Uma cobertura duplex num dos pontos mais valorizados da Rua Nascimento Silva, em Ipanema, na Zona Sul do Rio; dois andares inteiros, sem vizinhos, com piscina, vaga de garagem e vista para a Lagoa Rodrigo de Freitas. Preço do aluguel: R$ 3.650. Parece irreal, mas foi esse o valor que o ex-dirigente da Petrobras Nestor Cerveró, um dos presos na Operação da Lava-Jato, pagou em média durante cinco anos, até meados de 2014, para ocupar um imóvel com essas características numa das regiões mais nobres do Rio. Foi essa discrepância nos valores que chamou a atenção do Ministério Público Federal (MPF), que ontem ofereceu mais uma denúncia contra o ex-diretor da Área Internacional da Petrobras.

Cerveró foi denunciado por usar uma offshore no Uruguai para esconder a compra do apartamento. O negócio se deu com dinheiro desviado do esquema de corrupção na Petrobras. Além dele, o lobista Fernando Soares, o Baiano, e o uruguaio Oscar Algorta foram acusados de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. O MPF pediu ainda a desapropriação do imóvel.

Especialistas do mercado imobiliário sugerem que o valor de aluguel do imóvel, avaliado em R$ 7,5 milhões, pode chegar a R$ 30 mil. Assim que Cerveró desocupou o prédio de número 351 da Rua Nascimento Silva, ano passado, o valor do aluguel subiu para R$ 18 mil.

As investigações mostram que a operação começou em abril de 2007. A pedido de Cerveró, Algorta abriu em Montevidéu a empresa Jolmey, que serviu de fachada para receber recursos ilícitos pagos ao ex-diretor. Para movimentar o dinheiro, foi aberta uma subsidiária no Brasil e contratado o advogado Marcelo Oliveira Mello para chefiar a firma.

Mello era "um velho conhecido" do ex-diretor, segundo os procuradores. Entre 1987 e 2004, atuou no departamento jurídico da extinta subsidiária Braspetro e na gerência jurídica da Área Internacional. A primeira tarefa de Mello foi comprar o apartamento em Ipanema e, em seguida, "locá-lo" a Cerveró. As negociações foram feitas por e-mail e por telefone nos primeiros seis meses de 2008. Conforme depoimento do advogado, o pagamento do imóvel foi feito em três parcelas.

Para realizar a operação, Cerveró e Algorta enviaram R$ 2,6 milhões pela Jolmey do Uruguay para a subsidiária brasileira, através de operações cambiais. Cerveró enviou R$ 700 mil a mais. Com o dinheiro, o ex-diretor comandou uma reforma da cobertura. Após a obra, ele e a família ocuparam o duplex. Moradores contam que o ex-diretor era muito discreto e pouco falava.

 

 

Wagner diz que há 'espetáculo' na Lava-Jato

Para Ministro da Defesa, país não pode parar por conta da investigação

Paula Ferreira

O ministro da Defesa, Jaques Wagner, afirmou ontem que não se pode "parar o país para ficar assistindo ao espetáculo da investigação", em referência à Operação Lava-Jato, que desvendou um esquema de corrupção na Petrobras e levou à prisão ex-diretores da estatal e e dirigentes das principais empreiteiras do país. Wagner defendeu a importância das grandes empresas e disse que elas são motivo de orgulho para a imagem do Brasil no exterior. Citou a Odebrecht, uma das investigadas pela Polícia Federal na Lava-Jato:

- O Brasil tem que separar duas coisas: as investigações que correm pelo MP, pelo Poder Judiciário e pela PF e a nossa agenda de governo. A luta contra a corrupção é ininterrupta, porque onde tem dinheiro tem sedução. Infelizmente, é assim em qualquer parte do mundo. Agora, não vamos parar o país para ficar assistindo o espetáculo da investigação - afirmou Wagner, durante visita ao Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub), no Estaleiro e Base Naval, em Itaguaí.

A Odebrecht é a empresa brasileira à frente das obras no Prosub. Associou-se à francesa DCNS para a construção dos submarinos e executa obras do complexo que engloba a Unidade de Fabricação de Estruturas Metálicas (Ufem), o Estaleiro e a Base Naval.

defesa das Empresas nacionais

Perguntado se a Odebrecht, alvo de denúncias de corrupção, poderia ser substituída no empreendimento, Wagner afirmou que "de jeito nenhum". Disse que as grandes empresas "representam a inteligência nacional" e são motivo de orgulho para o país.

- Digo sempre que um país é conhecido em outros países pelo seu futebol, pela sua música, pela sua cultura, pela sua natureza, mas é muito conhecido pelas suas empresas nacionais. A gente, quando fala da Alemanha, lembra da Siemens, da Volkswagen; quando fala dos EUA, a gente lembra da IBM, e por aí vai. E hoje a gente tem o orgulho de dizer que, lá fora, também nos conhecem por algumas das empresas, inclusive a Odebrecht, que construiu o aeroporto de Miami e faz obras no mundo inteiro - disse. - Vamos investigar, mas não vamos jogar a criança com a água suja fora.

Wagner afirmou acreditar que foi cogitado como testemunha de defesa de Ricardo Pessoa - executivo da UTC apontado nas investigações como o chefe do "clube das empreiteiras" que pagava propinas na Petrobras - porque as obras da empresa na Bahia, onde foi governador de 2006 a 2014, não registram irregularidade.