O início conturbado do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff deixa claro que a petista terá dificuldades de cumprir duas promessas feitas na campanha à reeleição: proteger o emprego e livrar o país da recessão que o PT atribuía à oposição. A julgar pelos prognósticos para a economia, manter a palavra será tarefa quase impossível. "Nossos problemas são tão grandes que é inevitável que 2015 seja marcado pela contração do Produto Interno Bruto (PIB)", decreta o economista sênior do Besi Investimentos, Flávio Serrano. As apostas de retração da atividade vão de 0,5% a 2%, a depender da conjugação de fatores que ameaçam o país. 

Não por acaso, o medo de perder o emprego voltou com tudo a perturbar os brasileiros. Na indústria, os cortes viraram rotinas. A salvação vinha sendo o setor de serviços. Mas, com o faturamento em queda, principalmente por causa da fragilidade do consumo das famílias, as empresas que contrataram mão de obra menos qualificada dão sinais de esgotamento. A perspectiva é de que o desemprego suba sem parar ao longo do ano. Na pior das hipóteses, a taxa, que está em 4,8% nas seis maiores regiões metropolitanas no país, deve encostar em 6,5%. Se isso ocorrer, ruirá o último trunfo que a presidente Dilma tem para ostentar como legado. 

Nas últimas duas décadas, o Brasil só registrou queda do PIB duas vezes: em 1992, quando Fernando Collor foi deposto por corrupção e a economia encolheu 0,54%; e, em 2009, segundo mandato de Lula, com retração de 0,3% por causa da crise financeira mundial. Caso a pior das estimativas dos especialistas se confirme, o tombo de Dilma será quatro vezes superior ao de Collor. 

Há razões de sobra para o pessimismo. A começar pelos problemas climáticos. A estiagem prolongada que atinge São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais pode parar as principais indústrias do país. Na região metropolitana paulista, 60% das empresas já enfrentam racionamento de água reduzindo turnos, dando férias coletivas ou mesmo demitindo funcionários. "Se não chover rapidamente", alerta o governador mineiro Fernando Pimentel (PT), "no máximo, em três meses, enfrentaremos um racionamento severo". 

A falta de água significa também energia elétrica escassa. Os reservatórios que atendem o Centro-Oeste e o Sudeste estão na mínima histórica. Na média, as usinas que garantem 70% da eletricidade produzida no país têm operando com 16,6% da capacidade, segundo o Operador Nacional do Sistema (ONS). A cada semana, as previsões de chuvas ficam menores. O período molhado acaba em abril. "O colapso do sistema elétrico sacramentará uma forte recessão em 2015", sentencia o economista-chefe do Banco Fibra, Cristiano Oliveira. 

Torneira seca 
Mas não é só. Estarrecido, o Brasil assiste ao maior esquema de corrupção da história destruir sua principal empresa, a Petrobras. Com o caixa saqueado para sustentar partidos da base aliada do governo, a estatal avisou que reduzirá em até 30% os investimentos previstos para este ano. Se isso se confirmar, apenas a companhia tirará pelo menos 0,5 ponto percentual do PIB, uma vez que a paralisia da empresa mata milhares de fornecedores. Para completar, os donos das maiores empreiteiras do país estão na prisão. Ninguém descarta uma quebradeira em série, que poderá respingar em parcela significativa do sistema financeiro. 

As maiores vítimas desse quadro desanimador serão os trabalhadores, que já estão sofrendo com o pesado aumento das tarifas públicas e dos impostos, medidas anunciadas pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy para tentar resgatar a credibilidade do país. A economista-chefe da Rosenberg Associados, Thaís Marzola Zara, traça dois cenários para a taxa de desemprego. No primeiro, chamado de "torneira seca", ela estima que o racionamento de água levará o indicador para 5,5% da população economicamente ativa, até o fim do ano. No segundo modelo, batizado de "apagão", o desemprego subirá a 6,1%. 

Esses números não levam em consideração a redução dos investimentos da Petrobras e os desdobramentos da operação Lava-Jato, que resultaram na demissão de Graça Foster da presidência da companhia e de cinco diretores. Nos cálculos do diretor do Departamento Econômico do Bradesco, Octavio Barros, com a estatal na berlinda, a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) recuará 3% este ano, depois do forte tombo de 8% em 2014. 

Tal previsão só aumenta a desconfiança na economia. "Estamos nos perguntando quando o PIB parará de cair", diz o economista-chefe da Associação das Instituições de Crédito e Financiamento (Acrefi), Nicola Tingas. Para ele, as incertezas sobre 2015 contaminam 2016. 

"Nossos problemas são tão grandes que é inevitável que 2015 seja marcado pela contração do Produto Interno Bruto (PIB)" 
Flávio Serrano, economista sênior do Besi Investimento 

Três perguntas para
Marcos Troyjo, professor da Columbia University, em Nova York, e diretor do Centro de Estudos sobre Brasil, Rússia, Índia e China (BRICLab) 

Com a recessão no Brasil, como ficará o emprego e a renda? 

Os exemplos da história econômica mostram que, em momentos recessivos, os maiores prejudicados são os mais pobres. Isso é mais grave no tipo de recessão que, aparentemente, avizinha-se para o Brasil, onde a contração pode vir acompanhada de inflação no limite superior ou acima do teto da meta (de 6,5%). Consumo, renda e emprego são afetados, o que é desencorajador para o investimento, cuja expansão deveria ser o grande motor da nova fase de crescimento do Brasil. 

Na melhor das hipóteses, o Brasil só voltará a crescer acima de 3% após 2018. Podemos falar em década perdida para o crescimento? 

Creio que para não considerarmos a década como perdida será importante entender que ficam como aprendizado os efeitos danosos de características dos anos Lula-Dilma, como protecionismo comercial, substituição de importações, terceiro-mundismo na política externa e onipresença do Estado na vida econômica. 

O que representa para o Brasil, que galgou pontos importantes até 2008, o crescimento baixo? 

Se o Brasil fechar o período 2011-2020 com crescimento médio anual de 2%, significará que não estamos nos desvencilhando da armadilha da renda média. Esse quadro é mais decepcionante na medida em que continuamos a observar a arremetida de grandes mercados emergentes, como China e Índia.