O governo promoveu ontem um “bloqueio preventivo” de 33% nos gastos de custeio administrativo, que envolvem a locação de imóveis e carros, compra de materiais de escritório, passagens e diárias, pagamentos de água, luz, telefone, entre outros. A redução será de R$ 1,9 bilhão por mês e de R$ 22,8 bilhões ao longo do ano.

Nesse bloqueio não estão incluídos despesas obrigatórias, como o pagamento de pessoal e benefícios previdenciários, e aquelas não passíveis de contingenciamento, como pagamento de bolsas de estudo e de ações de prevenção a desastres, entre outras. Ficaram fora também os investimentos públicos, que serão objeto de novo corte após a aprovação do Orçamento.

Em entrevista à “Globo News” ontem à noite, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, disse que a “redução preventiva” de R$ 22,8 bilhões nesses gastos não prioritários é a terceira etapa do programa de ajuste das contas públicas que está sendo feito.

A primeira, segundo o ministro foi a elevação das taxas de juros do Programa de Sustentação do Investimento (PSI), mantido pelo BNDES, que reduziu à zero as despesas do Tesouro com os subsídios do programa. Na segunda etapa, foram feitas mudanças nos programas do seguro-desemprego, do abono salarial e na pensão por morte, anunciadas no fim do ano passado. Depois do corte de R$ 22,8 bilhões, Barbosa disse que será feita uma avaliação dos investimentos públicos, depois da aprovação do Orçamento. Ele não revelou qual será o montante do contingenciamento .

O “bloqueio preventivo” anunciado ontem atingiu o custeio administrativo de todos os ministérios.

A área de saúde foi a mais preservada, porque quase todas as ações e serviços públicos de saúde estão excluídas do contingenciamento, de acordo com a LDO, com o objetivo de preservar o mínimo constitucional de gastos na área.

O bloqueio foi linear, ou seja, a redução de 33% atingiu todos os órgãos do Executivo. A maior redução, em termos absolutos, ocorreu na Educação, onde ocorrem os maiores gastos de custeio. O bloqueio mensal no ministério foi de R$ 586,8 bilhões. Assim, a redução dos gastos da área será de R$ 7 bilhões.

O Planejamento garantiu que os pagamentos a professores, os gastos com a merenda escolar e as despesas com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), entre outras, serão preservados.

O governo estava autorizado pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) a empenhar até 1/12 avos por mês das dotações de custeio previstas na proposta orçamentária, enquanto o Orçamento deste ano não fosse aprovado. Para mostrar a disposição de cumprir a meta fiscal de 2015, fixada em 1,2% do PIB, o governo decidiu autorizar o empenho de apenas 1/18.

Com isso, o bloqueio adicional será de R$ 1,9 bilhão por mês. O total anual desses gastos, também chamados de custeio administrativo restrito, sujeitos à redução anunciada ontem, é de R$ 68 bilhões.

Assim, tornar permanente o bloqueio preventivo significará corte de R$ 22,8 bilhões na despesas até o fim do ano.

O “bloqueio preventivo” foi apresentado pelo Planejamento como “um limite para o período de exceção”, que vai de janeiro até a aprovação do Orçamento de 2015, prevista para fevereiro. Quando o Orçamento for aprovado, o governo baixará novo decreto de programação orçamentária, com o valor total do contingenciamento das despesas orçamentárias, incluindo investimentos.

O aperto nas contas deste ano, que está sendo sinalizado a todos os gestores dos ministérios, é uma repetição do ocorrido no primeiro ano do mandato de Dilma. Também naquele ano, o governo começou sem um Orçamento aprovado e em vez de liberar 1/12 avos mensais, o governo editou decreto para permitir valor de 1/18 avos.

Na época, informou que era um “bloqueio preventivo” e, em seguida, quando o Orçamento foi aprovado, anunciou contingenciamento de R$ 50 bilhões.

