Após a Anglo American ter anunciado uma baixa contábil de US$ 3,5 bilhões no projeto Minas-Rio, citando entre as razões a queda do preço do minério de ferro, surgem dúvidas sobre se a Vale poderia, eventualmente, fazer alguma revisão semelhante.

Nos últimos anos, a mineradora brasileira reduziu o valor contábil de ativos ao máximo recuperável ("impairment") em projetos de fertilizantes, níquel, pelotas, carvão e também minério. No total, suas baixas em ativos fixos somaram R$ 15,3 bilhões entre 2012 e setembro de 2014.

Segundo o Valor apurou, a Vale não deve apresentar, em seu próximo balanço, uma baixa contábil por razão de preço do minério. A companhia divulgará seus números do quarto trimestre em 26 de fevereiro. Em geral, as razões citadas pela Vale para seus ajustes passados não eram as quedas de preços das commodities, mas sim outros eventos. Mesmo assim, o preço estimado para os produtos tem peso relevante nas contas.

No ano passado, a empresa fez um impairment em minério de ferro, no valor de R$ 1,1 bilhão, referente ao projeto Simandou Sul, na Guiné, que teve concessões revogadas pelo governo. Também contabilizou uma baixa de R$ 612 milhões com uma mina de carvão na Austrália, por considerar que a operação não era economicamente viável nas condições de mercado do momento.

Quando o impairment é necessário, a Vale o contabiliza como uma despesa, o que afeta seu lucro operacional e seu lucro líquido. Isso não significa, necessariamente, um impacto no pagamento de dividendos aos acionistas. Isso porque, além da distribuição mínima legal, a companhia define previamente quais fatores vão determinar um pagamento superior ao piso exigido.

No caso do minério de ferro, o que levanta discussões sobre a eventual necessidade de ajustes por parte das mineradoras não é apenas a forte queda do preço no ano passado - de quase 50% -, que fatalmente vai prejudicar suas receitas. Mais do que isso, o que gera preocupação é a mudança expressiva nas perspectivas de preço do minério. As projeções de analistas, que antes indicavam preços superiores aos US$ 100 por tonelada para o longo prazo, agora são de cotações de no máximo US$ 90, sendo que alguns bancos estimam preços mais próximos dos US$ 60 por tonelada de 2018 em diante.

Analistas explicam que há uma mudança estrutural no mercado de minério de ferro. As causas são o grande aumento previsto para produção nos próximos anos, inclusive da Vale, e a desaceleração da demanda por parte da China.

A Vale está ampliando sua produção de minério de ferro e tem entre seus principais projetos o Ferro Carajás S11D. Desde 2009, detalha em seus balanços os investimentos nessa operação e, no total, estima um desembolso de US$ 19,49 bilhões, incluindo logística. A estimativa é de produção em plena capacidade - de 90 milhões de toneladas anuais - em 2016.

Embora precise avaliar seus ativos sempre que há um sinal de que eles podem ter perdido valor, a companhia pode chegar à conclusão de que não há necessidade de um ajuste ao valor recuperável neste momento. Analistas lembram que a Vale tem baixos custos de produção de minério, inferiores aos US$ 30 por tonelada, além de produção em escala e vantagens logísticas na comparação com outras mineradoras.

A Anglo American já havia feito uma baixa contábil do Minas-Rio, no valor de US$ 4 bilhões, há dois anos. O projeto, cujo início atrasou quatro anos em relação à previsão inicial, teve seu primeiro embarque em outubro.

Em seus balanços financeiros, a Vale explica que, a cada divulgação, avalia se existem "evidências objetivas" de que o valor contábil de seus ativos deve ser reduzido. Ou seja, identifica se algum evento alterou as perspectivas de retorno dos ativos.

Em caso positivo, ela faz um "teste de impairment" para identificar qual seria o valor que conseguiria recuperar do investimento. Na prática, isso significa calcular qual o valor justo (preço pelo qual conseguiria vender o ativo no mercado) menos os custos para a venda e também qual o valor de uso (quanto consegue gerar com o ativo). Se o maior desses dois valores for inferior ao contábil, é preciso fazer a baixa.

Nos últimos anos, a Vale fez diversos ajustes desse tipo, utilizando diferentes formas de cálculo permitidas. Em 2013, os "impairments" de seus ativos somaram R$ 5,39 bilhões. Entraram nessa conta a suspensão da implementação do Projeto Rio Colorado (PRC), na Argentina, e as avaliações de usinas de pelotização que estavam paradas.

No Rio Colorado, a Vale informou que utilizou sua estimativa de custo do investimento para determinar o valor justo do projeto. A empresa tinha um valor contábil de R$ 6,5 bilhões referente ao PRC, mas verificou que só conseguiria recuperar R$ 1,5 bilhão, o que resultou na baixa de R$ 4,9 bilhões.

Em 2012, a empresa fez impairment de R$ 5,8 bilhões para o projeto Onça Puma. A mineradora teve problemas com dois fornos, que levaram à paralisação das operações de ferro-níquel, e decidiu reconstruir um deles. Esse evento levou a empresa a identificar a necessidade de um ajuste. Nesse caso, a Vale determinou o valor recuperável do projeto tomando como base o valor em uso. Na hora de fazer o ajuste, levou em conta a projeção de fluxo de caixa para a vida útil da mina, os preços futuros da commodity e a demanda esperada, além de uma taxa de desconto que incorporou a alta volatilidade do negócio.