A indústria encolheu 3,2% em 2014, o pior desempenho desde a crise de 2009 ­ quando recuou 7,1% em meio aos efeitos do período mais agudo da crise financeira mundial. O resultado reforça a perspectiva de um Produto Interno Bruto (PIB) negativo no último trimestre do ano passado e deixa pouco sinal de melhora para 2015, que tende, segundo as estimativas dos especialistas, a repetir um cenário ruim.

Tanto o resultado de dezembro ­ queda de 2,8% em relação a novembro ­ quanto o do ano vieram um pouco piores do que a média das estimativas das instituições consultadas pelo Valor Data, que previam recuos de 2,4% em dezembro e de 3,1% em 2014. No resultado mensal, preocupa especialmente a forte queda de 23% no setor de bens de capital, termômetro dos investimentos na economia. Com o encolhimento de 2014, a indústria anula ­ com sobra ­ o aumento de 2,1% na produção que chegou a registrar em 2013.

“O cenário não é muito favorável para o setor industrial, que termina 2014 em um ritmo menor, com uma importante queda em dezembro”, disse o gerente da coordenação da indústria do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), André Macedo, após a divulgação dos dados.

“A atividade está menos dinâmica pelos motivos que elencamos em outros meses, como baixo nível de confiança dos empresários, menor consumo, crédito mais caro e seletivo, dificuldades na exportação e atividade econômica em menor ritmo”, disse o coordenador do IBGE.

Macedo destacou que, com os dados de dezembro, o setor passou a operar 10,3% abaixo do pico de produção, alcançado em junho de 2013. Trata­se do ponto mais baixo da produção do setor desde então, segundo a Pesquisa Industrial Mensal ­ Produção Física (PIM­PF).

O economista e professor da Unicamp Julio Gomes de Almeida, acrescenta que, entre oscilações de alta e de baixa, o nível de produção da indústria em dezembro de 2014 foi 7% menor que em agosto de 2008, mês anterior ao da quebra do banco norte­americano Lehman Brothers, em setembro, marco inicial da crise mundial.

“O resultado de 2014 não é isolado, faz parte de um processo de crise que se arrasta há vários anos na indústria”, disse Almeida, que também foi secretário de Política Econômica. De 2003 a 2008, a indústria cresceu continuamente. Em 2009 teve uma queda de 7,1% e, em 2010, em resposta, cresceu 10,2%. Dali para frente, explica, entrou no quadro de enfraquecimento gradativo.

Para 2015, as perspectivas não são muito melhores. A baixa taxa de investimentos, estoques altos e confiança do empresariado em níveis mínimos somam­se às medidas de ajuste contracionistas nas contas públicas e devem resultar em mais um ano de queda para indústria.

“É difícil ver algo positivo em 2015, porque os efeitos da política monetária apertada ainda vão bater, assim como as consequências da política fiscal, e um racionamento de água e energia terá impacto na indústria”, avalia Fernanda Consorte, economista do banco Santander.

Segundo Fernanda, o desempenho da indústria nos últimos meses do ano corrobora a previsão de que o PIB registrou crescimento nulo na passagem do terceiro para o quarto trimestre de 2014 ­ a projeção do Santander é estabilidade nos três meses encerrados em dezembro. “Não há nada positivo vindo da produção industrial no último trimestre de 2014″, disse a economista.

Rafael Bacciotti, analista da Tendências Consultoria, acrescenta que, além de piorar a perspectiva para o desempenho da atividade econômica no último trimestre de 2014, a queda da indústria na reta final do ano torna ainda mais difícil a recuperação do setor neste ano.

O economista calcula que a herança estatística deixada para 2015 pelo resultado de dezembro é negativa em 4,1% ­ ou seja, se a produção ficar estável este ano, ela encerrará o período em nível 4,1% inferior ao de 2014. “O número de dezembro compromete ainda mais este ano. O esforço para a recuperação deverá ser bem maior”, afirmou ele.

Apesar de fazer coro ao consenso de economistas, especialistas e mesmo do governo, de que 2015 será um ano difícil, o economista­chefe da Votorantim Corretora, Roberto Padovani, pondera que há um outro lado a ser observado na questão.

