Pressionada pela crise econômica e reeleita na disputa ao Planalto mais apertada da história, a presidente Dilma Rousseff montou um ministério com a menor proporção de ministros petistas, 34,2%, desde que o partido chegou ao poder federal, há doze anos. Pela primeira vez, há mais ministros de partidos aliados (15) do que do PT (13). A equipe ministerial é equilibrada quanto à divisão de pastas de acordo com o peso dos partidos aliados na Câmara, com um índice de proporcionalidade bastante semelhante ao do primeiro mandato.

O percentual contrasta com o primeiro gabinete do ex-presidente Lula, em 2003, que ostenta o recorde de participação de petistas no primeiro escalão: 56,6% ou 17 pastas diante de sete de aliados (23,4%) e seis (20%) de ministros sem filiação partidária. Desde então, o partido passou pela crise do mensalão, em 2005, foi obrigado a abrir espaço a legendas aliadas e a necessidade de compartilhar o poder voltou a se impor num momento de dificuldade.

Os 34,2% representam um encolhimento de mais de dez pontos percentuais em relação à média da presença de petistas no primeiro mandato de Dilma: 45%. A presidente tratou de se fortalecer no Congresso, ainda que em detrimento e das queixas de seu próprio partido.

Dilma cedeu pastas que o PT havia sempre controlado, três das quais emblemáticas: Fazenda e Planejamento, para os ministros de perfil técnico Joaquim Levy e Nelson Barbosa, e Educação, para o ex-governador do Ceará Cid Gomes, do Pros. O PT comanda agora um total de 13 pastas num universo de 39 - ou 38, de acordo com o critério utilizado pelo cientista político da FGV-Rio Octavio Amorim, que exclui o Banco Central.

Especialista no estudo de coalizões de governo, Amorim calculou, a pedido do Valor, o índice de proporcionalidade do segundo mandato de Dilma. A taxa, de 0,62, é a mesma com a qual a presidente iniciou o seu segundo mandato e reflete, na visão do pesquisador, um ministério bem montado, sob o ponto de vista da divisão de poder entre o PT e as legendas aliadas, das quais depende de apoio no Congresso.

No limite, o índice chegaria a 1 se um presidente da República distribuísse ministérios na exata proporção do tamanho da bancada na Câmara que cada partido tem em relação aos demais que participam da base aliada.

Pela primeira vez desde que o partido chegou ao poder, há mais ministros aliados (15) do que do próprio PT (13)

Fernando Collor de Mello, por exemplo, que sofreu impeachment em 1992, teve um ministério com índice de proporcionalidade de apenas 0,3. Cada gabinete corresponde à entrada ou saída de um partido da coalizão governista, ou ao início de um novo mandato. A maior taxa, desde José Sarney, foi de 0,7, alcançada pelo terceiro gabinete de Fernando Henrique Cardoso, entre janeiro e março de 1999.

A proporcionalidade de FHC, no entanto, variou muito. O que não tem acontecido na era PT, seja com Lula e, principalmente com Dilma Rousseff, cuja marca na estratégia de compartilhar o poder do primeiro escalão é a estabilidade.

Se o PT perdeu força no ministério deste segundo mandato, isso corresponde a seu enfraquecimento na eleição à Câmara. A bancada petista terá na próxima legislatura 17 deputados a menos. O PSD, que tem a quinta maior bancada na Câmara e estava sub-representado com apenas uma pasta, a Secretaria da Micro e Pequena Empresa, agora ocupa um espaço mais condizente com seu tamanho. Acrescentou o Ministério das Cidades, alocado para seu líder, o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab. O PMDB, que elegeu a segunda maior bancada, praticamente do mesmo peso da do PT, aumentou sua participação de cinco para seis pastas.

O índice de proporcionalidade - ou coalescência, seu termo técnico - leva em conta apenas o número absoluto e não a importância dos ministérios, expressa por exemplo pelo orçamento. Amorim reconhece a limitação do indicador, mas argumenta que o orçamento também não captaria o peso de pastas como Casa Civil ou Planejamento, que estão no núcleo do governo mas não dispõem de grandes dotações orçamentárias.

Para o cientista político, o encolhimento do PT no segundo mandato de Dilma reflete, em grande medida, a nova situação política da presidente e do seu partido, que saiu das urnas de 2014 enfraquecido na Câmara dos Deputados.

"Diante do enfraquecimento do PT, a presidente tinhas duas alternativas no que diz respeito à nomeação dos ministros: nomear mais políticos de partidos aliados e mais ministros sem filiação partidária. Foi exatamente o que ela fez", diz.

Amorim destaca que no primeiro gabinete do primeiro mandato de Dilma, 46% dos ministros eram petistas, 35% eram filiados a partidos aliados e 19% não tinham filiação partidária. Agora, no primeiro ministério do segundo mandato, 34% dos ministros são petistas, 39% são filiados a partidos aliados e 26% não têm filiação partidária. "São mudanças de monta", afirma.

Por outro lado, uma característica que o primeiro mandato de Dilma reitera em relação a todos os seus antecessores é a queda no índice de proporcionalidade ao término do governo. O fenômeno cíclico é comparado pelo pesquisador a um "fim de festa".

Perda de espaço corresponde à queda na bancada federal e reflete proporcionalidade na divisão de ministérios

Ocorre quando partidos aliados, no fim de mandato, começam a debandar da coalizão e procurar outros rumos. Foi o que aconteceu, por exemplo, em 2002, no último gabinete de FHC, quando o então PFL, hoje DEM, saiu da base. À época, o partido apostava na candidatura da então governadora do Maranhão Roseana Sarney à Presidência, projeto que foi abortado depois que uma operação da Polícia Federal envolveu seu marido em um suposto esquema de corrupção.

Em 2006, com alta popularidade e rumando à reeleição, Lula foi uma exceção ao manter a base coesa. Em 2010, seu último gabinete teve uma leve queda na proporcionalidade, como resultado de um prestígio ainda maior que o de quatro anos antes combinado a uma eleição em que teria que se esforçar para emplacar a sucessora.

Apesar de ambos terem mantido uma trajetória estável da distribuição de poder, Dilma compôs até agora gabinetes com mais ministros apartidários do que Lula. Na média, a presidente nomeou 23,5% de titulares sem filiação partidária, enquanto o padrinho político escalou 18,5% de técnicos nos 12 gabinetes formados durante oito anos de governo.