, para o contrato futuro de décimo oitavo vencimento, menos o diferencial em relação ao petróleo Brent".

Não fica claro, contudo, qual é essa "data de referência". Se fosse hoje, valeria uma cotação próxima de US$ 63 por barril, no contrato de agosto de 2016, o que gera a diferença de US$ 9 bilhões mencionada acima, mantido tudo mais constante.

Procurada para esclarecer o assunto, a Petrobras informou que o contrato "não determina de forma expressa qual será o marco temporal para fixar o valor a ser utilizado pelos certificadores no fluxo de caixa". Mas afirma que o "governo e a Petrobras, interpretando sistematicamente o contrato de cessão onerosa, entenderam que a data a ser utilizada como referência é a data de declaração de comercialidade de cada bloco, uma vez que esta data é definida pela cláusula 8.2 como marco temporal que dá início ao processo de revisão".

Como a declaração de comercialidade dos cinco primeiros blocos ocorreu antes da queda recente do petróleo, entre dezembro de 2013 e setembro de 2014, a estatal, se continuar com esse entendimento, não se beneficiará da queda do óleo.

As negociações com a ANP já começaram e a agência contratou novamente a certificadora Gaffney, Cline & Associates para refazer as estimativas de reservas. A certificadora da Petrobras continua sendo a DeGolyer & MacNaughton (D&M).

O preço do petróleo não será a única variável que terá que ser considerada nessa revisão. Condições de produção, preço dos equipamentos, rapidez da exploração da área, qualidade do petróleo e a produtividade dos campos - que até agora se mostrou altíssima - terão que ser consideradas.

Sobre o atual estágio das negociações, a Petrobras informou ao Valor que "não pretende comentar antecipadamente a perspectiva de resultado do processo de negociação com o governo federal". Mas deixou claro que "o cenário de preços corrente não é relevante para esse processo".