“A contrapartida desse cenário ruim é que os custos de produção tendem a cair, e, com essa correção de preços, a dinâmica começa a voltar a ser mais favorável”, disse Padovani. O economista lembra que é a correção que permitirá uma retomada em 2016.” Para as empresas com potencial exportador isso ainda é potencializado pela desvalorização do câmbio. “O custo da produção, em dólar, vai cair de maneira importante na economia brasileira”, afirmou.

Para 2015, a Votorantim projeta nova queda na produção industrial, de 2,8%, mas, em 2016, essa nova rota de ascensão já deve começar a acontecer: a projeção da corretora é de alta de 1,2% no ano que vem. “O ano de 2015 é um ponto de inflexão para a indústria”, disse Padovani.

 

Signatários de manifesto de apoio protagonizam agora 'revolta' heterodoxa

 

Economistas heterodoxos endureceram o tom e divulgaram uma série de críticas contra os rumos da política econômica e fiscal do segundo governo Dilma. Em uma revista acadêmica intitulada "Política social e desenvolvimento", publicada esta semana pela Plataforma Política Social, organização que reúne diferentes pesquisadores para o debate do desenvolvimento, eles denominaram o atual período de "a virada neoliberal de Dilma". Apoiadores da presidente no período das eleições, quando assinaram lista de apoio à reeleição, os pesquisadores ainda não falam propriamente em rompimento, mas fazem críticas mais contundentes. "O problema do governo é que ele está realizando muito do que a oposição neoliberal realizaria, em parte porque cedeu à pressão", diz Pedro Paulo Zahluth Bastos, professor da Unicamp, que organizou em novembro manifesto de apoio à reeleição da presidente, no qual afirmava que o Brasil havia eleito "a proposta favorável ao desenvolvimento econômico com redistribuição de renda e inclusão social". Hoje, afirma, o tom é de "enorme decepção". "Pouco importa quem está lá, se é Dilma, Guido, Arno. Se os compromissos sociais e programáticos não estão lá, não tem porque continuarmos apoiando as pessoas", diz. Assinam os artigos e a apresentação da revista, além de Bastos, Pedro Rossi, André Biancarelli, Eduardo Fagnani - todos da Unicamp - e Vanessa Petrelli, professora da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e ex-diretora de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). "O que impressiona é que há dois meses era uma agenda de confronto ao mercado financeiro e agora é de completa submissão", critica Biancarelli. "Dizer que acabou o patrimonialismo, sustentar uma estratégia na ideia de que o Estado não tem que interferir e que o gasto privado é que vai resolver as coisas, isso cheira a anos 90", diz. Em artigo intitulado "A Carta ao povo brasileiro, de Dilma Rousseff", Pedro Bastos compara a escolha de Joaquim Levy para a equipe econômica no segundo mandato de Dilma ao documento divulgado por Lula em 2002 para reafirmar ao mercado e investidores o compromisso de manter fidelidade ao tripé macroeconômico. A escolha do ministro para a Fazenda, diz Bastos no artigo, "tem um certo ar déjà vu". Em 2003, embora avaliasse que a iniciativa de Lula em acalmar o setor financeiro fosse correta, o professor diz que o ciclo de aperto monetário se prolongou mais que o necessário, até 2010, tornando o diferencial do juro brasileiro muito maior em relação aos EUA, com consequente apreciação cambial e prejuízo à indústria. Tampouco, na análise do economista, foi um acerto a atual "reviravolta" de Dilma rumo à ortodoxia. O receio de perder o grau de investimento que, para Bastos, foi o que motivou o ajuste fiscal, ainda persistirá em 2015, já que o aperto implicará em recessão, fator de risco considerado pelas agências internacionais. "No mínimo, a economia brasileira vai contrair 0,5%, mas não é improvável que ela contraia mais que 1% este ano". A publicação também pretende rebater a retórica dos economistas ortodoxos de que o ajuste se faz necessário porque "o governo é gastador, perdeu o controle porque gastou muito e porque insistiu no estímulo no consumo de maneira irresponsável", explica Biancarelli. Segundo ele, o que fracassou foi o "industrialismo" do primeiro governo Dilma, que concedeu benesses ao setor industrial, com custos fiscais, sem que com isso houvesse aumento da produção e dos investimentos, ainda que tenha ajudado o emprego e ampliado a lucratividade das empresas. Que era preciso uma correção de rota, Rossi e Biancarelli destacam no artigo que "não havia dúvida", mas o caminho escolhido coloca em risco uma agenda de desenvolvimento com inclusão social. Eles acreditam que a gestão Dilma 2 entrou em rota ainda mais complicada - o caminho financista -, que "ignora a importância do investimento público e da política anticíclica". "Tudo leva a crer que o investimento público vai ser o próximo alvo da facada", diz Biancarelli. Bastos considera equivocada a visão de que só um choque de credibilidade do ajuste fiscal reativará a economia. "É o mito da "fadinha da credibilidade", de que a confiança vai crescer subitamente, quando a demanda está caindo fortemente, e reanimar o espírito animal dos empresários para que voltem a investir". A revista faz parte de uma série que deve contar ainda com textos de pesquisadores de outras instituições, como a PUC-SP e Uerj.

