Acrise política e econômica que assola a maior estatal brasileira, com a prisão de ex-dirigentes envolvidos em um bilionário esquema de corrupção que bate às portas do Palácio do Planalto e do Congresso, teve graves desdobramentos. A agência norte-americana de classificação de risco Moody’s rebaixou as suas notas de crédito (rating) da Petrobras para o chamado grau especulativo, em razão das investigações sobre corrupção na companhia, atraso na divulgação do balanço auditado, avanço do endividamento e problemas de caixa. A notícia, divulgada na noite de ontem, é mais um fator de pressão sobre a estatal, que atravessa a sua fase mais turbulenta em 61 anos de história. O rating da maior dívida corporativa do mundo, de R$ 261,45 bilhões, foi rebaixado em dois degraus, de Baa3 para Ba2. A Moody’s manteve a classificação geral da estatal em revisão para novo rebaixamento. Em comunicado, a agência informou que a nota da Petrobras pode até receber uma melhora, desde que a estatal consiga “lidar conclusivamente com os riscos de liquidez a curto prazo”. De toda forma, a agência ressalvou que dificilmente o grau de investimento seria resgatado, considerando que a empresa precisará ainda “encarar estresses continuados relacionados à investigação de corrupção”, além de rolar com o peso de suas dívidas. Com a confirmação do pior dos temores da diretoria da petroleira — o rebaixamento do rating —, o primeiro efeito prático é a elevação do custo da rolagem de seus passivos. Os juros pagos são balizados pelo nível de risco de crédito atribuído pela agência internacional. Ao receber uma nota pior, a taxa de risco cobrada pelos financiadores muda de patamar, para cima. Há muitas restrições regulatórias para fundos de investimentos e bancos emprestarem ou investirem em empresas sem o grau de investimento. A situação pode provocar ainda a reação negativa de investidores que aplicam recursos orientados pela perspectiva de negócios considerados grau de investimento, uma chancela para bons pagadores, que merecem pagar os menores juros do mercado. O que mais preocupa o governo agora é que o risco de redução da nota de crédito contamine as notas da própria dívida soberana do país. O Brasil já está no último degrau do nível de investimento.

Dívida soberana

A Standard & Poor’s, outra grande agência de risco, ainda mantém a nota máxima para a Petrobras, mas já vem fazendo seguidos alertas à estatal. Como a Petrobras não conseguiu publicar um balanço referendado pelas auditorias externas, vem sendo alvo de péssimo noticiário sobre desvio de bilhões de reais sob investigação da Polícia Federal e cujo pesado endividamento ainda segue subindo na esteira da alta do dólar, a chance de novos rebaixamentos é grande. No mês passado, a empresa já tinha sido rebaixada pela Moody’s, mas ainda continuava no último degrau do chamado “nível de investimento”. Agora, ao entrar oficialmente para o grupo das empresas de grau especulativo, a Petrobras terá ainda mais dificuldade para conseguir novos financiamentos. A Fitch, outra agência de classificação, já havia rebaixado no começo do mês o rating da Petrobras de BBB para BBB-. A justificativa foi a mesma da Moody’s e veio junto da perspectiva negativa. “A crescente e prolongada incerteza com relação à habilidade de estimar e registrar um ajuste em seus ativos fixos em tempo adequado, o que permitiria que uma porção significativa dos credores acelerasse o pagamento dos débitos”, detalhou em sua justificativa. A Petrobras foi uma das empresas que mais aproveitou a onda de crédito fácil e barato após o estouro da crise financeira mundial, em 2008. Nesse período, a empresa tomou dezenas de bilhões de dólares em empréstimos, via emissão de títulos de dívida e em operações bancárias. Com isso, a dívida saltou de US$ 27,3 bilhões no fim de 2008 para US$ 139,7 bilhões, em junho de 2014, aumento de 411% em moeda estrangeira. Por isso, ganhou o título de empresa mais endividada do mundo. Segundo o balanço do terceiro trimestre, a dívida da Petrobras chegou a R$ 261,45 bilhões, crescendo 8,3% em relação ao trimestre anterior. Em nota, a Petrobras informou que não tem cláusulas restritivas (covenants) relacionados ao rebaixamento de rating por agências de classificação de risco ou à perda do grau de investimento. O mercado temia que credores poderiam exigir a aceleração no pagamento das parcelas de empréstimos de longo prazo em razão da mudança da nota de crédito. A notícia do rebaixamento fez as ações da petroleira despencarem 3,21% no mercado norte-americano, com queda de 3,21%, cotada a US$ 6,64. Na Christophe Simon/AFP véspera, tinham subido 5,86%, para US$ 6.66. A expectativa é que o pessimismo se repita hoje, no pregão da Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa).

Repercussão

Embora o Planalto tenha dito, na noite de ontem, que não comentaria o caso, o rebaixamento da Petrobras repercutiu no Congresso. “A perda do grau de investimento é lamentável, mas é previsível. A lambança foi tamanha, o descontrole na Petrobras foi de talordem,queissoiaacabaracontecendo. Mais que um fenômeno, (a corrupção) virou um método de a empresa funcionar. Só podia acabar dando nisso”, lamentou o senador José Serra (PSDB-SP). Designado ontem relator da CPI que apura os crimes na estatal, o deputado Luiz Sérgio (PT-RJ) minimizou o ocorrido. “Não há novidade em relação a isso, já era esperado. Para uma empresa que enfrentou um processo dessa natureza, está dentro do contexto.” O deputado disse acreditar que a situação possa ser revertida. “A Petrobras tem uma história e uma trajetória que permitem que essa situação seja revertida”, afirmou ele ao Correio. “Com a mudança da diretoria e a adoção de uma série de medidas saneadoras, tenho plena convicção de que, num espaço de tempo curto, a Petrobras vai retomar sua condição de investimento”, emendou o ex-líder do PT no Senado Humberto Costa (PE).