O carnaval acabou e o governo vai ter que administrar uma ressaca monumental em 2015. Os desafios do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff não são poucos e passam pelo reequilíbrio macroeconômico. O ambiente externo não é dos melhores, com a economia mundial andando de lado, queda de preço das commodities e redução da liquidez internacional. É nesse cenário que o país terá que adotar medidas emergenciais para reduzir a inflação, os desequilíbrios das contas públicas e do balanço de pagamento, promover o ajuste fiscal e enfrentar uma provável recessão. 

O governo ainda tem que se preocupar com a falta de chuvas, que coloca o país em risco de racionamento de energia e de redução na produção agrícola, e com a Petrobras. A maior empresa brasileira tem um impacto enorme na produção de riquezas e, assolada por denúncias de corrupção, afundou ao lado das maiores empreiteiras do país, o que também ameaça a continuidade das obras de infraestrutura necessárias para garantir crescimento do país. 

Na avaliação do ex-diretor do Banco Central Carlos Eduardo de Freitas, presidente do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal, o grande desafio do governo é reorganizar a economia com base nos fundamentos de ajuste fiscal. "O ministro Joaquim Levy terá que cumprir o superavit primário de 1,2% do PIB (Produto Interno Bruto), reequilibrar os preços internos com os externos, deixando o câmbio mais valorizado, em torno de R$ 3 o dólar, e alinhar os preços administrados", destacou. 

O problema, explicou Freitas, é como será feito o ajuste fiscal. "As medidas de redução de gastos podem não ser suficientes e só saberemos se elas serão para valer quando começarem as reclamações", alertou. O funcionalismo quer reajuste, os empresários lamentam o aumento de impostos e a população já está sentindo no bolso a elevação da tarifa de energia e do preço dos combustíveis. 

Para o economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), Nicola Tingas, a volta do ciclo virtuoso que resultará no crescimento sustentável da economia do país passa por três fases. Conforme ele, o primeiro passo nesse processo é a consolidação do ajuste fiscal. O risco de o Congresso Nacional não aprovar as medidas para reduzir gastos com benefícios previdenciários e trabalhistas levou a equipe econômica a buscar alternativas para reduzir o montante de despesas. 

Tingas ressaltou que, após o governo definir todas as medidas para ajustar as contas públicas, terá que sinalizar ainda este ano ações para atrair o capital que fará investimentos no país. O economista ressaltou que, sem o ajuste fiscal, o país corre o risco de ter a nota de crédito rebaixada e perder os poucos investidores que ainda apostam no Brasil. "Por último, precisamos de sinalizações que apontem para aumento de produtividade. Tudo isso precisa ser feito ainda em 2015 para que a economia volte para a trajetória de crescimento", explicou. 

Para o economista e especialista em contas públicas Felipe Salto, 2015 será o pior ano da última década. A inflação acumulada está 7,14% em 12 meses, bem acima do teto da inflação oficial, de 6,5%. O crescimento de 2014, que será anunciado em março, deve ficar próximo de zero. "Há um risco elevado de recessão em 2015. Acho que o PIB deve ficar negativo entre 0,4% e 0,7% este ano", disse. Se a arrecadação não cresce, o superavit primário também não. "A política fiscal vai ter que sofrer ajuste. Infelizmente isso está sendo feito de maneira medíocre. Tem aumento de imposto e vai ter congelamento de investimento.", disse. 

Sem responsabilidade fiscal, já que encerrou 2014 com deficit primário de R$ 17,2 bilhões pela primeira vez desde o início da série história, em 1997, a relação entre a dívida e o PIB aumentou, ameaçando o grau de investimento do Brasil. Se for rebaixado, vai ficar mais caro para o país e as estatais se financiarem, num cenário em que não se pode contar com crescimento. A atividade econômica já está rastejando e as perspectivas são as piores possíveis com a Petrobras, responsável por 10% dos investimentos do país, mergulhada na maior crise de sua história. 

A petroleira precisa contabilizar o prejuízo com a corrupção, calculado em R$ 88,6 bilhões, num balanço contábil auditado, sob pena de pagar antecipadamente os títulos de dívida, de US$ 54 bilhões. A empresa também responde a vários processos judiciais, cujas multas e indenizações são bilionárias. Com o caixa combalido pela política de represamento dos preços dos combustíveis e agora afetado também pela desvalorização cambial, já que 80% da sua dívida é em dólar, a empresa está ameaçada de calote. 

Para completar o quadro desolador que aguarda o país passada esta quarta-feira de Cinzas, o risco de racionamento é cada vez maior. "O Brasil precisa superar a crise de oferta de energia, ocasionada pela seca hidrológica. Há três anos chove abaixo das médias históricas. Se isso continuar, o país terá que promover um racionamento", sentenciou Nivalde de Castro, Grupo de Estudos do Setor Elétrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (URFJ). (Colaboraram Barbara Nascimento e Rosana Hessel) 

Agricultura perde 

A crise hídrica também ameaça a produção agrícola brasileira. Na opinião do economista-chefe da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), Antonio da Luz, a falta de água será um problema para o agronegócio em 2015. Segundo ele, diversas lavouras já foram prejudicadas e o desabastecimento terá efeitos ainda mais devastadores na próxima safra. Luz ainda comentou que o aumento de tarifas e preços administrados, como combustível e energia elétrica, terá impacto nos custos de produção do setor.