 

 

Recuperação só terá início no 2º semestre, estima CNI

 

O ajuste fiscal em curso vai agravar as dificuldades do setor industrial e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) espera que os primeiros sinais de recuperação surjam, na previsão mais otimista, apenas no segundo semestre.

 

"A necessidade de ajustes na política econômica levou ao aumento de tributação e à elevação na taxa de juros. Esse quadro só agrava as dificuldades do setor industrial nesse primeiro momento", disse o gerente-executivo de Políticas Econômicas da CNI, Flávio Castelo Branco.

 

Apesar de admitir a necessidade de o Governo arrumar suas contas, Branco critica o ajuste via aumento de impostos. "Qualquer medida que aumente a carga tributária é negativa", afirmou. "O que é importante é que o ajuste final se verifique preponderantemente em termos de corte de despesa, e não aumento de tributação e outros ônus à demanda privada", afirmou.

 

Na opinião de Castelo Branco, a reação da indústria ainda está distante, mas é esperada uma melhoria, principalmente nas exportações, a partir de agosto.

 

Uma pesquisa divulgada nesta terça-feira (03/02) pela Confederação mostrou que a indústria brasileira encerrou 2014 com faturamento em queda, retração no emprego e na utilização da capacidade instalada. O faturamento real caiu 1,8% em 2014, na comparação com o ano anterior.

 

Somente de novembro para dezembro, a retração foi de 3,1%. A utilização da capacidade instalada fechou dezembro em 81%, praticamente estável em relação a novembro (80,9%). Em dezembro de 2013, o indicador estava em 81,7%.

 

O nível de emprego também encolheu em 2014, em 0,7%, enquanto as horas trabalhadas foram reduzidas em 3,7% no período. Já a massa salarial real subiu 1,5% e o rendimento médio, 2,3%.

 

Na comparação de dezembro sobre novembro, o emprego cresceu levemente: 0,4%. As horas trabalhadas foram 3,3% menor no período. A massa salarial real, por sua vez, foi 1,8% menor - a quarta queda mensal consecutiva - e o rendimento médio real - 0,5%.

 

Em nota, a entidade informou que "os resultados de dezembro reforçam a tendência de contração da atividade industrial".

 

Somente de novembro para dezembro, a retração foi de 3,1%, na série com ajuste sazonal. A utilização da capacidade instalada fechou dezembro em 81%, praticamente estável em relação a novembro (80,9%). Em dezembro de 2013, o indicador estava em 81,7%.

 

O nível de emprego também encolheu em 2014, em 0,7%, enquanto as horas trabalhadas foram reduzidas em 3,7% no período. Já a massa salarial real subiu 1,5% e o rendimento médio, 2,3%.

 

Na comparação de dezembro sobre novembro, o emprego cresceu levemente, em 0,4%. As horas trabalhadas foram 3,3% menor no período. A massa salarial real foi 1,8% menor - a quarta queda mensal consecutiva - e o rendimento médio real caiu 0,5%.