Se o envelhecimento da população preocupa o governo, diante do inevitável aumento dos gastos com benefícios sociais, para o setor privado, a situação demográfica do país tornou-se uma inestimável fonte de lucro. Empresas que oferecem produtos e serviços para pessoas com mais de 50 anos têm passado à margem da estagnação econômica vivida pelo Brasil. Fabricantes de medicamentos, de produtos de beleza, de higiene pessoal, de telefonia e de tudo o que se relacione à saúde e ao bem-estar têm registrado expansão média entre 10% e 15% ao ano, ritmo que deve ser mantido nas próximas décadas, acompanhando a mudança etária dos brasileiros.
Não por acaso, as empresas estão inovando e oferecendo produtos cada vez mais voltados a esse público. "É ganho certo", enfatiza a diretora de Marketing da Mary Kay, Shana Peixoto. Dados da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec) mostram que, entre 2010 e 2015, o faturamento do setor quase dobrará: de R$ 27,3 bilhões para R$ 50 bilhões. Por conta disso, os investimentos no aumento da oferta de mercadorias também saltarão, de R$ 9,3 bilhões para R$ 20 bilhões ao ano. O Brasil já é o segundo mercado para produtos de beleza do mundo. Perde apenas para os Estados Unidos.

Inflação

Levantamento do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) indica que 92% das mulheres da terceira idade consomem cosméticos e 57% compram produtos de maquiagem. A pedagoga aposentada Yara de Paula Menezes Pereira, 79 anos, não faz por menos. Vaidosa assumida, gasta R$ 300 em cremes a cada três meses para manter a pele saudável. Outros R$ 90 são desembolsados todos os meses para retocar as unhas. A conta da beleza e da saúde inclui ainda R$ 145 com a mensalidade da academia de ginástica e R$ 400 em remédios e produtos de higiene pessoal. "Mamãe sempre dizia: quem não se enfeita, por si se enjeita. Primeiro, a gente tem que gostar da gente", afirma.

Yara tem cinco filhos, oito netos e quatro bisnetos. Diz que todos os cuidados são essenciais para manter a saúde, paparicar a família e viajar pelo mundo. Quando está distante, ela usa os aplicativos do celular para trocar mensagens com os parentes. "Sou uma pessoa ativa. Faço hidroginástica, danço, além de consultar médicos regularmente. Vou ao cardiologista a cada dois meses", conta, orgulhosa. Para o plano de saúde, são R$ 275 por mês.

O Brasil mais velho é real e pulsante. A expectativa média de vida ao nascer está em 74,9 anos para homens e mulheres, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entre 2015 e 2030, a participação dos brasileiros com 65 anos ou mais na população saltará de 7,9% para 13,4%. Beneficiadas pelo processo de ascensão social, as pessoas com mais de 50 anos gastam, por ano, R$ 1,1 trilhão, 34% do consumo total da população, conforme estimativas de mercado. Há 10 anos, esse público respondia por 19% do total injetado na economia.

A boa notícia para o consumo dos mais velhos: a inflação entre eles tem subido menos do que a média geral, o que impulsiona o poder de compra. Pelas contas da Fundação Getulio Vargas (FGV), o Índice de Preços ao Consumidor da 3ª idade (IPC-3i) cravou 6,70% nos últimos 12 meses. Já o Índice de Preços ao Consumidor Brasil (IPC-BR) chegou a 6,97%. "A continuar nesse ritmo, a carestia corroerá a renda dos mais velhos em ritmo menor", sentencia o economista André Braz, da FGV.

No front inflacionário, o quadro positivo para os mais velhos tende a continuar, acredita Braz. "Os aumentos previstos, como os de ônibus e da gasolina, afetam os mais jovens. Além disso, os preços dos remédios são controlados pelo governo e as variações não ultrapassam muito a inflação oficial", explica. Essa perspectiva incentiva empresas estrangeiras a se instalaram no Brasil para tirar proveito do que, nos Estados Unidos, se chama gray power, ou força grisalha.

Que o diga a companhia de venda direta Mary Kay, que atua no segmento de beleza. A receita líquida cresceu, em média, 60% anuais no país nos últimos quatro anos. Para 2015, a expectativa é de alta de mais 40%, a despeito da fragilidade da economia. A fim de atingir tal meta, a empresa planeja construir uma fábrica no Brasil. Com isso, reduzirá gastos com importação e consolidará a presença no mercado interno. "Nossa marca cresce até nos momentos de incertezas", diz Shana Peixoto.

Prevenção

O segmento farmacêutico também vem passando incólume pela estagnação da economia brasileira. "Em 2014, por exemplo, enquanto os principais mercados de medicamentos do mundo cresceram 1% ou 2%, o faturamento no Brasil aumentou 15%", compara o presidente do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos de São Paulo (Sindusfarma), Nelson Mussolini. Nas contas dele, as companhias do segmento encerraram 2104 com 3 bilhões de embalagens vendidas e faturamento de R$ 62 bilhões.

Por ano, a indústria farmacêutica investe, no mundo, US$ 60 bilhões em pesquisas e desenvolvimento de substâncias, acrescenta Mussolini. As marcas têm focado em medicamentos biotecnológicos, baseados em descobertas recentes sobre o genoma humano, que combatem, principalmente, doenças associadas a idosos. "Alguns importantes avanços ocorreram no campo de doenças degenerativas, como Parkinson, Alzheimer e tipos de câncer. O surto mundial de obesidade é outro campo de interesse do mercado", aponta.