Procurador Carlos Fernando Lima, integrante da força-tarefa: "Não creio ser possível salvar as empresas" Enquanto o Ministério Público Federal (MPF) e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) trabalham em parceria para denunciar criminalmente por cartel executivos de empreiteiras e ex-diretores da Petrobras, responsabilizando por ilícitos também as empresas, diferentes parlamentares e o próprio governo federal insistem na tese de que o país precisa punir apenas pessoas envolvidas nos crimes investigados. A ideia provoca reações dentro da força-tarefa da Operação Lava-Jato. Segundo o procurador regional da República Carlos Fernando dos Santos Lima, integrante da força-tarefa, as companhias se beneficiam dos atos corruptos de seus funcionários e que, ao serem penalizadas, serão estimuladas a criar mecanismos anticorrupção. "Um dos objetivos da Lei Anticorrupção [sancionada pela presidente Dilma Rousseff em 2013] é tornar as empresas cada vez mais responsáveis pelos atos que são cometidos através de suas estruturas. Esse tipo de afirmação [de que o país deve punir somente pessoas] não tem lógica diante da própria legislação brasileira", avalia o procurador. "Infelizmente, a gente ainda não tem a responsabilização criminal das pessoas jurídicas. Deveria ser um ponto a ser analisado nessas sugestões de reforma [da legislação]. Não só criminosos e empresas devem ser punidos, como também os acionistas, que se beneficiam do lucro", afirma. O procurador se refere aos acionistas das em-preiteiras, que, diz ele, estão nas mãos de "poucas famílias". "Essas empreiteiras são sociedades anônimas de capital fechado, estão nas mãos de poucas pessoas. Elas não estão responsabilizadas criminalmente, mas no fim são os grandes beneficiários e têm que ser responsabilizadas de alguma forma. Um modo é garantir que as empresas paguem pelo que fizeram", diz. "Não creio ser possível salvar as empresas", pondera. Segundo Lima, ao punir as empresas, elas podem ser obrigadas a criar mecanismos internos de combate a práticas ilícitas. "Se a empresa sabe que vai ser salva, se sabe que é muito grande para ser quebrada, então ela arrisca mais. Então o que acontece hoje é que essas empresas se acham muito grandes, muito importantes. E, de certa forma, o governo está embasando isso", critica. Para o procurador, o país tem condições de não "parar" por conta da eventual penalização às empresas - como o impedimento de participar de novas obras com o poder público. "Eu não creio que vamos perder o capital humano, porque as pessoas mudam para novas empresas. As empresas é que vão mudar. As obras vão continuar por aí", diz. "Eu não posso entender que privilegiemos poucas famílias donas dessas empresas por um discurso de preservação de empregos. Esses empregos vão continuar, porque as obras vão continuar", afirma. O MPF e o Cade atuam conjuntamente para concluir a acusação formal contra empresas e investigados. Um relatório preliminar já foi feito pelo órgão antitruste da Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça. As provas reúnem delações premiadas que apontam o estabelecimento de um "clube" de empreiteiras idealizado pelo ex-deputado federal José Janene (PP-PR), morto em 2010. De acordo com os colaboradores, a atuação do cartel se dava na diretoria de Serviços da Petrobras. Também estão sendo anexados aos autos documentos que, segundo os investigadores, comprovam os desvios e o direcionamento de recursos da Petrobras às empresas integrantes do "clube". O interrogatório do sócio-diretor da Engevix, Gerson de Mello Almada, à Justiça Federal do Paraná também será usado como prova do cartel na Petrobras. Ele confessou, na última terça-feira, a participação da Engevix em reuniões com várias outras companhias para combinar as disputas pelas obras. O Valor PRO , serviço em tempo real do Valor, apurou que a denúncia por cartel será oferecida ao juiz Sergio Moro em até dois meses. Além de ser um ilícito administrativo, o crime de cartel é um delito passível de pena de dois anos a cinco anos de reclusão ou multa. No âmbito administrativo, a empresa condenada pelo Cade por prática de cartel poderá pagar multa de 1% a 30% de seu faturamento bruto no ano anterior ao início do processo que apurou a irregularidade. Já os administradores da empresa, direta ou indiretamente envolvidos com o ilícito, podem ser condenados a pagar uma multa que varia entre 10% a 50% daquela aplicada à empresa. Outras penas acessórias podem ser aplicadas, como a proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e de parcelar débitos fiscais, e ainda o impedimento de participar de licitações promovidas pela Administração Pública Federal, Estadual e Municipal por prazo mínimo de cinco anos.

 

Justiça suíça bloqueia US$ 400 milhões

 

O Ministério Público da Confederação da Suíça conduz nove investigações envolvendo o escândalo de corrupção da Petrobras. Segundo o procurador-geral da Confederação, Michael Lauber, essas investigações envolvem mais de nove pessoas físicas e jurídicas. Foram descobertas 300 contas em mais de 30 bancos suíços pelos quais passaram recursos sob investigação no esquema. Ao todo, a Suíça já bloqueou US$ 400 milhões no esquema de desvio de verbas da Petrobras. Desse montante, já foram repatriados US$ 120 milhões ao Brasil. Os detentores das contas, geralmente abertas em nome de empresas fantasmas, são intermediários financeiros, que agiram direta ou indiretamente em benefício de empresas brasileiras e estrangeiras que teriam pago propinas. "Estou muito satisfeito com a nossa cooperação nesse caso especifico", afirmou Lauber em entrevista ao lado do procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Ele disse que não pode revelar o nome das pessoas sob investigação, mas enfatizou que as autoridades suíças são competentes para apurar casos de corrupção internacional e lavagem de dinheiro naquele país. "Eu gostaria de reafirmar a excelência técnica do trabalho que o Ministério Público suíço faz com o brasileiro", afirmou Janot. Lauber está em Brasília para tratar das investigações com membros da alta cúpula do Ministério Público Federal. O Ministério Público suíço afirma ter recebido 60 comunicações do Brasil sobre os casos de corrupção envolvendo a Petrobras, e todas envolvem a suspeita de lavagem de dinheiro. Desde abril de 2014, os suíços dizem ter aberto nove investigações criminais por lavagem de dinheiro, visando oito brasileiros e contra um desconhecido.