Obras de grande porte tocadas pela Petrobras são alvo de pelo menos 22 investigações no Tribunal de Contas da União (TCU), segundo levantamento feito pela Corte a pedido do Correio. O montante perdido só com o sobrepreço das obras, desde 2008, é calculado pela corte de contas em mais de R$ 4 bilhões. Segundo o presidente do tribunal, Augusto Nardes, a estatal está "doente". "Está doente e precisa, em curto espaço de tempo, definir o melhor diagnóstico para as causas dessa doença (...). O caso de Pasadena, assim como o de outros processos aqui analisados, representa apenas um sintoma dessa doença", disse o ministro. 

As críticas foram feitas pouco antes de o Tribunal decidir isentar a ex-presidente da Petrobras, Graça Foster, do bloqueio de bens em decorrência dos prejuízos na compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos. Além da desastrada operação no Texas, que teria provocado prejuízos da ordem de US$ 792,3 milhões, o levantamento do TCU relaciona ainda as perdas na construção da refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco; do Comperj, no Rio de Janeiro; e na refinaria Premium 1, no Maranhão, entre outras obras. 

Uma busca rápida no sistema de consulta do Tribunal mostra a existência de pelo menos 14 procedimentos de Tomada de Contas Especial (TCE), semelhantes à instaurada para apurar a compra de Pasadena, em andamento no Tribunal. Além de várias obras de grande porte, as TCEs também apuram contratos de patrocínio firmados com ONGs, mau uso de verbas de publicidade e outros atos da Petrobras. O montante investigado por essas Tomadas de Contas chega a R$ 562,9 milhões de reais. Os processos foram instaurados entre os anos de 2000 e 2014. 

Nardes disse ainda ter se reunido diversas vezes com o atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, e com o antecessor dele, Joaquim Barbosa, para pedir mudanças em um decreto de 1998 que flexibiliza as regras para compras e contratos da estatal. "Aguardamos uma liminar há muito tempo, mas infelizmente essa questão não avançou", disse ele. "Foi o ministro Ubiratan (Aguiar) que alertou, há 13 anos, que não podíamos continuar com o Decreto nº 2.745 de 1998, para simplificar os procedimentos licitatórios da Petrobras. (...) Só para mostrar a gravidade da situação, 70% das compras feitas pela Petrobras não têm licitação", disse ele. 

"Eu até acredito que caberia na competição, em nível internacional, utilizar o decreto. Mas, da atividade-meio, para contratar refinarias como Abreu e Lima, no Brasil, que começou com US$ 2,5 bilhões e hoje chega a US$ 20 bilhões, ou R$ 40 bilhões, sem o cumprimento da Lei das Licitações, baseado no decreto?", criticou Nardes. 

Segundo o economista e especialista em administração pública José Mathias-Pereira, o decreto fez parte de um esforço do então governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), cujo objetivo era dar mais agilidade à empresa e prepará-la para a privatização. "Esse decreto começou a ser utilizado durante a gestão de um francês (o economista Henri Philippe Reichstul, que chefiou a Petrobras entre 1999 e 2001), num contexto em que se preparava a Petrobras para a privatização", diz ele, que é professor da Universidade de Brasília (UnB). "É claro que, posteriormente, começou-se a extrapolar o papel desse decreto, a usá-lo para viabilizar esse saque à Petrobras, com o objetivo de perpetuação do poder", argumenta o especialista. 

Perdas e danos 

Veja alguns dos últimos alertas sobre irregularidades emitidos pelo TCU na Petrobras 

R$ 2,2 bilhões 

(cotação do dólar a R$ 2,82) Valor supostamente perdido pela Petrobras com os erros durante o processo de compra da refinaria de Pasadena, no Texas. 

R$ 1,1 bilhão 

Valor da estimativa máxima do TCU para perdas durante na construção de Abreu e Lima, em Pernambuco. 

R$ 368 milhões 

Sobrepreços encontrados pelo tribunal em quatro contratos da refinaria de Abreu e Lima, segundo acórdão de 2014. 

R$ 162 milhões 

Irregularidades encontradas pelo TCU nas obras das Tubovias do Comperj, no estado do Rio. 

R$ 76,5 milhões 

Perdas decorrentes de contratos firmados pela empresa para a terraplanagem na obra do Comperj.