O doleiro Alberto Youssef implicou o deputado Luiz Fernando Faria (PP-MG) em esquema de propinas na contratação de empresa de mineração para obras da refinaria Premium I, no Maranhão. O deputado está entre dezenas de políticos listados por Youssef como beneficiários de propina a partir de desvio de recursos da Petrobras de 2003 a 2014. Em sua delação Youssef disse também que ficava sabendo antecipadamente o nome das empresas vencedoras de licitações da Premium e que reuniões sobre o pagamento e divisão da propina foram realizadas em seu escritório, em São Paulo.
O doleiro disse que se reuniu com Erton Medeiros, executivo da Galvão Engenharia preso em Curitiba e processado por corrupção, lavagem de dinheiro e formação de organização criminosa. Segundo Youssef foi acertada propina de 1% sobre o valor do contrato e os repasses foram iniciados seis meses após o início da construção, segundo seu depoimento em delação premiada. A Galvão Engenharia alega que foi vítima de extorsão e concussão. O deputado não foi localizado para comentar as afirmações de Youssef.
Ontem, a Operação Lava-Jato descobriu que o presidente da UTC, Ricardo Pessoa, esteve com um suposto operador de propinas na Petrobras dois dias antes de ser preso pela Polícia Federal (PF) de Curitiba, em 14 de novembro de 2014. Pessoa se encontrou com Mario Goes, que teria atuado na diretoria de Serviços da Petrobras durante o período em que foi ocupada por Renato Duque. Goes foi preso durante a fase "My Way" deflagrada em 5 de fevereiro e que investiga 11 operadores de propinas na diretoria, incluindo o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto.
Pessoa teve sua conversa com Goes interceptada por escuta telefônica da Lava-Jato. Em um dos diálogos, ele relata dificuldade em encontrar um "amigo", mas combina de tomar vinho com Pessoa durante jantar em sua casa no Rio. Em outra conversa, com homem que se identifica como Mauro Cruz, Pessoa pergunta se ele marcou uma reunião com Mario Goes. O interlocutor responde que sim.
As negociações para o fechamento de um acordo de delação premiada do presidente da UTC Engenharia, Ricardo Pessoa, "estão estacionadas e chegaram a um impasse", disse o advogado que o representa, Alberto Zacharias Toron ao Valor PRO, serviço em tempo real do Valor.
Toron não revela qual seria a natureza do "impasse". A reportagem apurou que existem dois entraves: o empreiteiro reluta a entregar todas as informações de que dispõe sobre cartel e irregularidades em empresas estatais. Também não há consenso sobre o valor da multa a ser paga pelo executivo. O MPF exige cifras mais altas que as acordadas com o diretor-presidente da Camargo Corrêa Construções e Participações SA, Dalton dos Santos Avancini, e o vice-presidente, Eduardo Hermelino Leite. Ambos fecharam acordo de colaboração premiada no sábado e aceitaram pagar multa de R$ 5 milhões cada.
Ontem a Justiça Federal de Curitiba ouviu seis testemunhas de defesa em ação por corrupção e lavagem a que respondem Nestor Cerveró, ex-diretor de Internacional da Petrobras e Fernando Soares, acusado de operar para o PMDB. Segundo Marlus Arns, advogado de Eduardo Leite, da Camargo Corrêa, a defesa manterá oitivas des testemunhas até que a delação do executivo seja homologada.
Convocações do PT mudam foco da CPI
Enquanto a oposição apresentou dezenas de convocações de donos de empreiteiras, ministros e principalmente políticos do petistas para falarem na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras na Câmara dos Deputados, o PT sugeriu a convocação de apenas cinco pessoas ontem, no primeiro dia para protocolar os requerimentos que nortearão os trabalhos de investigação.
O PT protocolou requerimentos para convocar o ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP) David Zylbersztajn, o ex-presidente da Sete Brasil (que constrói sondas para a estatal) Luiz Eduardo Carneiro e o presidente do banco BTG Pactual, André Esteves. Neste último pedido a legenda quer explicar os negócios do banco com a Petrobras na África - não é citada a denúncia da revista "Época", e negada pelo empresário, de que ele teria pagado propina para a BR Distribuidora.
"Sugerimos convocações cirúrgicas porque temos que primeiro juntar a documentação que não consta do relatório aprovado no ano passado na CPI mista", afirmou o deputado Afonso Florence (PT-BA).
