Título: Raízes da violência
Autor: Melo, Max Milliano
Fonte: Correio Braziliense, 13/07/2011, Ciência, p. 20

Enviado Especial

Goiânia (GO) ¿ Redução da violência não é assunto apenas para a polícia. É também coisa de político, cidadão, arquiteto e cientista. É o que afirmam estudiosos sobre o tema que participaram do simpósio Violência urbana, realizado ontem como parte da programação da 63ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Segundo os especialistas, o entendimento da violência vai muito além do que a força policial é capaz de fazer, e envolve desde questões urbanísticas ¿ como a forma com que os bairros são construídos ¿ até preconceitos e estereótipos presentes na sociedade. Para eles, a violência só será controlada quando seu combate passar a envolver ações que incluam toda a população, e não apenas vítimas e criminosos.

Segundo a socióloga da Universidade de Brasília (UnB) Maria Stela Grossi Porto, questões que não têm ligação direta com a falta de segurança são, na verdade, preponderantes para o seu desenvolvimento. É o caso, por exemplo, de regiões onde existe uma percepção da população de ausência do Estado. "Quando há um vazio administrativo, esse vazio precisa ser ocupado por algo, que muitas vezes é a violência", afirma. Como exemplo, ela usa o Entorno. "Embora, legalmente, seja uma região integrante de Goiás, economicamente ela depende do Distrito Federal. A percepção da população é, no entanto, que nenhum dos dois governos se ocupa da região. A sensação da ausência de poder brasiliense e goiano abre uma lacuna que possibilita a instalação da violência", afirma.

Outro ponto que estimula manifestações violentas é a própria sensação que as pessoas têm dela. "Imaginar que um lugar é violento tem um impacto grande sobre as políticas para a violência e no estabelecimento de criminosos naquela região", afirma Michel Misse, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Assim, o fato de a sociedade acreditar que determinados eventos de violência ocorrem em pontos específicos das cidades pode promover mais ações policiais ou fazer com que as pessoas evitem circular por aquela região. "O problema é que nem sempre essas impressões condizem com a realidade, criando mitos e preconceitos com alguns espaços e com pessoas originárias deles", analisa.

Falsas noções A estrutura do Distrito Federal, segundo os pesquisadores, representa de maneira importante os preconceitos em relação à segurança. "A estrutura contrastante da cidade, que tem um núcleo muito particular e uma periferia distante, cria em muitas pessoas a noção de que o Plano Piloto é seguro, e que o simples fato de andar em uma cidade-satélite pode resultar num episódio de violência, como um assalto e um roubo", afirma Maria Stela, para quem esse tipo de crença aprofunda os preconceitos e a própria violência. "Esse não é um problema exclusivo de Brasília. Outras cidades, em especial aquelas que são geograficamente bem divididas, como Fortaleza, esse problema é muito intenso", completa o pesquisador da Universidade Federal do Ceará (UFC) César Barreira.

Para os pesquisadores, a solução para o problema está no envolvimento de toda a população nas questões de violência. "No norte do país, vem crescendo nas cidades a ação de pistoleiros, que era uma questão muito mais presente no campo. Problemas que poderiam ser resolvidos com o diálogo passaram a ter a violência como solução", diz o pesquisador cearense. "Se houvesse mais espaços onde as políticas e os eventos relacionados à violência fossem debatidos, certamente os preconceitos que criam ambientes mais propícios à violência poderiam ser eliminados", opina a socióloga Maria Stela Grossi.