Título: No Brasil, 2016 vem antes de 2014
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Correio Braziliense, 11/07/2011, Política, p. 6

O governo conseguiu aprovar no Congresso a medida provisória que altera as regras de licitação para as obras da Copa do Mundo e da Rio 2016. Para comemorar, a presidente Dilma Rousseff receberá, na quarta, os líderes dos partidos aliados em um jantar no Palácio da Alvorada. Mas o otimismo político não se traduz na realidade dos canteiros: a dois anos do início da Copa das Confederações, em julho de 2013, mais da metade das obras de mobilidade urbana tiveram seus cronogramas de conclusão reprogramados; São Paulo ainda não tem estádio para a realização dos Jogos, e os editais para concessão à iniciativa privada de três dos principais aeroportos brasileiros ¿ Garulhos e Viracopos, em São Paulo, e o de Brasília ¿ só saem em dezembro. Os editais de Confins, em Belo Horizonte, e do Galeão, no Rio de Janeiro, só devem estar prontos no ano que vem.

O Ministério do Esporte foi procurado pelo Correio, mas não quis se manifestar sobre o assunto. Segundo o relator da RDC na Câmara, o deputado José Guimarães (PT-CE), após a aprovação da matéria no Congresso, o cronograma ficará mais acelerado. "Os governadores, inclusive da oposição, começam a correr atrás do prejuízo nas obras estaduais. Vamos conseguir entregar tudo a tempo do Mundial", acredita.

A situação das obras da Copa fica ainda pior em contraste com outro grande evento esportivo brasileiro previsto para esta década, os Jogos Olímpicos de 2016, no Rio, que estão em um estágio um pouco mais avançado, apesar de ter mais mais dois anos de folga. O cronograma em dia e a última visita feita pelos representantes do Comitê Olímpico Internacional geraram elogios à Cidade Maravilhosa. Isso ocorreu apesar de a passagem deles ter coincidido com um vendaval que assolou a capital fluminense e expôs um antigo drama conhecido dos cariocas: o alagamento das ruas ao redor do Maracanã e próximas à Praça da Bandeira. "Tudo bem, isso foi em junho, os jogos serão em agosto, nessa época nunca chove no Rio", aposta um dos integrantes do Comitê Rio 2016.

Provocações Os organizadores dos dois eventos trocam provocações. Para quem está planejando a Copa do Mundo de 2014, organizar a Olimpíada parece mais fácil: é apenas uma cidade e boa parte do aparelho urbano estará pronto, justamente por conta da Copa.

Responsáveis pela organização da Rio 2016 rebatem. As Olimpíadas envolvem um número maior de atletas, de diversas modalidades. Além disso, a concentração dos eventos em uma cidade só se torna uma vantagem por centralizar a atuação política e minimizar as vaidades na organização de um evento com mais de uma sede. Quanto ao tempo para erguer todas a estrutura necessária para a festa, o argumento é irrefutável: o Rio virou cidade-olímpica em 2009 e o Brasil, sede da Copa em 2007. Em ambos os casos, o prazo entre a escolha e a realização do evento é o mesmo: sete anos.

Essa aura de organização da Rio 2016 não esconde, contudo, uma divergência política. O governo federal criou a chamada Autoridade Pública Olímpica para gerenciar o evento. Pela ideia inicial, a intenção era que a APO tivesse a palavra final em tudo, inclusive nas licitações e na elaboração dos contratos com aditivos inevitáveis em eventos deste porte. Atualmente, o orçamnto previsto para a Rio 2016 está em R$ 23,2 bilhões. O governador Sérgio Cabral e o prefeito Eduardo Paes, ambos do PMDB, bateram o pé e conseguiram tornar-se soberanos sobre as obras, o que melindrou o primeiro indicado para a APO, o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles.

Meirelles desistiu do cargo, negociou com a presidente Dilma uma vaga no Conselho de Governança para ter tempo de dedicar-se à atuação no mercado financeiro. A presidente decidiu nomear o ex-ministro das Cidades, Márcio Fortes, que na semana passada teve seu nome aprovado em sabatina no Senado (leia entrevista abaixo). Mas o primeiro compromisso de Fortes não foi muito animador. Há três semanas, ele participou de um evento no Consulado Britânico no Rio para troca de impressões sobre os Jogos de Londres 2012. Paes era o anfitrião e convidou para compor a mesa e falar sobre a Rio 2016 ninguém menos do que Henrique Meirelles. Fortes, presente no evento, não foi chamado sequer para a Mesa Oficial.

No caso da Copa do Mundo, o drama é mais explícito. O país corre atrás do prejuízo de ter feito opção política de inchar o número das cidades sedes. A Alemanha tem uma infraestrutura urbana muito mais completa que o Brasil, escolheu seis cidades-sede para o Mundial de 2016. O Brasil escolheu simplesmente o dobro. Uma testemunha presencial das negociações lembra do equilíbrio que o ex-presidente Lula fez para agradar a todos de olho nos dividendos eleitorais para sua então candidata a presidente, Dilma Rousseff. Hoje no cargo, ela tem uma herança difícil de administrar até 2014, ano em que poderá tentar a reeleição para o Palácio do Planalto.