Um novo estudo de economistas da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) mostra que o programa de leilões cambiais do Banco Central só conseguiu segurar a desvalorização do real quando foi originalmente anunciado, em agosto de 2013 - e sua prorrogação, em fins do mesmo ano, teve efeitos insignificantes sobre a cotação, além de não ter ajudado a reduzir a volatilidade.

O trabalho de Marcos Chamon (do Fundo Monetário Internacional, mas que assina como professor visitante da PUC-Rio), Márcio Garcia e Laura Souza joga lenha na fogueira do debate sobre a conveniência de estender pela quarta vez o programa do BC, que já "despejou" o equivalente a US$ 112 bilhões no mercado em swaps cambiais, cuja vigência, a princípio, vai até 31 de março.

Os três economistas chegaram à conclusão de que, na etapa original, anunciada em agosto de 2013, o programa de leilões cambiais provocou uma valorização do real entre 7 e 19 pontos percentuais. Mas, quando renovado, em dezembro de 2013, não produziu resultado nenhum sobre a cotação do dólar, sob o ponto de vista estatístico. O estudo não calcula o impacto das duas outras extensões do programa, em julho de 2014 e em dezembro de 2014.

Laura Souza enfatiza que as conclusões da pesquisa são válidas apenas para essas duas situações bem determinadas - o programa lançado no Brasil em agosto de 2013 e sua extensão em fins do mesmo ano. Mas, ainda assim, o estudo levanta dúvidas se teria valido a pena prorrogar o programa em junho de 2014 e em dezembro de 2014, já que o efeito na taxa de câmbio da primeira prorrogação foi nulo. E também se não seria o caso de descartar completamente qualquer hipótese de nova extensão do programa de leilões de câmbio em 31 de março, atualmente o prazo final de sua vigência.

O BC lançou o programa de leilões cambiais em agosto de 2013 com o objetivo de prover hedge aos agentes econômicos e liquidez ao mercado de câmbio. Essa foi uma iniciativa para conter os efeitos no Brasil da redução de estímulos monetários do Federal Reserve (Fed), conhecido como "tapering".

Na versão inicial, que teve efeito sobre o câmbio para os economistas, o programa teria duração até dezembro de 2013, injetando US$ 55 bilhões no mercado. Foram ofertados US$ 500 milhões em swaps cambiais diariamente, de segunda a quinta-feira, e US$ 1 bilhão em linhas de empréstimo em dólar às sextas-feiras.

O programa foi renovado em dezembro de 2013, mas a oferta de swaps cambiais foi reduzida a US$ 200 milhões e as linhas de empréstimo em dólar passaram a ser oferecidas apenas ocasionalmente. O programa, nessa segunda fase, não teve efeitos sobre a cotação do dólar, concluíram os economistas. O estudo não investiga por que isso aconteceu - uma das hipóteses é que o mercado já tinha colocado no preço da moeda, de certa forma, a sua continuidade.

Márcio Garcia faz outra conjectura: "A segunda fase do programa ocorreu quando a volatilidade do câmbio era bem baixa, quando não havia uma justificativa para sua continuidade. Talvez tenha sido uma forma para manter a taxa de câmbio sob controle em um ano eleitoral. Mas o resultado de nosso método é de que não funcionou nessa segunda vez, embora a voz corrente no mercado seja de que foi importante para manter o real valorizado até as eleições".

Um achado surpreendente da pesquisa é que o programa não reduziu a volatilidade. O BC, em suas justificativas para intervir no mercado de câmbio, sempre repete que adota essa política justamente para reduzir a volatilidade da cotação do dólar - e também para corrigir deficiências pontuais de liquidez e má formação de preços.

A conclusão geral do estudo também vai na contracorrente da percepção do mercado de que, com a oferta maciça de dólares no mercado futuro, o BC manteve o câmbio excessivamente apreciado.

Esse não é o primeiro estudo sobre os efeitos de intervenções do BC na taxa de câmbio - em geral, os economistas divergem sobre o tema, no Brasil e no exterior. Estudo de dois economistas do BC, Emanuel Kohlscheen e Sandro Andrade, constatou recentemente que vendas de swaps cambiais têm efeito sobre a taxa de câmbio.

Valor procurou o BC, que declarou, por meio de sua assessoria de imprensa, que o objetivo do programa é "promover a oferta de hedge à economia e não influenciar a taxa de câmbio".

A diferença do estudo de Chamon, Garcia e Souza é que trabalha com os efeitos do programa e da primeira prorrogação, e não das intervenções individuais. A metodologia também é distinta. Eles basicamente comparam o que aconteceu com a taxa de câmbio no Brasil com o que aconteceu com a taxa de câmbio de alguns "Brasis sintéticos" que não tiveram o programa - uma espécie de irmão gêmeo de nosso país feito em laboratório pelos economistas a partir de economias semelhantes, como Peru, África do Sul e Turquia.

Em dezembro de 2014, ocorreu a mais recente prorrogação do programa, com a oferta de US$ 100 milhões diários. O BC disse que, no volume atual, o programa já atende à demanda por hedge da economia, o que parece ser a manifestação de um desejo da autoridade de não estender a "ração diária". Em dezembro, o BC sinalizou que pretende rolar integralmente os swaps que vencerem. O BC tem dito que só decide os próximos passos em fins de março. O estudo está disponível como texto de discussão número 630 na página da do Departamento de Economia PUC-Rio na internet.