O coordenador da força-tarefa do Ministério Público na Operação Lava-Jato defende que as empreiteiras sejam punidas integralmente pelos ilícitos de corrupção, superfaturamento, formação de cartellavagem de dinheiro e organização criminosa na Petrobras. O procurador Deltan Dallagnol critica uma ideia corrente no governo, encampada até pela presidente Dilma Rousseff, segundo a qual basta “punir as pessoas” porque as “empresas são essenciais para o Brasil”. “A política da ‘maçã podre’ é danosa para o combate e a prevenção à corrupção”, disse ele, em entrevista ao Correio. “A corrupção não decorre só de fatores individuais, mas também organizacionais. Não queremos só medidas em relação aos indivíduos, mas também às empresas, a aparatos organizados que contribuíram para que isso acontecesse.”

No discurso de posse para o segundo mandato e em 27 de janeiro, Dilma disse ser necessário “saber punir” no caso da Petrobras. “Nós temos que saber punir o crime, nós temos de saber fazer isso sem prejudicar a economia e o emprego do país”, afirmou.

Alertado de que o discurso dele ia de encontro às ideias defendidas pela presidente da República, Deltan não aceitou o confronto. “Eu não quero aparecer como ‘o procurador que contesta Dilma’. Minha ideia é apartidária”, disse. “Tenho a lei, a sanção prevista na lei, que é constitucional. Essa sanção vai ao encontro dos ideais de combate à corrupção e de melhorar a qualidade de vida da população, nossas condições sociais. E vou buscar isso. Não vou abordar entendimento de outros órgãos”, ressaltou. Deltan deseja que o Executivo mantenha-se aliado no combate à corrupção, enumerando órgãos parceiros, como a Polícia Federal e a Receita Federal .

Na visão do procurador, a punição às empresas faria as próprias corporações prevenirem novos casos de corrupção por concluírem que os ilícitos serão mais maléficos do que benéficos. Na semana passada, por exemplo, o MPF pediu à Justiça Federal a abertura de cinco ações, para cobrar R$ 4,47 bilhões de ressarcimento e danos morais contra seis empreiteiras acusadas de desvios na Petrobras.

Maçã podre
Segundo Deltan Dallagnol, a “teoria da maçã podre” passa uma mensagem “que o Ministério Público Federalnão quer passar”. “É a mensagem de que os grandes podem cometer corrupção e praticar atos ilícitos que a situação deles vai ser cuidada de modo diferenciado, quando nós devemos adotar uma posição republicana pelo imperativo constitucional de tratar a todos de modo igual e de buscar punições com base na igualdade, de modo proporcional à gravidade dos atos e à culpa das pessoas.”

O procurador disse que a temida quebradeira de empresas que prestam serviços à Petrobras e o desemprego que seria gerado não pode servir de argumento para proteger as construtoras acusadas de crimes. “Quanto maior a corrupção num país, menor os índices de desenvolvimento social. E o contrário é verdadeiro”, disse ele. Deltan frisa que, naturalmente, as obras serão retomadas e os postos de trabalho, reabertos. “As obras vão ser feitas de qualquer modo. São pessoas que vão fazer essas obras, não é? Você pode mudar a empresa, mas a necessidade de pessoas para as obras continua.”

“A corrupção não decorre só de fatores individuais, mas também organizacionais. Não queremos só medidas em relação aos indivíduos, mas também às empresas, a aparatos organizados que contribuíram para que isso acontecesse”
Deltan Dallagnol, procurador

Sonegação supera R$ 1 bilhão
Os desvios na Petrobras não sangraram apenas os cofres da estatal, também comprometeram a arrecadação de impostos. Segundo cálculos preliminares da Receita Federal, a sonegação fiscal foi de, pelo menos, R$ 1 bilhão, segundo reportagem publicada ontem pelo jornal O Globo. O valor inclui tributos, multas e juros e foi estimado com base na primeira etapa da Operação Lava-Jato. No entanto, a cifra deve aumentar, pois ainda não foi feita a análise das manobras que empreiteiras fizeram para pagar menos Imposto de Renda sobre obras superfaturadas e propinas.