O discurso do governo de que os brasileiros enfrentariam o processo de ajustes econômicos com a carteira de trabalho assinada e com o poder de compra preservado começou a ruir. Em janeiro, a taxa de desemprego apurada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aumentou um ponto percentual em relação a dezembro e chegou a 5,3%. É o maior resultado mensal desde setembro de 2013, quando o indicador alcançou 5,4%. Para analistas, com a menor geração de postos de trabalho e com o aumento do número de pessoas em busca de uma vaga no mercado, o ciclo de alta do rendimento médio da população empregada deve ser encerrado. Segundo analistas, o desemprego tende a aumentar ainda mais devido à fraqueza da atividade produtiva. O ajuste fiscal promovido pelo Executivo agravará esse cenário em um primeiro momento porque implicará aumento de custos das empresas, embora seja essencial para que o país volte aos trilhos e retome o crescimento no futuro. Flávia Vinhaes, economista da Coordenação de Trabalho e Rendimento do IBGE, avaliou que a alta de um ponto percentual na taxa de desocupação é significativa. Conforme ela, historicamente, o número de pessoas em busca de uma vaga no mercado encolhe em janeiro, mas este ano o movimento foi inverso. Flávia explicou que, nas seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE, 34 mil pessoas engrossaram, no mês passado, as filas de pessoas à procura de emprego. Somado a isso, a indústria dispensou 45 mil trabalhadores, a construção outros 11 mil e o setor de serviços demitiu 41 mil funcionários. Desde janeiro do ano passado, a indústria fechou 216 mil vagas, e a construção civil, 73 mil. “Vamos continuar observando os movimentos para avaliar se mais brasileiros voltarão a procurar um posto no mercado formal”, comentou. Para o economista do Itaú Unibanco Rodrigo Miyamoto, a alta do desemprego foi resultado de um aumento maior da população economicamente ativa — aquele que está empregada ou à procura de uma vaga — do que da população ocupada. Conforme ele, com a fraqueza da atividade econômica e mais trabalhadores à procura de um lugar no mercado formal, a desocupação deverá crescer.“O mercado de trabalho mais apertado e a menor geração de empregos devem contribuir para uma desaceleração da massa salarial real e para a continuidade da fraqueza no consumo das famílias, como nos últimos trimestres”, detalhou. Na avaliação do diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, Octavio de Barros, o baixo patamar que vinha se verificando na taxa de desemprego era explicado pela volatilidade do número de pessoas em busca de uma ocupação. Ele ressaltou que, em alguns meses, há um tímido crescimento e, em outros, retração. Contudo, Barros projeta que, com a atividade econômica mais fraca, a taxa média de desocupação chegará a 6,2% em 2015. Na opinião da economista do Banco ABC Brasil Mariana Hauer, o arrefecimento da oferta de empregos muda o cenário de estabilidade dos últimos dois anos. Entretanto, ela afirmou que ainda é cedo para traçar uma tendência de esfriamento do mercado de trabalho, que se manteve aquecido durante todo o ano de 2014, mesmo com o nível de atividade em queda. “Nossa projeção inicial para a taxa de desemprego em 2015 é de 5,5% no ano”, comentou.

Dificuldades

Mesmo trabalhadores qualificados enfrentam dificuldades para conseguir uma vaga. O ex-porteiro Marcelo Sant’Ana, 37 anos, já concluiu três cursos do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) e deve receber o diploma de bacharel em sistemas de informação até o meio do ano. Entretanto, o investimento na formação não tem sido suficiente para garantir um posto no mercado.“Sempre entrego currículos, mas sem muitos resultados. Fiz uma entrevista na última terça-feira e duas em novembro do ano passado. Mas nem sequer me deram retorno. Não adianta mais ter só qualificação. É preciso indicação”, reclamou. Os que migraram do Nordeste para o Centro-Oeste também enfrentam dificuldades. O pedreiro Genilson da Silva Pereira, 27 anos, sobrevive de bicos porque não consegue um emprego com carteira assinada. Com os trabalhos temporários, ele fatura até R$ 2 mil por mês. A condição de informal o deixa desconfortável. “Quero um trabalho fichado, porque sei que terei o INSS e o FGTS recolhidos”, explicou. Pereira veio de Salvador para Brasília com a esposa, há dois meses, em busca de melhores condições de trabalho, e acreditava que não enfrentaria problemas para conseguir uma ocupação. “Sempre trabalhei com carteira assinada. Mas, até agora, não consegui o serviço”, lamentou. Quem tem baixa qualificação também vive desempregado. O catador Edinaldo da Silva Gomes, 24 anos, lamenta a falta de oportunidades para alguém com pouca instrução. “No ano passado, tentei uma vaga em uma empresa de construção civil, mas disseram que não contratariam alguém com apenas até a terceira série do fundamental completa”, lamentou. Com os R$ 200 que recebe do Bolsa Família por dois filhos, e R$ 50 que ganha por dia trabalhado no aterro sanitário da Estrutural, em Brasília, ele não abandona as esperanças de melhorar a condição da família. “Espero poder dar uma vida mais digna para meus filhos”, afirmou.