Título: Corrupção em debate
Autor: Melo, Max Milliano
Fonte: Correio Braziliense, 13/07/2011, Ciência, p. 20

Não é novidade que os cientistas brasileiros trabalham diariamente na tentativa de desvendar os mistérios de várias doenças, como o câncer, a Aids e a dengue. O que pouca gente sabe é que a ciência também se ocupa de uma "doença" tão preocupante quanto essas, e fortemente arraigada na cultura brasileira: a corrupção. Na conferência O custo da corrupção para o Estado brasileiro, apresentada na segunda-feira à noite durante a 63ª Reunião da SBPC, pesquisadores discutiram como a academia entende o tema e mostraram as dificuldades de medir as consequências do desvio de recursos públicos. E apresentaram sugestões para o combate do problema, que deveria passar pela criação de órgãos de controle mais eficientes.

Segundo o cientista político Ricardo Caldas, da Universidade de Brasília (UnB), é muito difícil medir o tamanho do rombo nos cofres governamentais. "Uma pesquisa feita pela Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) mostrou que entre 1,5% e 2% do PIB brasileiro é desviado pela corrupção. Eu, pessoalmente, acho que é muito mais", opina.

Caldas explica que, do ponto de vista científico, duas teorias estudam a corrupção. "Há um grupo de pesquisadores que acredita que ela tenha um lado positivo", relata. São os cientistas aliados à chamada Teoria da Graxa. "Essa linha acredita que a corrupção ajuda sistemas que estão travados a se mover", explica o especialista. É o caso, por exemplo, das obras públicas, que são postas em prática por interesses políticos. "Há ainda a Teoria da Bola de Neve, que propõe que eventos mais leves de corrupção geram mais corrupção", conta Caldas, que dirige o Núcleo de Estudos da Corrupção da UnB.

Segundo os especialistas, as causas do problema são complexas. "No Brasil, há uma confusão entre público e privado. Isso é muito arraigado na nossa cultura", afirma o pesquisador da UnB. "A corrupção também está ligada à estrutura de certas instituições do país", completa o professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Marcos Otávio Bezerra. "Conversando com qualquer deputado, não é difícil escutar o discurso de que a função do parlamentar é conseguir verbas para o seu estado", considera.

Fiscalização Nesse sentido, outras funções do Poder Legislativo ¿ como discutir os interesses nacionais e fiscalizar os outros poderes ¿ acabam se tornando menores. "A maioria dos escândalos políticos que resultaram na descoberta de esquemas de corrupção foram resultado de ações da imprensa. Os órgãos fiscalizadores, que deveriam ser os principais responsáveis por esse tipo de ação, não conseguem cumprir bem o seu papel", opina Ricardo Caldas.

Uma das soluções apontadas pelos pesquisadores seria a criação no Brasil de estruturas que pudessem fiscalizar e combater a corrupção. "Os tribunais de contas não são eficazes, pois são geridos por políticos aposentados. É como deixar a raposa cuidando do galinheiro", acredita Caldas. "Além disso, (os tribunais de contas) têm apenas o poder de recomendar punições, não executá-las. Acredito que uma agência de controle, que fosse isenta das questões políticas, poderia ser uma ferramenta importante no combate à corrupção", completa o pesquisador da UnB. (MMM)

Acordo com os EUA O chanceler brasileiro, Antonio Patriota, e a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, apresentaram ontem em Washington uma iniciativa internacional para compartilhar experiências de transparência governamental e luta contra a corrupção. A Aliança para os Governos Abertos (OGP, na sigla em inglês) pretende ser "uma rede de apoio para aqueles líderes e cidadãos que trabalham para construir maior transparência", disse Hillary, no evento no Departamento de Estado. "A ideia é reconciliar um compromisso com a transparência e o bom governo, com métodos inovadores e a plena utilização das novas tecnologias para um governo aberto, que dê garantias de que a democracia está sendo compartilhada por todos", declarou Patriota.