O segundo governo de Dilma Rousseff mal começou e a equipe econômica já é alvo de ataques de suas próprias linhas, o chamado "fogo amigo". Na semana que passou, os ministros da Fazenda, do Planejamento, da Casa Civil, do Desenvolvimento, de Minas e Energia e também de Micro e Pequena Empresa tentaram demarcar território e ocupar espaços políticos na Esplanada.

 

 

Em declarações e gestos, integrantes do governo deram sinais contrários ao tom de ajuste nas contas públicas defendido pela nova equipe econômica, que envolve corte de despesas e aumento de impostos.

 

O processo tem semelhança com o que aconteceu com o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, no início do primeiro governo de Lula. Também naquela ocasião, a Fazenda foi incumbida de executar um forte ajuste nas contas públicas e sofreu com o "fogo amigo". O braço direito de Palocci naquele processo era justamente Joaquim Levy, à época secretário do Tesouro Nacional e agora ministro da Fazenda.

 

 

Levy tentou reduzir de 1/12 para 1/20 a disponibilidade mensal de recursos dos ministérios, que acabou em 1/18

Levy tentou reduzir de 1/12 para 1/20 a disponibilidade mensal de recursos dos ministérios, que acabou em 1/18

 

 

Há a percepção no governo de que podem ser reeditados os embates que marcaram o primeiro governo Lula entre Palocci e Dilma Rousseff (então ministra da Casa Civil), e no segundo governo entre Guido Mantega (Fazenda) e Henrique Meirelles (Banco Central). Agora, de um lado, está Levy. Do outro, Aloizio Mercadante, ministro-chefe da Casa Civil, ocupando um espaço “reservado” aos desenvolvimentistas, que se pensava ser de Nelson Barbosa, o novo ministro do Planejamento.

 

E os sinais já começam a ficar evidentes. Na segunda-feira à noite, quando Mercadante, Levy e Barbosa fecharam a estratégia de cortar em um terço as poucas despesas autorizadas pelo governo, a ideia era deixar o anúncio somente para o fim da semana – entre quinta ou sexta. Mas os planos mudaram quando vazaram, logo no dia seguinte ao acordo, informações com detalhes sobre o corte.

 

Ao longo do dia, o Ministério do Planejamento negou que havia a iniciativa de anunciar logo as medidas. Barbosa não ficou nada satisfeito com o episódio, que saíra de seu controle. Nos bastidores do governo, o vazamento foi atribuído ao Palácio do Planalto.

 

O Estado apurou que, nas discussões internas, Levy lutou para reduzir de 1/12 (um doze avos) para 1/20 (um vinte avos) a disponibilidade de recursos dos ministérios, mas acabou aceitando os argumentos de Mercadante, que bateu o pé por um corte um pouco menor, a 1/18 (um dezoito avos). Barbosa também defendeu o patamar de 1/18, que prevaleceu. Isso reduziu as poucas despesas que o governo pode fazer até a aprovação da Lei Orçamentária pelo Congresso.

 

Paralisia. Mas não foi apenas nos bastidores que o "fogo amigo" ficou claro. O ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, pressionou a área econômica para obter mais R$ 2,5 bilhões para as distribuidoras de energia. Como não haverá recursos do Tesouro, negocia-se um empréstimo de instituições financeiras federais. Mas a Fazenda, comandada por Levy, é totalmente contra esse novo empréstimo. Avalia que não há mais espaço para saídas "heterodoxas" no setor elétrico. Braga trouxe a disputa para o debate público e afirmou que tinha "aval" de Dilma para fechar um novo pacote de ajuda ao setor.

 

Um dia antes, o ministro do Desenvolvimento, Armando Monteiro, disse a uma plateia cheia de empresários que foram à sua posse que o equilíbrio das contas públicas não pode paralisar a agenda da competitividade – que, segundo expôs, conta com desonerações e juros subsidiados. Do contrário, alertou, o País corre o risco de continuar crescendo pouco mesmo com as contas arrumadas.

 

Também o ministro da Micro e Pequena Empresa, Guilherme Afif Domingos, detalhou ao Estado um programa de ampliação e aperfeiçoamento do Simples que poderá trazer uma perda de arrecadação de R$ 3,9 bilhões – a menos que o faturamento das empresas incluídas no regime aumente 4,2% ao ano. E frisou que a proposta não era dele, mas da presidente Dilma Rousseff.

 

Petistas. As medidas de ajuste anunciadas por Levy também irritaram dirigentes, deputados e senadores do PT. Em conversas reservadas, petistas dizem não haver como explicar aos trabalhadores as restrições ao seguro-desemprego e ao auxílio doença, impostas pela equipe econômica. "Não me venham com política neoliberal, mesmo que carregada de desculpa", escreveu no twitter o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP). "E eu era chamado de direita do PT. Agora sou esquerda."

 

No PT, porém, a ordem é dar uma trégua à equipe econômica até junho, quando o partido promoverá a segunda etapa de seu 5º Congresso, em Salvador. Trata-se de um megaencontro para atualizar o projeto petista e ninguém duvida de que ali as queixas contra a ortodoxia econômica serão escancaradas.