"Passo o ponto", "aluga-se", "vende-se". Tem ficado cada vez mais comum encontrar cartazes com esse tipo de anúncio colados nas vitrines de lojas de Brasília, vazias e de portas trancadas. Em algumas quadras, é possível achar vários espaços vagos, um do lado do outro. Ao longo da W3, também não faltam estabelecimentos desativados, de diversos ramos. De acordo com a Associação Comercial do Distrito Federal, aproximadamente 21% das lojas nas asas Sul e Norte estão fechadas - um total de 2.153 -, deixando cerca de 21 mil pessoas desempregadas. De março para dezembro do ano passado, 228 comércios nos dois bairros deram fim às atividades. A tendência se repete no DF inteiro, onde 16,16% dos estabelecimentos estão vazios, à espera de serem alugados ou comprados (leia quadro). 

De acordo com o presidente da ACDF, Cléber Pires, a situação não tem precedentes na região e a tendência é ficar ainda pior. Falta de estacionamento, insegurança e alta carga tributária são as principais causas do problema. "Dessas, a terceira é a de menor influência. Se as empresas tivessem como vender, as taxas não seriam impeditivo", acredita. O presidente do Sindicato do Comércio Varejista do DF (SindiVarejista), Edson de Castro, também destaca a popularização das feiras especializadas de roupas, acessórios e outros produtos, que tem provocado um impacto negativo no comércio tradicional. "Os lojistas têm de pagar aluguel e impostos mais pesados, deixando os preços menos competitivos, diferentemente dos feirantes", critica. 

Dentre todos os problemas, a falta de vagas para veículos é o que afeta mais diretamente o desempenho das lojas. "Locais como a W3 e as quadras comerciais não têm a mesma vantagem que os shoppings. Se as pessoas não têm como parar para comprar, elas desistem", comenta o presidente da ACDF. Como alternativa, o órgão apresentou um projeto de lei ao governo que sugere a criação de estacionamentos rotativos pagos (Veja Para saber mais). Outra questão são os constantes roubos e furtos, que têm deixado os donos de lojas receosos. "Um estabelecimento que é assaltado uma vez consegue se recuperar. Mas, depois de uma segunda e uma terceira, acaba fechando", completa Pires. 

Desconfiança 

Entre os lojistas do Distrito Federal, o sentimento é de desânimo. Em junho de 2014, a empresária Carmo Orrico, 49 anos, decidiu transferir a sede da sua loja de doces portugueses, localizada no subsolo de um prédio comercial na 214 Norte, para um estabelecimento no térreo, na 114 Norte. Com a mudança, os preços aumentaram e, mesmo com clientes fiéis, as contas ficaram pesadas demais. Em janeiro, o Delícias Lusas fechou as portas. "O aluguel era caríssimo e, como não havia quase nenhuma vaga para estacionar, poucos fregueses paravam para conhecer o lugar", relata Carmo. Atualmente, ela trabalha em uma casa de Sobradinho e atende apenas por encomenda, na tentativa de reduzir os custos. 

A empresária Bernardeth Martins, 54, passou por situação parecida. Ela é dona de uma loja de roupa infantil no Jardim Botânico e, em junho de 2013, decidiu abrir uma filial na 510 Sul. O novo empreendimento duraria apenas um ano. "Eu pagava R$ 10.400 de aluguel. Um absurdo. Para piorar, a região é perigosa. Um pouco antes de fechar, a loja foi furtada enquanto a gente estava no depósito, no andar de baixo", conta. Outro problema eram as condições do prédio. "Eles são velhos e os proprietários nem se dão o trabalho de melhorar. Cheguei a sofrer vários alagamentos e perder muita mercadoria", reclama. 

Para quem aluga, a situação também está difícil. A empresária Esdra Chaer, 48 anos, é dona de quatro lojas na comercial da 305/306 Sul. Uma delas era alugada há 14 anos, pela mesma pessoa, que mantinha uma loja de roupas no local. "Ela não deu conta de pagar as contas e saiu em novembro. Há um ano, eu não ia nem ter precisado colocar anúncio para conseguir um substituto na hora. Com as coisas do jeito que estão, não achei ninguém até agora", diz. Para tentar vender o ponto, ela está cobrando R$ 50 mil, metade do valor. 

As pesquisas refletem a descrença dos comerciantes. O Índice de Confiança do Empresário do Comércio do (Icec), elaborado pela Federação de Comércio do DF (Fecomércio), iniciou 2015 com 104,3 pontos. Abaixo de 100, o cenário é considerado pessimista. Desde janeiro do ano passado, quando o Icec era 122,4, houve uma queda de 18,2 pontos. "Vários fatores influenciam no resultado, como a percepção dos lojistas sobre o governo e a economia nacional. Além disso, a falta de segurança e o preço dos aluguéis prejudicam a confiança por parte dos empresários", explica o presidente da Fecomércio, Adelmir Santana.

Vagas rotativas
A Zona Azul é uma modalidade de estacionamento usada em grandes cidades brasileiras para incentivar a rotatividade de vagas. A lógica fundamental desse sistema está baseada na crença de que, limitando o tempo de estacionamento por automóvel, é possível estimular a rotatividade de veículos e aumentar a oferta de vagas perto de estabelecimentos comerciais. 

A Associação Comercial do Distrito Federal apresentou um projeto de lei ao governador Rodrigo Rollemberg, na última quinta-feira, sugerindo que um sistema como esse seja implantado em Brasília. O horário convencional para o uso da Zona Azul seria entre as 7h e as 9h, de segunda a sexta, e das 7h às 13h, aos sábados, existindo diferenças de horários e períodos de permanência, dependendo do local. O "cartão azul" (comprovante de pagamento do usuário) permitiria a permanência de até duas horas em uma vaga, tendo que mudar o carro de lugar ao fim desse prazo.

Buscando a sobrevivência
Com tantas lojas fechando as portas, os empresários se perguntam como fazer para superar as dificuldades e salvar o negócio. De acordo com o superintendente do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Valdir Oliveira, existem algumas soluções. "Uma delas é investir no e-commerce. Com um canal on-line para fazer as vendas, o empresário terá apenas custos de estoque, reduzindo muito as despesas", explica. Nesses casos, no entanto, o lojista tem que procurar investir em logística para oferecer um bom serviço e não perder clientes. "Até um tempo atrás, o consumidor preferia comprar apenas de empresas que tivessem lojas físicas. Hoje, isso está mudando", diz Oliveira. 

Outra opção é o compartilhamento do espaço. Segundo o superintendente do Sebrae, se duas empresas dividirem uma loja - por exemplo, uma padaria e uma banca de revistas, ou uma oficina e uma vendedora de autopeças -, dentro das condições estabelecidas pela lei, ambas podem se beneficiar muito. "Além de partilhar os custos fixos, como o aluguel, elas podem atrair clientes que, adquirindo um serviço, acabam se interessando por outro", recomenda.