Depois de 10 dias sem se reunirem em sessões, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) retomam as principais atividades pós-carnaval amanhã, com as turmas de julgamento. Dois fatos devem transformar a Segunda Turma em foco principal de atenções este ano. O primeiro é a decisão de que as acusações criminais deixaram de ser analisadas no plenário, que passou a tratar de assuntos de maior dimensão, mas às vezes menos interessantes à maioria da população, como discussões tributárias ou com repercussão geral. O segundo é que o colegiado presidido por Teori Zavascki vai concentrar boa parte das decisões da Operação Lava-Jato. O grupo de trabalho de promotores e procuradores criado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tem prazo até este mês para apresentar pedidos de inquérito ao Supremo.

Até agora, a PGR contabiliza 42 casos em apuração no STF. Tratam-se de petições sigilosas que podem resultar na abertura de inquéritos e têm origem nas delações premiadas prestadas pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e pelo doleiro Alberto Youssef. Segundo eles, políticos faziam parte do esquema de propina bancado por obras superfaturadas na estatal por um cartel de empreiteiras. Teori e a Segunda Turma ainda serão responsáveis por julgar recursos de empresários e demais investigados presos em Curitiba. Até agora, apenas Renato Duque, ex-diretor de Engenharia, e João Procópio, ex-sócio do doleiro conseguiram a liberdade após terem sido presos.

No entanto, a Corte máxima brasileira terá outros temas importantes a tratar em 2015. A começar pelo polêmico julgamento da desaposentadoria. Na prática, o mecanismo permite ao trabalhador elevar os ganhos previdenciários. O ministro Luís Roberto Barroso votou a favor da prática, sob certas condições. Já Dias Toffoli e Teori foram contra. A ministra Rosa Weber pediu vista. O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), contrário à medida, diz que terá que usar R$ 70 bilhões em recursos públicos para bancar a despesa.

Também está pendente de julgamento a correção de valores dos clientes de bancos decorrentes dos sucessivos planos econômicos do fim do século passado, como Cruzado, Bresser, Collor 1 e Collor 2. O Ministério Público chegou a dizer que os bancos lucraram R$ 441 bilhões à época, mas baixou o valor para R$ 21,8 bilhões, considerando o período de junho de 1987 a setembro de 2008. O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) calcula que, se o Supremo der ganho de causa aos correntistas, as instituições deverão pagar aos poupadores uma bolada de R$ 8,4 bilhões.

Campanhas políticas
Outro tema importante a ser analisado pelo STF é o financiamento privado de campanhas. Uma ação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pede o fim das doações de empresas a candidatos. Em abril do ano passado, seis ministros do Supremo votaram a favor do pedido, o que pode mudar as regras das eleições a partir de 2016. Um foi contra. E o ministro Gilmar Mendes pediu vista do caso, que permanece parado. A PGR defende o julgamento da questão, mas não tomou posição ainda. A gente pode caminhar para um sistema que não o exclua, um sistema misto que permita o financiamento público e privado, mas com controle mais eficaz, disse Rodrigo Janot, ao comentar a questão no ano passado.

O assunto deve gerar conflitos com o Congresso. O novo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), defende incluir na Constituição que o financiamento eleitoral apontado como fonte de corrupção por especialistas em contas públicas deve ser privado, como é hoje. 

Apesar de ser do PMDB, principal partido da base, Cunha costuma comprar briga com o Planalto. Como tem amplo apoio na Câmara, a tensão com o governo federal é constante. Isso aumenta a tendência de que mais decisões do parlamento sejam levadas ao STF, fazendo o Judiciário resolver pendengas políticas, a exemplo dos últimos anos.

Até o fim do ano, a Corte terá mais um ministro aposentado. Em novembro, o decano, Celso de Mello, atingirá a idade-limite para a saída compulsória. E a vaga de Joaquim Barbosa ainda não foi preenchida. Tudo pode mudar se o Congresso aprovar a PEC da Bengala, que eleva de 70 para 75 anos a idade da aposentadoria obrigatória dos ministros. A medida faria com que a presidente Dilma deixasse de nomear quatro magistrados para a Corte até o fim do mandato dela, em 31 de dezembro de 2018.

Depois de um ano como o de 2014, que talvez tenha sido o de menor produção do Congresso por conta de a Copa do Mundo ter coincidido com as eleições, 2015 vai começar quase em março
Gil Castelo Branco, economista