Ao detalhar como funcionava o esquema de corrupção da Petrobras à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal, o doleiro Alberto Youssef destacou os ex-ministros José Dirceu e Antonio Palocci como os contatos do PT com o lobista Julio Camargo, acusado de ser um dos distribuidores das propinas pagas por empreiteiras a agentes públicos. Em trecho da delação premiada do doleiro, divulgada ontem, ele diz ainda que, nos arquivos da “contabilidade dos ilícitos”, Dirceu era tratado como Bob, e que ele era, com o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, indicado para receber o suborno de construtoras.

“Julio Camargo possuía ligações com o Partido dos Trabalhadores, notadamente com José Dirceu e Antonio Palocci”, afirmou Youssef, de acordo com a transcrição de um dos depoimentos do doleiro. Segundo Youssef, Camargo, que também fechou acordo de delação premiada, era responsável pela distribuição da propina paga a agentes públicos pela Camargo Corrêa e pela Toyo Setal. Nos trechos divulgados, o doleiro não deu mais detalhes sobre a ligação entre o lobista e Palocci, ministro da Fazenda no governo Lula e ministro da Casa Civil na gestão de Dilma Rousseff. Até o fechamento desta reportagem, a defesa de Palocci não havia sido localizada.

Já sobre Dirceu, Youssef afirmou ainda que o petista e Julio Camargo eram amigos. Segundo o doleiro, o ex-ministro usou uma aeronave do lobista em “diversas oportunidades” depois de ter deixado o governo Lula. “Não sabe dizer quantas vezes o avião foi utilizado por José Dirceu e nem a razão do uso. Mas pode afirmar que Julio Camargo e José Dirceu são amigos”, registra a transcrição do depoimento prestado em 13 de outubro do ano passado. Youssef nega saber os valores repassados a Dirceu, mas afirma que viu o codinome Bob, que supostamente se refere ao ex-ministro, nos registros de contabilidade da propina paga.

Em seu blog, Dirceu divulgou nota em que “repudia, com veemência, as declarações do doleiro Alberto Youssef de que teria recebido recursos ilícitos do empresário Julio Camargo, da Toyo Setal, ou de qualquer outra empresa investigada pela Operação Lava-Jato”. “O ex-ministro também afirma que nunca representou o PT em negociações com Julio Camargo ou com qualquer outra construtora. As declarações são mentirosas. O próprio conteúdo da delação premiada confirma que Youssef não apresenta qualquer prova nem sabe explicar qual seria a suposta participação de Dirceu”, diz o documento, que também nega o uso do avião de Julio Camargo. Dirceu comunicou à Justiça que mudou o local de trabalho. Agora, ele dá expediente no escritório Tessele & Madalena Advogados Associados, onde recebe R$ 4 mil mensais.

Em janeiro, a Justiça Federal determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal da empresa de Dirceu, a JD Assessoria e Consultoria. O MPF encontrou transferências bancárias de empreiteiras ligadas ao esquema de corrupção na Petrobras à empresa, entre 2009 e 2013, no valor de R$ 3.761.000. Atualmente, Dirceu cumpre pena pelo processo do mensalão em regime domiciliar.

O juiz Sérgio Moro determinou a inclusão da delação premiada de Alberto Youssef e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa nos autos do processo ontem. Moro atende a pedido da defesa de empreiteiros acusados de participação no esquema. Em despacho, ele afirma que a divulgação ocorre em um momento no qual não há prejuízo à investigação. “Não se presta o Judiciário para ser o guardião de segredos sombrios”, registra o juiz no texto. Trechos que citam políticos com foro privilegiado não foram divulgados.

Tesoureiro

Youssef disse ainda que, em um dos pagamentos de propina feitos por Julio Camargo ao PT, em nome da Camargo Corrêa e da Mitsue Toyo, “as pessoas indicadas para efetivar os recebimentos à época eram João Vaccari e José Dirceu”. Sobre Vaccari, Youssef afirmou ter feito dois repasses, de aproximadamente R$ 400 mil, para ele. O valor teria sido pago pela empresa Toshiba Infraestrutura, em uma contratação para obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), entre 2009 e 2010. Um dos pagamentos foi recebido pela cunhada do tesoureiro, Marice Corrêa Lima, e outro por Vaccari em uma “sacola lacrada”, ambos em São Paulo.

Em nota, a Secretaria de Finanças do PT disse que as declarações de Youssef  “são absolutamente mentirosas (…) tanto no que concerne a uma suposta entrega de dinheiro para sua cunhada (Marice Corrêa) quanto em um suposto encontro (com o próprio Vaccari) em um restaurante”.

A defesa de Julio Camargo também disse que as declarações de Youssef são falsas. Em nota com o título “Fato relevante”, a advogada Beatriz Catta Preta afirma que “não há a indicação de um elemento de prova, sequer indiciária, acerca dos fatos mentirosos ali narrados”. A advogada diz ainda que o avião de Julio Camargo é usado como táxi aéreo. “Era deixada sob a administração da TAM, a qual tem o dever de cuidar da manutenção, hangaragem e afretamento da mesma. Isso significa que, ao haver interessados no afretamento da aeronave, a TAM apenas pergunta ao proprietário se utilizará o avião naquele período ou não.”

O afilhado de Delcídio

O ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa disse, na delação premiada, que o senador Delcídio Amaral (PT-MS) foi o responsável por uma das indicações para a Diretoria Internacional da Petrobras. Ocupante do posto entre 2003 e 2008, Nestor Cerveró é um dos acusados de envolvimento no esquema e está preso. Delcídio foi diretor de Gás e Energia da estatal entre 1999 e 2001, no segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Cerveró era o principal assessor dele. De acordo com delatores do esquema, Cerveró era o braço do PMDB no esquema montado na Petrobras. O petista nega que tenha indicado Cerveró para o cargo. (AA)