Título: Esforço histórico para virar a página
Autor: Martínez, Manuel
Fonte: Correio Braziliense, 15/07/2011, Mundo, p. 17

O Equador tenta uma reaproximação com o Brasil "sem precedentes em sua história", segundo seu governo. O presidente Rafael Correa determinou que ao longo do ano se intensifique a vinda de membros do primeiro escalão de seu ministério e de missões empresarias para ampliar o comércio bilateral. Autoridades brasileiras, entretanto, consideram que o acercamento será tratado com ponderação e que é uma forma de os equatorianos admitirem os erros que cometeram recentemente com o Brasil.

O motivo da prudência? Há poucos anos, os países se envolveram em rusgas no âmbito dos negócios que culminaram com a convocação do embaixador brasileiro em Quito para consultas. Essa medida no mundo diplomático é um alerta amarelo quanto ao risco de rompimento dos laços diplomáticos ¿ na melhor das hipóteses, um aviso de que o relacionamento vai para o congelador.

Passados quase quatro anos do fim desses desgastes, o esfriamento é uma realidade que incomoda os equatorianos. É verdade que o Brasil mantém um embaixador em Quito e que o Itamaraty garante a superação das divergências.

A piada na sede do Ministério das Relações Exteriores, contudo, é que seria mais fácil e rápido que os equatorianos conseguissem juntar geograficamente os dois países ¿ sem fronteira comum ¿ do que reconquistar a médio prazo a confiança dos empresários brasileiros.

"Não sei quanto tempo levará para que se recupere a confiança no Equador, mas tenho certeza de que isso não acontecerá este ano, e duvido muito que possa acontecer em 2012 do jeito que eles querem", avaliou uma fonte da chancelaria.

Com ouvidos moucos para a gozação, os equatorianos iniciaram uma operação "apara arestas" no fim de maio, com a troca de seu embaixador em Brasília. Eduardo Mora Anda, tido pelo Itamaraty como um diplomata de pouca ação, foi substituído por Horacio Sevilla Borja. Brasília considera que Borja possa fazer um trabalho melhor, graças à experiência em postos diplomáticos nos EUA e na ONU, e como embaixador na Alemanha e na Argentina.

Poucos dias depois dessa mudança, começou a vinda das missões equatorianas de negócios. E o ponto máximo dessas iniciativas ocorrerá no fim do mês, com a chegada do ministro coordenador de Setores Estratégicos, Jorge Glas Espinel.

Chamado de "superministro", ele comanda as áreas de assuntos elétricos, de minas e combustíveis, de telecomunicações e sociedade da informação e de águas. No Itamaraty, é apontado como o pivô das controvérsias bilaterais.

"Glas virá para, institucionalmente, fazer um mea culpa dos erros cometidos em relação ao Brasil por ele em nome do governo Correa. Ele tentará limpar toda a bagunça que fizeram e que levou os investimentos do Brasil por lá a caírem a zero", afirmou uma fonte diplomática brasileira. O "superministro" chega no dia 24 e passará por Brasília, São Paulo e Rio, em uma visita que terá a duração de uma semana. "Ele apresentará a empresários e a autoridades o recém-aprovado código equatoriano de garantias aos investimentos", disse ao Correio o embaixador Sevilla Borja.

Enganos Thiago de Aragão, analista de política latino-americana da consultoria Arko Advice, avalia que "os equatorianos não vêm para ampliar negócios, mas para reconquistar os contratos e acordos que tinham com empresas e instituições como a Odebrecht e o BNDES". De acordo com ele, se não fosse assim, Quito teria incluído Estados do nordeste e do centro oeste na visita. Aragão lembra que nessas regiões há um significativo número de companhias de médio porte em crescimento, que iniciaram investimentos em países com o perfil do Equador. Para o analista, Correa cometeu outro erro ao iniciar a visita por Brasília. Ele diz que as segundas-feiras e as manhãs das terças-feiras servem para que o Executivo calibre sua agenda, já que o Congresso só começa a funcionar na tarde do segundo dia da semana. "Evidentemente que Glas será recebido, mas não com a atenção apropriada".

Os diplomatas brasileiros concordam com Aragão, mas dizem que o "superministro" tem um ponto a favor. Segundo eles, representantes da Andrade Gutierrez, da Petrobras, da Odebrecht, do BNDES e da Engevix procuraram o Itamaraty porque pretendem fazer negócios no Equador. Para mostrar a boa vontade de Brasília, o chanceler Antônio Patriota estará hoje no Equador. Ele será recebido por seu homólogo Ricardo Patiño e pelo presidente Correa.