Contra a vontade do governo, que mobilizou ministros, emendas e aliados para impedir sua eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), foi eleito ontem no primeiro turno com 267 votos, dez a mais que a maioria absoluta. O candidato apoiado pelo governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), teve menos votos que a soma dos partidos que lhe apoiavam e registrou 136 sufrágios. Eleito com um discurso de independência em relação ao Palácio do Planalto, Cunha afirmou que não promoverá retaliações em consequência da campanha, em que acusou o governo de agir contra sua eleição e o PT de forjar acusações para derrubar sua candidatura, e prometeu trabalhar pelas reformas política e pelo pacto federativo e que a "prioridade zero" é aprovar o Orçamento impositivo, que obriga o governo a executar as emendas parlamentares. "Fica a lição, não se pode construir a harmonia de Poderes com a tentativa da interferência de um Poder no outro. Foi ruim, foi errado, mas agora temos que passar uma borracha", disse o pemedebista, visto no Planalto com um aliado infiel por promover rebeliões contra o governo. "Não haverá da nossa parte nenhuma intenção de buscar retaliação por nada", prometeu. Os outros candidatos tiveram votos dentro do esperado para suas bancadas. Júlio Delgado (PSB-MG), apoiado por PSDB, PPS, PV e PSB, teve 100 votos, Chico Alencar (PSOL-RJ), oito, e dois deputados votaram em branco. As traições ao governo, facilitadas pelo voto secreto, foram no grupo de apoio a Chinaglia. O petista, que foi líder do governo Dilma, contava, em tese, com um bloco de 181 deputados, mas obteve 136 votos. Além disso, o PT ficará de fora da Mesa Diretora pelos próximos dois anos - até o candidato do partido para suplente foi derrotado - e perderá o comando das principais comissões porque seu bloco teve 58 deputados a menos que o do PMDB, que juntou 218 deputados de 14 partidos da base e da oposição. Com um bloco menor, o grupo do PT só teve direito a indicar o 2º secretário e o 2º vice-presidente da Casa, que ficaram com aliados. O PT ficará alijado do comando das duas principais comissões - a de Constituição e Justiça (CCJ) e a de Finanças e Tributação (CFT), por onde passam a maioria dos projetos - e será apenas o quarto partido a indicar o presidente de um dos colegiados. "Foi um desastre. Temos que repensar toda a estratégia para os próximos quatro anos", já afirmava o deputado Alessandro Molon (PT-RJ) antes do resultado da eleição. Na legislatura passada, os petistas comandaram a CCJ, onde impediram o avanço de projetos como a regulamentação da terceirização e uma reforma política diferente da que o partido defende. O "desastre" ocorreu por falhas de articulação desde a montagem do bloco, quando Chinaglia ficou sem apoio do PP e PRB, que indicaram os ministros da Integração Nacional e dos Esportes, até a formalização da chapa - PDT e PSL entregaram o documento com uma assinatura a menos do que o necessário e ficaram fora do bloco, o que o reduziu a 160 deputados. Se não fosse por este erro, o bloco, formado por PT, PSD, PR, Pros e PCdoB, teria direito a pedir o segundo cargo da Mesa: a vice-presidência da Câmara ou a 1ª secretaria, dependendo da escolha dos partidos. O grupo terá o direito de indicar o presidente de sete das 22 comissões temáticas. O cargo de 1º vice-presidente da Casa será ocupado por Waldir Maranhão (PP-MA), indicado pelo bloco do PMDB, e Giacobo (PR-PR) será o 2º vice-presidente. Beto Mansur (PRB-SP) foi escolhido 1º secretário e Felipe Bornier (PSD-RJ) o 2º. O terceiro e quarto secretários serão Mara Gabrilli (PSDB-SP) e Alex Canziani (PTB-PR). Confirmada a derrota, Chinaglia deixou o plenário contrariado e negou o enfraquecimento de seu partido. "Talvez seja pelo menos a terceira eleição consecutiva da Câmara em que o PT tem a maior bancada. Então, do ponto de vista do Legislativo, essa é a força. Agora, uma avaliação política, prefiro que vocês [jornalistas] façam."