A queda do preço do petróleo, de 52% nos últimos seis meses, vai alimentar o lucro operacional das empresas aéreas, no Brasil e nos Estados Unidos, antes de se converter em passagens mais baratas, apontam executivos do setor e analistas. A valorização do dólar, a própria irregularidade da cotação do barril no mercado internacional e elevadas taxas de ocupação nos voos justificam essa expectativa do setor.
 
"A queda bastante acentuada nos preços internacionais do petróleo e, em consequência, dos preços do combustível de aviação, não se reflete imediatamente em preços mais baixos para as passagens aéreas", disse ao Valor a presidente da TAM Linhas Aéreas, Claudia Sender. "As companhias não têm tido redução de custo com a queda do combustível proporcional à queda do preço do petróleo", apontou a executiva da maior aérea do país, dona de 38,5% do mercado, considerando o número de passageiros por quilômetros transportados (RPK).
 
Em média, combustíveis representam 40% dos custos operacionais de uma empresa aérea brasileira. Nos Estados Unidos, essa fatia é menor: 30%. Essa diferença ocorre porque a carga tributária é cerca de 20% maior no Brasil. E, no Brasil, é a Petrobras que define o valor do querosene de aviação (QAV). A estatal considera variáveis domésticas como infraestrutura de produção e frete, o que acaba descolando o preço praticado no mercado brasileiro da cotação no exterior.
 
O preço do combustível de aviação também considera a variação do dólar - que se valorizou 19% ante o real desde julho. Por isso, também, aéreas brasileiras dizem que não conseguem aproveitar integralmente o barateamento do barril.
 
Segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), a tarifa média praticada pelas aéreas no Brasil no primeiro semestre de 2014 - último dado disponível - foi de R$ 324,45, ou 0,53% mais que a média em igual período de 2014. Foi o primeiro semestre, desde 2003, que o setor elevou o preço do bilhete médio, segundo a Anac.
 
"Nos Estados Unidos, o combustível da aviação cai quase simultaneamente à desvalorização do petróleo no mercado futuro", diz o vice-presidente financeiro da Gol, Edmar Lopes. "Mas no Brasil, com o efeito câmbio, essa mudança não é tão forte. As aéreas vão tentar capturar uma parte em margem, embora possa haver algum repasse".
 
Segundo a equipe de analistas de aviação do banco J.P. Morgan, mudanças no câmbio tendem a ter maior impacto nas margens de lucro das aéreas brasileiras do que mudanças em preços de combustíveis. Por isso, quanto maior a receita que uma empresa brasileira tem em moeda estrangeira, maior o espaço que essa companhia tem para repassar a menor despesa de combustível para o bilhete.
 
Enquanto a Latam - dona da TAM e da LAN - faz 60% da receita em dólar, a Gol captura 12% em moeda estrangeira.
 
Já nos Estados Unidos, claro, todas as aéreas faturam em dólares. Neste mercado o preço de combustíveis nas bombas - de postos de varejo a aeroportos - oscilam quase simultaneamente à cotação do barril de petróleo. Por isso, analistas apontam que se o petróleo seguir ao redor de US$ 50 o barril nos próximos 12 meses, as aéreas americanas poderão economizar US$ 14 bilhões - 23% dos US$ 60 bilhões que a aviação comercial lá consome em QAV. Mas mesmo no mercado aéreo americano, o repasse do petróleo mais barato para os passageiros será apenas parcial, dizem analistas. Motivo: os aviões estão lotados.
 
As quatros maiores do país - American Airlines, Deita Air Lines, United e Southwest - estão todas voando com mais de 80% de assentos vendidos. "A recente queda acentuada no preço do petróleo deve ter um papel protagonista na lucratividade das empresas aéreas americanas em 2015", escreveu a Fitch em relatório mais recente sobre o setor.
 
No curto prazo, essa economia "vai direto para os lucros", disse Scott Kirby, diretor-presidente da American Airlines, a maior companhia aérea dos EUA em volume de tráfego, em teleconferência de resultados com analistas, em outubro.
 
Analistas de Wall Street dizem que as quatro grandes aéreas americanas vão elevar a margem de lucro antes de juros e impostos (margem Ebit) de 9%, em 2014, para acima de 15%, em 2015.
 
É nesse contexto que a aviação comercial americana praticou no segundo trimestre de 2014 uma tarifa média de US$ 395,62 ante US$ 339,16 em igual período de 2000, segundo dados do órgão governamental Bureau of Transportation Statistics. Em 2013, ficou em US$ 378,00.
 
Com dinheiro em caixa e demanda aquecida, as aéreas americanas só devem ceder parte das margens conquistadas com petróleo barato para reduzir - levemente - os bilhetes se os carros começarem a roubar passageiros dos aviões, especialmente em trechos mais curtos, apontam executivos do setor aéreo.
 
No Brasil, a taxa de ocupação em novembro girava em torno de 80%. Mas o setor ainda briga para operar no azul em termos financeiros. Levantamento disponível mais recente da Anac mostra que em 2013 as aéreas brasileiras tiveram prejuízo somado de R$ 2,4 bilhões - expectativa para 2014 é que este valor tenha caído consideravelmente. Grande parte desse prejuízo já era explicado pelo dólar, que indexa dois-terços do passivo das despesas das companhias.
 
Embora as duas maiores aéreas que atuam no país projetem lucro operacional - Latam prevê margem Ebit entre 6% e 8% em 2015, enquanto Gol prometeu alcançar um ganho operacional de até 6% este ano - as incertezas ainda preocupam os executivos.
 
"A TAM prevê que as atuais flutuações na cotação do petróleo, como efeito de questões geopolíticas mundiais, somadas à transição da política econômica brasileira para um novo modelo, projetam um ano de 2015 de considerável volatilidade", diz Claudia Sender.
 
Um relatório do departamento de energia do governo americano dá uma amostra do tamanho dessa incerteza com relação ao comportamento do petróleo. Os analistas consultados pelo órgão projetam preços do barril para dezembro deste ano que vão de US$ 28 a US$ 115,00. Na mediana para 2015, o preço que aparece é o de US$ 58. Mas para 2016, a estimativa é de US$ 62.
 
"As mudanças [na cotação do petróleo] surpreenderam a todos. Não dá para saber se é um fenômeno conjuntural ou estrutural", diz o vice presidente da Gol, que ainda não informou ao mercado qual é a cotação que tem para este ano. "Certamente em 2015 vamos ver um preço médio mais baixo que em 2014", afirma Lopes. A Latam, dona da TAM, projeta o preço médio do barril a US$ 85 para este ano.