O decreto com o bloqueio foi editado dois dias depois de o governo ter baixado uma MP abrindo crédito extraordinário de R$ 76 bilhões na proposta orçamentária deste ano. Os créditos serão destinados aos investimentos do governo federal e das estatais.

O Planejamento explicou que “os investimentos previstos na MP correspondem a um terço da previsão da proposta orçamentária de 2015 e serão liberados na medida das prioridades de execução”.

 

Ministros querem impedir paralisação de projetos

Preocupados com impacto da restrição de gastos maior do que esperavam para o início deste ano, alguns ministros tentam se armar nos bastidores com números e projetos para convencer a equipe econômica a autorizar um limite maior de despesas e impedir a paralisação de programas considerados prioritários neste ano.

 

Ontem, o governo publicou o decreto restringindo o teto de gasto mensal dos ministérios até que o orçamento seja aprovado. Com a medida, os novos ministros do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff terão que fazer, este mês, um corte ainda maior nos orçamentos. A medida sinaliza que o contingenciamento, quando houver orçamento aprovado, poderá ser mais forte.

 

As novas equipes, muitas ainda em formação, tomavam pé da situação para decidir o que cortar. Algumas pastas, porém, admitem que programas importantes serão afetados. Mas a batalha por mais gastos é nos bastidores, pois nenhum novo integrante do governo quer bater de frente com a equipe econômica. O Ministério do Planejamento informou que os investimentos foram preservados.

 

"Vamos tentar sensibilizar o governo para manter alguns programas. Assim que melhorar a receita, vamos trabalhar para manter o orçamento previsto", disse um assessor de um novo ministro. Nos últimos anos, a receita para redução de gastos tem implicado postergação do início de programa ou adiamento de pagamentos, o que não deverá ser diferente neste ano.

 

O Ministério dos Transportes, por exemplo, disse que "despesas de funcionamento de órgãos e algumas finalísticas" poderão sofrer restrições, como, por exemplo, fiscalizações e manutenção das hidrovias interiores e de terminais fluviais. Para se adequar aos limites impostos pelo decreto, a pasta informou que irá "priorizar as despesas essenciais de custeio". O Ministério das Cidades informou que o ministro Gilberto Kassab determinou a imediata redução de despesas administrativas em todos os setores. "Os investimentos sociais em execução ou programados, como o programa Minha Casa, Minha Vida, não serão afetados", disse em nota.

 

Já o Ministério da Educação ressaltou que o decreto preserva despesas como alimentação na escola, transferências a Estados do salário-educação e o pagamento de bolsas. "O MEC está avaliando o impacto do decreto nas demais despesas de custeios", informou.

 

O Desenvolvimento Social e Combate à Fome também disse ainda estudar o impacto das medidas e que a restrição exigirá a adequação das ações até a aprovação do orçamento. "Importante registrar que o Programa Bolsa Família não está sujeito a este tipo de restrição", informou a pasta.

 

No Ministério da Agricultura, os técnicos estão avaliando os números para decidir o que cortar. No Turismo, também ainda não há definições a respeito de quais despesas serão afetadas. "O Ministério do Turismo ainda aguarda novas definições para fazer sua programação orçamentária", afirmou o órgão, em nota.

 

A Defesa informou que pedirá a cada uma das forças que apresente um estudo de onde poderá ser feita a redução, levando em consideração gastos menos prioritários, como viagens, cursos etc.

 

O Ministério da Saúde esclareceu que o decreto não compromete a execução de programas e ações da pasta, já que 99% dos R$ 109,2 bilhões assegurados no projeto do orçamento deste ano estão fora do cálculo do corte e os investimentos foram garantidos.

