Graças às sucessivas quedas na cotação do petróleo, a gasolina está cada vez mais barata no mundo. Menos no Brasil. Aqui, o preço resiste porque o governo precisa corrigir o uso abusivo da Petrobras como instrumento para segurar a inflação, congelando tabelas de refinarias, e reequilibrar o seu caixa e o da estatal. Durante os últimos quatro anos, enquanto o barril estava acima de US$ 100, a petroleira não podia repassar ao mercado interno a defasagem da gasolina, cujo valor era menor do que o praticado no exterior, para evitar o estouro da meta da inflação, de 6,5% ao ano. 

Pelas contas do diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires, essa operação gerou um prejuízo de R$ 50 bilhões para a Petrobras durante o todo o primeiro mandato de Dilma Rousseff. Agora, com o petróleo barato, a situação se inverteu e a diferença de preço ficou positiva em 70% até janeiro. Isso rendeu quase R$ 4 bilhões a mais no caixa da empresa mês passado. Pelos cálculos de Pires, se houvesse continuidade nessas condições gerais, a estatal levaria pouco mais de um ano para anular as perdas dos últimos quatro. Mas, com o dólar rompendo a barreira de R$ 2,84, essa diferença já caiu para 24%. "A variação repentina do câmbio adiará a melhora das finanças da Petrobras", sublinhou. 

A fatura continuará, então, sendo paga pelo cidadão. Para piorar, o governo vem gastando mais do que arrecada e precisa reforçar a receita. Só em 2014, o rombo das contas do setor público foi de R$ 32,5 bilhões e especialistas duvidam que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, cumprirá a promessa de superavit de R$ 66,3 bilhões, ou 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB). 

Como o Orçamento de 2015 ainda não foi aprovado pelo Congresso, o corte esperado de R$ 65 bilhões ainda não ocorreu e o ajuste vem ocorrendo só pelo lado da receita, via impostos. Uma das primeiras medidas de arrocho foi a volta do imposto sobre os combustíveis, a Cide, que vai voltar a partir de maio. Nesse meio tempo, para compensar , a PIS-Cofins na distribuidora será de R$ 0,22 sobre a gasolina e de R$ 0,15 sobre o diesel. Na bomba, o aumento foi bem maior, cerca de R$ 0,30. 

As medidas equivocadas tomadas no primeiro governo Dilma impedem o cidadão de aproveitar a queda dos preços do petróleo, além de conviver com uma inflação anual acima de 7%. A gasolina está em média 30% a 35% mais barata no exterior. Nos Estados Unidos, por exemplo, o litro custa R$ 1,59, metade do valor cobrado em muitas cidades brasileiras. "O consumidor pode esquecer. Neste momento, é impossível que o preço da gasolina caia tão cedo", avisou Tereza Fernandes, diretora da MB Associados. 

Sem retorno 

Os preços do petróleo começaram a despencar no segundo semestre de 2014, tendo já desvalorizado 55%. Os especialistas estimam até quatro anos para que o barril volte a ficar acima de 

US$ 100, como estava nos últimos anos. Essa conjuntura está criando uma reviravolta no cenário internacional. No Brasil, além de a gasolina subir puxada pela volta de impostos, a economia do país deverá continuar crescendo pouco, inclusive devido à redução nos investimentos do pré-sal. 

A complexa operação de extração do petróleo em águas ultra-profundas tornou-se inviável economicamente com o barril abaixo de US$ 50. A Petrobras informa que o "ponto de equilíbrio" do pré-sal é de US$ 45, sem considerar gastos com infraestrutura logística. O barril de óleo leve, do tipo WTI, negociado em Nova York, segue na casa de US$ 50. 

"A forte queda do petróleo deve fazer com que os investimentos em energias alternativas sejam adiados, como o gás de xisto dos EUA. Quem investiu não deve interromper, mas dificilmente haverá novos empreendimentos", afirmou o professor de economia do centro de estudos em negócios suíço IMD, Carlos Braga. Ele acredita que o patamar atual do barril não deverá mudar nos próximos dois anos. "Se continuar abaixo de US$ 50, os novos leilões do pré-sal ficarão comprometidos porque não haverá interessados", sublinhou o especialista baseado em Lausanne, na Suíça. 

Na avaliação de Braga, a produção brasileira, de 2,6 milhões de barris diários, ainda é pequena, se comparada com o total global, em torno 90 milhões. Assim, não deve atrair muitos investidores, ainda mais com os problemas que a Petrobras vem atravessando após denúncias de corrupção na empresa. "Aos níveis de preço hoje, esses investimentos marginais ficariam menos interessantes", sentenciou. 

Tereza Fernandes, da MB Associados, aposta que o preço do petróleo deve ficar em torno de 

US$ 50 nos próximos quatro anos. Mas há pessimistas que preveem patamares de US$ 35 ou até mesmo US$ 20. "A Petrobras está conseguindo fazer caixa, mas há riscos de longo prazo. A continuidade do plano de investimentos da companhia está comprometida, uma vez que o endividamento gigantesco bateu em R$ 331,7 bilhões, sendo dois terços em dólar. 

Tereza ainda destaca que a estatal já não dava conta sozinha dos investimentos. Pelo atual modelo de partilha, qualquer investidor tem que ter a estatal como sócia, e ela é obrigada a investir 30% no projeto. A Petrobras informou que está revisando seu planejamento para 2015, "implementado uma série de ações voltadas para a preservação do caixa, de forma a viabilizar seus investimentos". Aldemir Bendine sinalizou que deverá suspender vários projetos e até mesmo vender ativos da empresa. 

Tensão na Venezuela 

O Banco Central da Venezuela deu o sinal verde para um aumento do preço da gasolina no mercado doméstico. Atualmente, o litro do combustível é vendido a US$ 0,01 aos consumidores venezuelanos e o governo local teme perder ainda mais a popularidade com a decisão. A exportação de petróleo é a maior fonte de receita federal, mas a queda históricas na cotação do barril está tornando impossível manter o subsídio nas bombas dos postos. Em 1989, uma elevação no valor da gasolina causou a onda de manifestações que ficou conhecida como Caracaço. Centenas de cidadãos tombaram em meio à violência provocada pelos protestos de rua.