A inflação alta continua a incomodar alguns países da América Latina, um cenário bem diferente do que se passa em grande parte do mundo, às voltas até mesmo com o risco de deflação. Na região, o recente enfraquecimento do câmbio coloca alguma pressão sobre os preços, ofuscando o impacto da queda das commodities. O Morgan Stanley estima que a inflação na América Latina ficará em 10,7% neste ano, um número não muito inferior aos 11,3% de 2014, inflado especialmente pelos índices da Argentina e da Venezuela. O quadro varia muito de acordo com o país, havendo três situações bastante distintas nas sete principais economias da região. Com graves desequilíbrios macroeconômicos, Venezuela e Argentina ostentam indicadores muito acima do padrão global, com a inflação rodando na casa de 65% ao ano no país comandado por Nicolás Maduro. É a taxa mais elevada de uma lista de 57 economias acompanhadas pela "The Economist". O Brasil está num estágio intermediário, com o índice de preços ao consumidor rodando há alguns anos próximo do teto do intervalo de tolerância da meta, de 6,5%. O impacto do câmbio depreciado, os reajustes de preços administrados e uma inflação ainda elevada de serviços devem fazer o indicador fechar acima de 7% neste ano. O outro grupo é formado por México, Chile, Colômbia e Peru. São países com inflação muito mais baixa e com expectativas bem ancoradas, que podem fechar 2015 com índices na casa de 3% a 3,5%. Ainda assim, apenas o banco central do Peru cortou os juros recentemente, em janeiro, e os analistas não apostam em novas reduções das taxas no país. A desvalorização do câmbio é o fator em comum entre essas sete economias que, em maior ou menor medida, pressiona a inflação, como diz Eugenio Alemán, economista-sênior do Wells Fargo. Com moedas mais depreciadas, as importações se tornam mais caras. Alemán lembra que boa parte das divisas desses países são o que o mercado chama de "moedas-commodities", dado o peso desses produtos na pauta de exportação. Com o recuo dos preços de commodities, o câmbio se desvalorizou nesses países, diz ele. Além disso, o movimento também é influenciado pela expectativa de alta dos juros nos EUA neste ano. Com incertezas em relação ao repasse da desvalorização para os preços, a maior parte dos bancos centrais da região não parece ter pressa para cortar os juros, avalia o Morgan Stanley. "A batalha contra a inflação baixa está intensa, mas por enquanto a América Latina tende a continuar como espectadora", avalia o banco. Em países como os EUA e os da zona do euro, o petróleo barato tem derrubado os já baixos índices de preços. Um país latino-americano em que pode haver espaço para redução dos juros é o Chile, diz Alemán. Houve uma desaceleração da atividade em 2014 e o país se beneficia do petróleo mais barato, por ser um importador do produto. Jogam contra isso a depreciação do peso chileno e o fato de que a inflação terminou o ano passado em 4,6%, acima da meta de 3%. No caso do México, o mais provável é que os juros subam um pouco em 2015, diz Alemán, apostando que o BC vai inclusive se antecipar à alta da taxa que deve ser promovida pelo Federal Reserve (o BC dos EUA) neste ano. Na Colômbia, a expectativa é de manutenção dos juros. Como no México, a queda do petróleo tem um impacto negativo sobre a economia colombiana, devido à importância do produto nas exportações do país. As perspectivas para a inflação na Venezuela e na Argentina, por sua vez, continuam muito ruins. Não há expectativa de grandes correções dos desequilíbrios macroeconômicos, como os gastos públicos excessivos, que jogam mais lenha na fogueira inflacionária. Na Argentina, o ano eleitoral indica que a possibilidade de um aperto na política fiscal é remota. Na Venezuela, o recuo de mais de 50% nas cotações do petróleo faz a economia desmoronar. O Fundo Monetário Internacional estima que o PIB do país vai encolher 7% neste ano, depois de ter recuado 4% em 2014. Como os combustíveis são altamente subsidiados, o petróleo barato não representa alívio para os preços ao consumidor. Para o Morgan Stanley, a inflação em 2015 será de 65%. A inflação do Brasil deve seguir pressionada, levando o BC a continuar com a alta dos juros. O índice de preços ao consumidor segue muito acima do centro da meta, de 4,5%, o câmbio se depreciou bastante e há correção de preços administrados. Em janeiro, a autoridade monetária brasileira foi a única de 23 BCs monitorados pelo Itaú a elevar os juros, colocando o país na contramão da expansão monetária em curso no mundo.