Decisões da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados nos últimos 20 anos liberaram pelo menos um quinto dos parlamentares de registrar presença em plenário, mostra levantamento nas atas das reuniões do órgão. As autorizações permitiram que estes deputados, que nesse período podiam variar de 100 a 200, não tivessem o salário descontado mesmo que estivessem fora de Brasília em dias de votação de projetos.

Cada dia de falta não justificada representa desconto de R$ 1,1 mil no salário dos deputados, de R$ 33,7 mil. O desconto era maior até 2007, quando era proporcional ao número de sessões para votações de projetos - se ocorressem dez sessões deliberativas em um mês e o deputado faltasse em uma, perderia R$ 3,3 mil, por exemplo -, mas a regra foi alterada para abater apenas 1/30 do subsidio mensal a cada ausência.

Os deputados já são dispensados de marcar presença em plenário nas segundas e sextas-feiras, quando ocorrem sessões de debates, dias que são reservados para atividades nos Estados.

Foram beneficiados pela dispensa do registro ex-presidentes da Câmara e do Senado, líderes partidários, presidentes de partidos, integrantes da Mesa, corregedor, ouvidor, procuradora da Mulher, representantes do Brasil no Parlamento do Mercosul, presidentes de comissões permanentes e temporárias e integrantes de comissões parlamentares de inquérito (CPIs) em atividades fora da Câmara. O número de autorizações foi crescendo ao longo dos anos.

A princípio, apenas os integrantes da Mesa, líderes das bancadas e presidentes de partidos estavam dispensados de marcar presença. Em reunião da Mesa no dia 20 de fevereiro de 1997, o ex-deputado Efraim Morais sugere que "seja mantida decisão anterior da Mesa no sentido de que as eventuais ausências de registro no painel eletrônico nas sessões deliberativas da Casa [...] sejam consideradas como justificadas em razão da natureza de suas atribuições."

O número de deputados com faltas automaticamente justificadas foi acrescido nas gestões de Arlindo Chinaglia (PT-SP), Michel Temer (PMDB-SP) e Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) por solicitação dos interessados, aprovadas de forma unânime pelos integrantes da Mesa Diretora.

Apenas as permissões para que os representantes do Brasil no Parlasul, nas semanas de reuniões do grupo, e para os integrantes de CPIs em missões externas tivessem as ausências automaticamente justificadas ocorreram por atos da Mesa ou resolução. As demais autorizações foram publicadas apenas em atas das reuniões, que, para efeitos legais, têm a mesma validade.

A maior liberação ocorreu em abril do ano passado, quando os presidentes de comissões temporárias foram dispensados de registrar presença. Na legislatura passada funcionaram 99 comissões deste tipo. A autorização, que duplicou o número de deputados dispensados de registrar presença, casou com o período pré-Copa do Mundo e eleições, em a Câmara começou a registrar dificuldades de quórum para deliberar sobre projetos mais importantes. Propostas de emenda constitucional (PECs), que precisam da aprovação de 308 deputados, ficaram inviabilizadas.

Nesta legislatura, por esses regras, pelo menos 71 deputados estariam dispensados de registrar presença. Número que aumentaria em 27 nas semanas de sessões do Parlasul e tenderia a ficar ainda maior quando instaladas as comissões temporárias para discutir projetos - por enquanto já existem oito aguardando indicações partidárias para entrar em funcionamento.

Na tentativa de mudar esse quadro o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), promoveu mudanças nas regras em seus primeiros dias de gestão. Cancelou ato que permitia que "missões partidárias" servissem como justificativa para as faltas, marcou sessões para segundas e quintas-feiras, endureceu o aval para as justificativas e decidiu que apenas os líderes - são 24- e os integrantes da Mesa - são 11- terão as faltas abonadas.

As medidas para aumentar o quórum já foram tentadas quando Chinaglia, derrotado agora por Cunha ao tentar volta à presidência da Casa, assumiu em 2007. Com o tempo, contudo, o petista cedeu a pressão dos deputados e a maioria das faltas foi abonada.