Título: Bernanke prevê calamidade
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Fonte: Correio Braziliense, 14/07/2011, Economia, p. 21

INTERNACIONAL Para o presidente do Banco Central dos EUA, haverá desordem nas finanças globais caso o Congresso não aceite elevar o teto da dívida

Washington ¿ O presidente do Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos Estados Unidos), Ben Bernanke, traçou um cenário sombrio para a economia, com consequências globais, caso o Congresso não aceite aumentar o limite do endividamento do país. Para evitar o calote no pagamento de juros sobre os títulos públicos, o Tesouro teria que suspender aposentadorias e despesas com o sistema de saúde e com os programas militares. Dessa forma, ele fixou uma espécie de prioridade na aplicação do orçamento após 2 de agosto, data a partir da qual as autoridades preveem o colapso do governo.

¿Se o teto da dívida não for elevado, ocorrerá uma enorme calamidade financeira¿, disse Bernanke num aguardado discurso no Congresso. O tom foi o mais forte que um membro da administração Barack Obama usou até agora para tratar do impasse com os congressistas republicanos. Segundo ele, um calote causaria ¿ondas de choque¿ no sistema financeiro. ¿O Tesouro vai tentar fazer os pagamentos do principal e dos juros da dívida do governo. O fracasso em fazê-lo certamente colocará o sistema financeiro em tremenda desordem e terá grandes impactos sobre a economia global.¿

Deficit Na avaliação do presidente do Fed, a moratória no pagamento dos compromissos seria suficiente para fazer as agências de classificação de risco rebaixarem a nota dos EUA, o que elevaria os juros exigidos pelos investidores e pioraria o deficit público. Segundo os números divulgados ontem, o rombo nas contas foi de US$ 43,1 bilhões no mês passado, numa redução de 37% em relação aos US$ 68,4 bilhões em junho de 2010. Nos nove primeiros meses do ano fiscal, que termina em 30 de setembro, o saldo negativo está em US$ 970,5 bilhões, em uma queda de 3,3%.

O limite de endividamento, de US$ 14,3 trilhões, foi alcançado em meados de maio. Ontem, o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, renovou o apelo aos republicanos por um acordo. ¿Não há alternativa a uma elevação do teto. Ou você honra as obrigações ou não honra. Se não honra, é obrigado a fazer escolhas terríveis sobre quais contas pagar¿, afirmou. Até o fechamento desta edição, Obama estava reunido com parlamentares republicanos para buscar um entendimento.

Perto de ser rebaixado

Washington ¿ A agência de classificação de risco Moody"s considera baixar a nota da dívida dos Estados Unidos, que sempre esteve no melhor nível possível (AAA). Ontem, a instituição colocou o rating do país em revisão para baixo "tendo em vista a crescente probabilidade de que o limite legal da dívida não seja elevado a tempo", segundo comunicado. A decisão foi anunciada poucas horas depois de o presidente do Federal Reserve (Fed, o Banco Central dos EUA), Ben Bernanke, demonstrar preocupação de que o indicador fosse reduzido. A Moody"s é a segunda agência a fazer o alerta. Antes dela, a Fitch já havia ameaçado rebaixar os EUA. Se a medida se concretizar, será um golpe para o Tesouro norte-americano, ainda visto como porto seguro para os investidores de todo o mundo.

Antes do anúncio, Bernanke afirmou que o Fed está preparado para fazer mais uma rodada de injeção de dinheiro para estimular a recuperação da economia. Nas duas primeiras, a instituição despejou US$ 600 bilhões (R$ 946 bilhões) no mercado com a intenção de incentivar o crédito, o consumo e os investimentos.

Questionado por um parlamentar em depoimento no Congresso sobre a possibilidade de mais um "afrouxamento monetário", Bernanke afirmou:

"Temos que manter todas as opções à mesa. Não sabemos para onde vai a economia". A declaração foi suficiente para dar aos analistas a certeza de que a iniciativa será adotada e causou uma imediata desvalorização do dólar. "O Fed deve vir com algum tipo de terceiro afrouxamento à luz da inquietação que ronda os mercados", disse Jack Ablin, do Harris Private Bank.

Novo BCE faz alerta

Roma ¿ O presidente do Banco da Itália e futuro presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, advertiu que a capacidade de honrar dívidas não é mais uma evidência dos Estados, e defendeu um corte maior dos gastos públicos no plano italiano de austeridade. "A solvência dos Estados soberanos não deve ser considerada um fato", afirmou, ontem, num alerta para a necessidade de uma maior atenção às contas públicas dos países europeus.

Draghi disse ser "indispensável" que as nações ajudadas pela União Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional mantenham esforços para reduzir deficits. Até agora, Grécia, Irlanda e Portugal foram socorridas pelos dois organismos internacionais.

"Em nenhum país, há alternativa confiável a um saneamento orçamentário", insistiu. A autoridade italiana pediu ainda um corte maior dos gastos públicos no plano de austeridade fiscal de seu país ¿ que prevê redução de 40 bilhões de euros até 2014 ¿ para evitar um contágio da crise da dívida. "É preciso definir rapidamente o conteúdo das medidas suplementares. Os mercados estão vigiando isso hoje."

A França se manifestou favoravelmente à celebração de uma reunião extraordinária dos países da Zona do Euro para evitar um contágio da crise grega à Itália e à Espanha. A Comissão Europeia confirmou que pode fazer a convocação a fim de colocar o assunto em debate.