Título: Isolado e sem o BNDES, Abilio joga a toalha
Autor: Caprioli, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 13/07/2011, Economia, p. 9

Como era de se esperar em uma operação na qual foi com muita sede ao pote ¿ ignorou o principal sócio, o grupo francês Casino, e se apoiou nos cofres do governo ¿, o empresário Abilio Diniz viu ontem ruir o desejo de assumir os negócios do Carrefour no Brasil por meio do Pão de Açúcar. Sem o apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que não colocará mais nenhum centavo na transação, conforme antecipou o Correio na edição de 6 de julho, e diante do veto de todos os integrantes do Conselho de Administração do Casino, Diniz foi obrigado a desistir, pelo menos por enquanto, da fusão que resultaria em uma empresa com faturamento anual de R$ 65 bilhões.

Agora, se ainda quiser insistir na fusão com o Carrefour, Diniz terá de convencer o sistema financeiro privado a lhe emprestar entre R$ 3,9 bilhões e R$ 4,5 bilhões ¿ compromisso que havia sido assumido pelo BNDES. E, principalmente, reverter a posição de seu maior algoz no Casino, o presidente do grupo, Jean-Charles Naouri, em 2 de agosto próximo, quando ocorrerá a reunião do Conselho de Administração da Wilkes, empresa franco-brasileira que controla o Pão de Açúcar. O Casino é o principal acionista da maior rede de supermercados do Brasil, com 43% do capital.

Consumidor O recuo do BNDES foi determinado pela presidente Dilma Rousseff, que se assustou com a repercussão negativa em torno da fusão anunciada no fim do mês passado. Para ela, não havia por que o banco público garantir um negócio que resultaria em uma enorme concentração no mercado de varejo de alimentos, prejudicando os consumidores. A empresa resultante da operação, a Nova Pão de Açúcar, teria poder de sobra para forçar aumentos de preços. Outro argumento de Dilma foi o de que, mesmo colocando a maior parte do dinheiro na fusão (que custaria R$ 5,5 bilhões), o BNDES seria acionista minoritário, sem poder de veto a abusos. Para garantir uma saída honrosa, a instituição justificou, por meio de uma nota, que a sua desistência em apoiar o Pão de Açúcar foi resultado da recusa do Casino de avalizar a operação.

Responsável por estruturar a proposta de fusão do Pão de Açúcar com o Carrefour, a Gama, criada pelo Banco BTG Pactual para ser o guarda-chuva do negócio, destacou que manterá o diálogo aberto por acreditar que a associação entre as duas redes de varejo é "excepcional" e poderá ser reavaliada no futuro. Poucos, no entanto, acreditam que o Casino, que tem o direito de assumir o controle da rede comandada por Diniz a partir de 2012, recuará em sua posição, pois o Brasil é estratégico para o crescimento do grupo francês, que injetou US$ 2 bilhões no Pão de Açúcar.

Abilio Diniz participou ontem, em Paris, da reunião do Conselho de Administração do Casino, que durou duas horas e meia, certo de que sua proposta sairia vitoriosa. Mas foi isolado por completo. Baseado em consultorias encomendadas aos bancos Santander, Goldman Sachs, Messier-Maris & Associés, Rothschild & Cie e Merril Lynch, Jean-Charles Naouri destruiu todos os argumentos do empresário brasileiro. Ao fim do encontro, todos os conselheiros do Casino votaram contra Diniz, argumentando que a fusão com o Carrefour é contrária aos interesses do Grupo Pão de Açúcar (GPA), do conjunto de acionistas e do Casino, segundo um comunicado oficial.

A posição do Casino foi tão firme que até mesmo o Carrefour indicou, logo após a reunião do rival francês, que a fusão com o Pão de Açúcar tinha feito água. Não à toa, o presidente mundial do grupo, Lars Oloffson, recolheu-se. Estava de malas prontas para vir ao Brasil, mas indicou ter desistido da viagem. Os mercados também refletiram o fracasso das negociações de Abilio Diniz. No Brasil, as ações do Pão de Açúcar já abriram o dia em queda de mais de 2,5%. Em Paris, os papéis do Carrefour amargaram perdas de até 4%.

Com a fusão inviabilizada neste momento, os investidores começaram a questionar se a operação realmente resultaria em ganhos para os acionistas das duas empresas. "O Carrefour tem uma estrutura deficitária no Brasil. Tanto que seus diretores esconderam, por um bom tempo, um rombo de R$ 1,2 bilhão nos balanços. Além disso, as margens (de lucro) do Pão de Açúcar, que já são baixas, cairiam mais", afirmou um operador de um banco estrangeiro. Para o coordenador de pós-graduação da Trevisan Escola de Negócios, Olavo Furtado, a venda do Carrefour no Brasil é questão de tempo. "O grupo francês será vendido cedo ou tarde", comentou.

No Senado Antes de o BNDES formalizar a sua retirada da fusão do Pão de Açúcar com o Carrefour, Abilio Diniz defendeu a compra dos ativos do grupo francês e destacou que "o âmbito para a deliberação da proposta não é o Conselho de Administração do Casino, mas sim o Conselho de Administração da Wilkes, controladora do Pão de Açúcar." Ele destacou que apresentaria a sua proposta detalhadamente no fórum adequado. "Como fundador e responsável pelo desenvolvimento do Grupo Pão de Açúcar, reafirmo que a associação prevista com o Carrefour será uma oportunidade excepcional, pois criará uma companhia maior, mais eficiente e lucrativa", disse. De nada adiantou.

Agora, os olhos estão voltados para a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, na qual o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, terá de se explicar sobre como a instituição se envolveu no negócio. O Palácio do Planalto, porém, espera que, com a fusão entre o Pão de Açúcar e o Carrefour enterrada, a convocação de Coutinho seja revertida. "Não há mais por que se fazer marola sobre o assunto", afirmou um assessor de Dilma Rousseff.