Os petistas também sugeriram a convocação, que é praticamente unanimidade entre os partidos da CPI, do ex-gerente de Serviços da Petrobras Pedro Barusco e o ex-diretor da área Renato Duque. O depoimento de Barusco é central para as pretensões do PT de estender as investigações até o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Foi Barusco quem afirmou que a primeira vez que recebeu propina na empresa foi em 1997. O partido sugeriu apenas o convite para o presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, e os ex-presidentes Sergio Gabrielli e Graça Foster.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), contudo, defendeu que não cabe requerimento para mudar o pedido inicial da CPI, que pedia a investigação de irregularidades a partir de 2005. "O regimento interno diz que a ementa da CPI tem que ser que cumprida", disse.
PMDB e PP, que têm políticos citados nos desvios, não tinham protocolado nenhum requerimento até a noite de ontem. Já a oposição fez vários pedidos de convocação do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (PT), do presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, e de políticos do PT, como José Dirceu, o ex-tesoureiro Delúbio Soares, o atual tesoureiro João Vaccari e o ex-tesoureiro de Dilma, Edinho Silva.
Os empreiteiros, poupados na CPI do ano passado, foram alvo de requerimentos do PSOL, PSDB e PSB. Já o SD focou em pedidos para desgastar o novo presidente da estatal e pediu até a convocação de Val Marchiori, suspeita de favorecimento em empréstimos do Banco do Brasil na gestão de Bendine, que agora está no comando da Petrobras. Os requerimentos serão votados na quinta-feira.
Chance de acordo de leniência diminui
Os acordos de leniência entre o governo federal e as empreiteiras envolvidas na Operação Lava-Jato enfrentam mais uma dificuldade. Desde que o Ministério Público impetrou as ações de improbidade buscando a devolução de R$ 4,48 bilhões, os advogados envolvidos na defesa das empresas têm recomendado cautela dobrada a seus clientes. Como o acordo de leniência é feito no âmbito administrativo, não há garantias de que as empresas não sejam condenadas na Justiça e tenham que pagar multas e ressarcimento novamente. Segundo um advogado que tem participado das conversas com o governo, a insegurança jurídica dos acordos aumentou muito. "As empresas correm o risco de pagar três vezes: a propina, o acordo de leniência e depois ainda arcar com a decisão judicial. Além disso, o acordo não afasta a possibilidade da declaração de inidoneidade", ironiza um advogado. Além de pedir ressarcimento e cobrar multas, as ações impetradas pelo Ministério Público pedem que as empreiteiras sejam proibidas de contratar com o poder público e de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. Isso faz com que a eventual assinatura de um acordo de leniência com a Controladoria-Geral da União (CGU) não livre as empresas de serem declaradas inidôneas pela Justiça. Na análise dos advogados, a única forma de contornar a insegurança jurídica seria a participação do Ministério Público nos acordos feitos pelo governo federal, ratificando valores e condições impostas. O ministro Luís Inácio Adams, da Advocacia-Geral da União (AGU), em entrevista ao Valor, disse não se opor à ratificação na Justiça. O problema é que os procuradores são contrários que qualquer acordo administrativo entre a União e os empreiteiros seja feito enquanto as investigações estiverem em andamento. Eles alegam que, ao contrário do que afirma o ministro Adams, o acordo de leniência beneficiará as empresas sem, necessariamente, contribuir com novos fatos para a investigação criminal. Segundo os procuradores, muitas informações das delações premiadas já feitas ainda estão em segredo de justiça e não podem ser compartilhadas com a CGU. Desta forma, corre-se o risco de que informações obtidas no acordo de leniência já tenham sido apuradas pelos procuradores. O governo também tenta que o Tribunal de Contas da União (TCU) participe dos acordos de leniência como forma de dar maior segurança às empresas. A avaliação do ministro Adams é que dificilmente um acordo firmado com a participação dos órgãos de controle da União fosse ignorado pela Justiça durante a discussão da ação de improbidade. Os advogados concordam que esta é uma possibilidade real, mas argumentam que, ainda assim, ma solução administrativa não daria condições para a empresa, por exemplo, ajustar seu balanço e desconsiderar eventuais desdobramentos da ação judicial. O principal empecilho para os acordos de leniência continua sendo a indisposição das empreiteiras de confessarem ter cometido crimes. Mas diante da estratégia do Ministério Público de discutir os desvios da Petrobras também na área cível, os acordos com o governo ficaram mais distantes.