Nosso PIB cresce menos que os do Chile, Peru, Colômbia, Paraguai e Bolívia, muito menos que os da China e Índia! Na América do Sul só crescem menos os da Argentina e Venezuela, países na contramão da economia global. No contexto do PIB mambembe: gastos públicos elevados, maquiados por "mágicas" que pretendem equilibrar receita e despesa - de que é exemplo a legalização do desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal no episódio do superávit de 2014 -, inflação renitente e juros altos, tributação pesada, infraestrutura insatisfatória, se não caótica, risco de crise de energia, produtividade medíocre, indústria recuando na composição do PIB, comércio externo em declínio, desvalorização do real, obsessão consumista, e por aí vai... Somem-se a esse cenário os problemas nacionais e transfronteiriços a que o Brasil não está imune: meio ambiente, clima, aquecimento global, uso de recursos naturais, biodiversidade, poluição...

Crise dessa gravidade exige condução competente. Nossa sistemática política é capaz de atender à exigência?

A modelagem inicial da política brasileira aconteceu ao tempo do latifúndio escravocrata, naturalmente propenso ao patrimonialismo patriarcal-autoritário. No Império e na Primeira República suas práticas ditas democráticas eram contaminadas e comprometidas pelo "voto do cabresto patriarcal rural", controlado pelo poder de turno. Ajustados à época, resquícios dessa herança cultural permanecem vivos, com os "coronéis rurais" pré-1930 substituídos por caciques urbanos (inclusive populistas e sindicalistas) distribuídos em ene (?) partidos, a maioria deles pautada pelo pragmatismo que facilite o acesso à participação no poder. Com o "voto do cabresto patriarcal rural" substituído pelo "voto do cabresto populista e assistencialista urbano", parte ponderável da grande massa mantida na esperança e à mercê do salvador. A presença dessa sistemática cultural na configuração do poder político ameaça estender-se no tempo porque, na "democracia da aritmética eleitoral" viciada pela publicidade ilusória, quando não inescrupulosa, o eleitor de cultura cívica vulnerável à ilusão propicia a vitória do fascínio messiânico-populista nas eleições, em tese, democráticas.

Um quadro político como o esboçado não ajuda a reduzir (quando não agrava) o risco de grave crise econômica. Tampouco ajuda a reduzir (quando não agrava) nossa precária situação social - ensino fundamental e médio medíocres e universidades de razoável instrução profissional e praticamente nula cultura cívica e geral, atendimento caótico nos serviços de saúde de responsabilidade pública, criminalidade e delitos de toda ordem praticados por todas as camadas da pirâmide social, comumente na esperança da impunidade decorrente da pusilanimidade da lei e das limitações da polícia e da Justiça.

Resultado: ao invés de políticas e projetos de desenvolvimento, hoje necessariamente temperados pela social-democracia, que resolvessem nossos problemas fundamentais e evitassem a crise caótica, vivemos um arremedo de neoterceiro-mundismo inibidor da integração saudável com o mundo desenvolvido, combinado com a prática de políticas e projetos populista-eleitoreiros que comprometem o equilíbrio fiscal e outros de fato convenientes, que se estendem no tempo e cujos contratos são onerados sistematicamente por aditivos que exponenciam os custos, por preparo e condução deficientes e nem sempre virtuosas (sejamos complacentes...), haja vista a avalanche de escândalos que se sucedem.

Poderemos evoluir para um modelo político eficiente e probo, com poucos partidos ideológica e pragmaticamente consistentes, responsáveis e balizados por ideias construtivas, poderemos evoluir para o fim desse modelo ilógico de dezenas de partidos amorfos, aglutinados em coligações inspiradas no poder e seu usufruto, com o partido protagônico vivendo a síndrome patológica do Partido Revolucionário Institucional (PRI) mexicano, messiânico e pretendente à perpetuação no poder? Será que isso pode ocorrer num horizonte de tempo curto e dentro do balizamento da ordem democrática, sem traumas violentos? O momento político não estimula otimismo e o corolário dessa esperança frágil é a incerteza quanto ao encaminhamento correto da crise nacional.

Mas qualquer regime político que não produz poder político de qualidade, em particular o democrático, não é seguro. Mais dia, menos dia suas insuficiências estimulam no povo a esperança no salvacionismo de regime forte, já latente na alma cultural brasileira - à semelhança do ocaso catastrófico da República de Weimar, exemplo radical que felizmente a índole folgazã do povo brasileiro o faz inviável aqui. Entretanto, não estamos livres de um acerto entre o grande capital e o populismo (o macroescândalo da Petrobrás já sugere a hipótese) camuflado de democracia pela eleição (viciada...), em que o suposto messianismo salvador manobra os meandros tolerantes da dinâmica democrática para instituir suas medidas de conteúdo democrático no mínimo discutível - a exemplo do "controle social da mídia" - e conduzir soluções que não solucionam, se não agravam, o risco de crise nacional traumática.

A gravíssima crise de há 120 anos, nos 1890, foi controlada pela política austera do ministro da Fazenda Joaquim Murtinho. O Joaquim Levy chamado a resolver a não menos grave crise atual terá da presidente Dilma o apoio que Murtinho teve do presidente Campos Sales, para resistir às pressões contrárias à austeridade necessária, nos setores público e privado? A nova equipe econômica resistirá à pressão popular e, sobretudo, à congressual de inspiração patrimonialista ou paroquial-eleitoreira? Haverá associação de condutas entre Executivo e Legislativo, ou dissociação similar ao ocorrido no governo Collor?

O alerta está acionado e a luz amarela, acesa. Passará a verde? Ou vermelha?

A ver... E torcer.