No alvo da oposição, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (PT), que deve ser convocado para depor na nova CPI da Petrobras, a ser instalada na próxima quinta-feira, revelou ontem o teor da polêmica reunião com advogados da empreiteira Odebrecht. O encontro, cujo assunto não havia sido relatado na agenda pública da pasta, despertou a indignação do juiz Sérgio Moro, à frente dos processos relativos aos desvios na Petrobras, e do ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa, que chegou a pedir a demissão do petista. A empresa é alvo da Operação Lava-Jato. Cardozo negou qualquer tipo de pressão. Afirmou que, no encontro ocorrido no último dia 5, tratou do suposto vazamento de informações sigilosas da investigação e também sobre “uma colaboração internacional” que envolveria a construtora.

Em artigo publicado na imprensa, a advogada Dora Cavalcanti, que defende a empreiteira, afirmou que procurou o Ministério da Justiça “para noticiar que a única providência adotada no bojo do Inquérito nº 1.017/14, instaurado na Delegacia de Polícia Federal em Curitiba com objetivo de apurar os vazamentos, fora a oitiva de três ou quatro jornalistas”. Ela salientou que “a petição endereçada ao ministro da Justiça em nada diferia de outra anteriormente dirigida ao ministro Teori Zavascki, relator do caso no STF, e ainda se somava a outras três protocoladas diretamente perante a 13ª Vara Federal de Curitiba”.

Ontem, o líder do PPS, deputado Rubens Bueno (PR), afirmou que, logo no início, a CPI precisa esclarecer o verdadeiro teor da reunião entre Cardozo e os advogados da Odebrecht. “Nós defendemos a República. Como alguém que não zela pela coisa pública pode continuar no cargo atendendo demanda? Claro que ele não tem condições de ser ministro”, disse Bueno. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), marcou para o meio-dia da próxima quinta-feira a instalação da CPI.

 

Representação

Cardozo, no entanto, declarou que, durante a reunião, orientou os advogados a fazer uma reclamação formal. “Disse a Odebrecht que, ao longo da operação, havia vazamentos ilegais que atingiam a empresa, que isso era clara ofensa à lei. (Mencionaram) que eu havia mandado abrir inquérito para investigar, o que é verdade. E (disseram) que o inquérito não estava sendo tocado corretamente pela PF. Eu pedi que fizessem uma representação formal”, comentou Cardozo.

Ele ressaltou que a representação da defesa da empreiteira foi protocolada, no Ministério da Justiça, na mesma semana do encontro e informou que a reunião ocorreu porque a Polícia Federal está atrelada à pasta. “A quem se dirigiria essa representação? Ao juiz? Não. Ao Ministério Público? Não. É ao Ministério da Justiça, que é a quem está subordinada a PF”, completou. Ele declarou que se encontrou casualmente com Sérgio Renault, advogado da UTC, outra empresa investigada, no Ministério da Justiça.

Cardozo disse ainda que se sentia ofendido pelas insinuações de que a reunião teria como objetivo prejudicar o andamento da Lava-Jato. O juiz Sérgio Moro classificou o encontro de “intolerável” por eles tentarem “discutir o processo judicial e as decisões judiciais com autoridades políticas”.

Baseado no noticiário, o magistrado alertou que o assunto das conversas eram as prisões preventivas decretadas por ele. “Mais estranho ainda é que participem desses encontros, a fiar-se nas notícias, políticos e advogados sem procuração nos autos das ações penais.” Para Moro, houve uma “indevida, embora mal-sucedida, tentativa dos acusados e das empreiteiras de obter uma interferência política em seu favor no processo judicial”.

No sábado, dia em que o assunto veio à tona, o ex-presidente do STF Joaquim Barbosa chegou a pedir, pelas redes sociais, a demissão de Cardozo. A advogada da Odebrecht rebateu as declarações de Barbosa. “O comentário não chega a surpreender dado o histórico do ex-presidente do Supremo, avesso ao direito de defesa.”

Ontem, Barbosa voltou ao assunto por meio das redes sociais. “Eu recebia advogados? Sim, recebi-os às centenas! Mas informava a parte contrária, para que ela pudesse estar presente, se quisesse. Pra quê?”, postou. E continuou. “Explico: o processo judicial cuida de interesses ferrenhamente contrapostos. Tem de ser transparente, dar igualdade de chances às partes.”

Cardozo não comentou o teor das postagens de Barbosa e disse que está à disposição para explicar todos os requerimentos elaborados pela oposição. / Colaborou João Bosco Lacerda