 

Dilma se reúne com Coutinho e presidente do BNDES pode ficar no cargo até março

 

Luciano Coutinho: sucessão no banco foi discutida durante reunião com Dilma A presidente Dilma Rousseff pode manter Luciano Coutinho no comando do BNDES até março. Segundo apurou o Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, a sucessão no banco foi um dos assuntos tratados na reunião que a presidente e Coutinho tiveram ontem pela manhã. A configuração das presidências dos outros dois bancos públicos aponta para Paulo Caffarelli no Banco do Brasil e Miriam Belchior na Caixa. O atual vice-presidente de varejo do BB, Alexandre Abreu, está na lista para o BNDES. A atuação do BNDES vai mudar significativamente com a nova equipe econômica. Além de elevações na TJLP e redução da participação do banco nos financiamentos concedidos, o BNDES terá que ter gestão mais ativa da tesouraria para garantir recursos próprios. O sinal já enviado pelo Tesouro é que não haverá repasses de recursos oficiais este ano. Segundo informações de autoridades da área econômica, o aporte de R$ 30 bilhões feitos ao BNDES no fim do ano passado é suficiente para que o banco sustente boa parte das operações ao longo de 2015. Caso faltem recursos, a expectativa é que o banco ajuste suas operações sem depender do Tesouro. O relacionamento do Tesouro com os bancos públicos mudou a partir de 2008. Com o acirramento da crise econômica global, o governo passou a usar os bancos públicos para aumentar o volume de crédito na economia, muitas vezes com juros subsidiados, e depois, em 2012, para baixar os juros. A intenção de Dilma era anunciar o nome dos futuros dirigentes dos bancos públicos junto com a equipe econômica. Os planos, no entanto, tiveram que ser alterados por causa do escândalo da Petrobras. A presidente deu prioridade à formação do ministério para blindar politicamente o governo.

 

Analistas afirmam que medida é positiva

 

Os analistas veem a medida de contingenciamento de despesas como positiva, mas divergem quanto à sua eficácia para que a meta de superávit de 1,2% do PIB neste ano seja atingida. O economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Newton Rosa, diz que o contingenciamento mostra que de fato o governo pretende "reverter a política fiscal frouxa". E ressaltou que o governo está tomando medidas de contenção mesmo antes da aprovação do Orçamento de 2015 pelo Congresso. "Não vão esperar até a aprovação para agir. Já estão agindo", disse.

Bloqueio - Publicado nesta quinta-feira (08/01) no "Diário Oficial da União (DOU)", o Decreto 8.389 reduz em um terço o teto mensal de gastos discricionários que já poderiam ser feitos e representará um bloqueio mensal de R$ 1,9 bilhão.

Preocupação - Para Rosa, a medida mostra "claramente" que o Ministério da Fazenda está preocupado com o superávit de 1,2% do PIB em 2015. Além disso, ressalta que ela terá um papel importante na recuperação da confiança da política econômica por parte do setor privado. "Este é o primeiro passo para que haja a retomada do investimento do empresariado", disse.

Insuficiente - Já na opinião de Gabriel Leal de Barros, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre-FGV), o contingenciamento ajuda, mas não é suficiente para atingir a meta de superávit de 1,2%. Ele diz que o esforço fiscal necessário em 2015 que colocaria as contas públicas em um "caminho de sustentabilidade" requer outras medidas. Além disso, é preciso descontar das previsões do Orçamento o tradicional "inchaço" das receitas e despesas que ocorre depois da passagem do texto pelo Congresso.

Ajuste fiscal - "Contingenciar os recursos do Orçamento não necessariamente é fazer ajuste fiscal. O valor global foi elevado, mas não garante a execução da meta de 1,2%. É necessário, mas não suficiente", acrescentou. Entre as medidas que precisam complementar o contingenciamento, destaca a elevação ativa de carga tributária, com a criação de impostos ou alta de alíquota.

Sinais positivos - Barros concorda, no entanto, que os sinais que têm sido dados pela nova equipe econômica são muito positivos. "A nova equipe é ótima, não só o ministro, mas todos os novos nomes anunciados", afirmou